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Acham ou não acham?! Acham?

A Revolução democrática e libertadora do 25 de Abril foi há quarenta anos. Vai repetir-se, nos próximos dias, e até à exaustão, a importância da data, mesmo a partir daqueles que, hoje, deliberadamente, querem destruir os valores fundamentais da Revolução.

O 25 de Abril trouxe-nos o Serviço Nacional de Saúde, a Segurança Social, o Ensino aberto e democrático, a Liberdade de Expressão, o Poder Local, o crescimento das regiões ainda que com as suas assimetrias, o associativismo e cooperativismo da raiz popular, as novas instituições humanitárias e solidárias, a abertura à Europa e ao mundo lusófono, o incremento das artes e o desenvolvimento do desporto nas suas diversas vertentes com especial destaque para o “adaptado”, isto sem a mordaça do fascismo atrofiador de mentalidades, frio e cruel, assassino, autocrata, déspota, caciqueiro e tão corrupto como a corrupção que, infelizmente, ainda hoje grassa em Portugal.

O 25 de Abril, contrariamente ao que dizem os saudosistas do anterior regime, foi um salto em frente rumo ao progresso, se bem que nem sempre acompanhado por políticas e políticos à altura de satisfazerem – concretizando e desenvolvendo – os seus verdadeiros ideais. A democracia fez crescer Portugal e Portugal cresceu, mas, ao mesmo tempo, também perdeu muito daquilo que era seu através de subserviências aos senhores do mundo da economia e das finanças, do capitalismo selvagem, ou da política ultraneoliberal que conquistou terreno e implantou-se – está implantada – à custa do beneplácito do povo, porque o povo ela sufragou.

Os cortes nas pensões de reformados e pensionistas, muito dos quais estiveram no 25 de Abril agitando bandeiras de liberdade e de progresso, sentem-se defraudados, roubados, porque lhes foram aos bolsos; porque roubaram-nos. Outra das conquistadas do 25 de Abril – o 13.º mês – é hoje um bico de obra para empresários e governantes que tentam acabar também com essa conquista de Abril, por causa, dizem eles, da Troika, ou dos troika-trintas, que mudam de camisa como de partido e de bem remunerados empregos por excelentes contratos de trabalhos em empresas ligadas, sub-repticiamente, aos partidos do “arco da governação”.

Vieira da Silva
Vieira da Silva

Portugal cresceu em 40 anos relativamente aos 48 de fascismo, mas, entretanto, não evoluiu em termos de igualdade social. Diz-se, e com razão, que os pobres estão mais pobres e os ricos mais ricos. Sabe-se que a taxa de analfabetismo, que batia recordes em tempos de Salazar e Caetano, decresceu de forma significativa; a taxa de esperança de vida que, há quatro décadas se situava nos 50 anos, hoje já ultrapassa os 75; que a mão-de-obra qualificada é 100 vezes superior há que existia a 24 de Abril de 74; que o número de cientistas portugueses e a projeção de Portugal no mundo nada tem a ver com o país cinzento do “orgulhosamente sós”, que ainda hoje – repito – alguns querem fazer regressar.

A integração na Europa solidária foi um passo importante para o País, se bem que, hoje, essa mesma Europa, já pouco represente aquilo que foram os princípios que nortearam a sua fundação como Comunidade e aos quais Portugal aderiu, resfreando os ânimos da luta por um modelo de política totalitária que surgiu logo após o 25 de Abril.

Hoje, o flagelo que cria medo e miséria, está no desemprego. São mais de um milhão os que não têm trabalho, muitos dos quais, por cá, já desistiram de Portugal, abalando – a convite de Passos Coelho – daqui para fora, como daqui para fora, nos anos 60 do século passado, partiram milhares e milhares de portugueses com mala de cartão. Hoje, a mala é outra, as pessoas são mais qualificadas, mas o problema é o mesmo.

A taxa de natalidade é negativa. Morrem mais do que os que nascem. Os imigrantes que “invadiram” Portugal em meados do século passado e princípios da primeira década do presente, estão a regressar aos seus países.

Quarenta anos depois do 25 de Abril há fome em Portugal, como houve em meados dos anos 80 e antes da Revolução, quando uma sardinha –  dizem – alimentava uma família, a tal família que tinha muitos filhos (não havia, na maioria dos casos luz em casa, quanto mais televisão) e que todos iam descalços para a escola. Aqueles que iam para a escola e não eram, desde miúdos, obrigados a pegar na enxada para ajudar o pai no campo e a alimentar a família.

A História repete-se com um novo cenário e com outros tipos de crise, mas sempre com o mesmo a dar horas e a não ter a devida recompensa: o estômago.

Os senhores do grande capital continuam por cá a ditar leis. As caretas são diferentes das do pré- 25 de Abril, mas as práticas são, ainda que adequadas aos novos tempos, praticamente as mesmas. O poder político dá-lhes mordomias, eles agradecem, e nas suas empresas vão empregando quem lhes facilitou a vida enquanto governantes. “Empregando” em altos cargos e a ganhar balúrdios isto quando há cada vez mais sem-abrigo, gente a recorrer à AMI, à Caritas ou a Legião da Boa Vontade para uma tigela de sopa.

Os mesmos senhores “empresários” que contratam pessoal por uma semana, um mês ou meio ano, a ganhar salários de miséria. Mão- de-obra qualificada (até já sabem falar inglês e francês) e… barata. A exploração continua! As pessoas sabem e sentem isso, mas, por mais estranho que pareça, quando chega a altura de votar – outra conquista do 25 de Abril – ou não votam, ou se votam, votam maioritariamente nos mesmos que lhes vão aos bolsos.

Na mercearia, no cabeleireiro, nos autocarros, todos dizem mal de quem os governa, mas, estranhamente, dão, nas urnas, legitimidade às suas políticas.

pintura abril 02

Afastado o fascismo e o totalitarismo, Portugal tem agora a necessidade de reafirmar, consolidando, a democracia com políticas humanistas e progressistas, ainda que dentro de um quadro Europeu porque da Europa fazemos parte, se bem que a nossa (precipitada) entrada na zona Euro nos tenha arrastado para um “poço” de problemas que não parece ter fundo. E no fundo, ao fundo do túnel, quarenta anos depois do 25 de Abril, ainda não vemos uma luzinha que seja, por forma a dar-nos força e alento para ultrapassarmos os graves problemas que vivemos.

Revoltam-se polícias e militares, professores, médicos e enfermeiros, todos os que da Função Pública se podem revoltar. Os outros, os das privadas, têm de se manter caladinhos e afastarem-se de greves ou outras ações do género, caso contrário o olho da rua está ali… ali à beirinha de uma ameaça patronal, até porque há dez “cães” para um “osso” e como a “matilha” tende a crescer, eles, os patrões, vão brincando com as pessoas a seu bel-prazer.

Os micro, pequeno ou médio empresários – força maior da economia portuguesa – também lutam contra ventos e marés. O IVA a 23 por cento, para alguns – a maioria – tem sido a corda na garganta, por vezes (muitas vezes) na forma literal do termo.

Quarenta anos depois do 25 de Abril, a população está envelhecida, em idade, e psicologicamente envelhecida. Hoje, um desempregado que entre nos “enta” – quarenta, cinquenta ou sessenta anos – tem de imediato o carimbo na testa de DLD (Desempregado de Longa Duração) correndo estes cerca de 200 mil desempregados o risco de nesta situação ficarem até à idade da Reforma, se quando chegarem a essa idade Reforma tiverem.

Há ainda quem nem estude, nem trabalhe: mais de 40 por cento dos desempregados são jovens que ainda nada fizeram na vida, alguns dos quais também já têm carimbado o DLD na testa.

Com a Revolução Democrática do 25 de Abril, colocou-se nas mãos dos portugueses a decisão do seu futuro. Votando livremente, ao contrário do que acontecia antes da Revolução, o povo, hoje, decidi. É ele quem escolhe os governantes… que lhes dá poder. Poder muita das vezes, e ao longo destes quarenta anos, mal atribuído. As falsas promessas eleitorais são penalizadas, promovendo-se depois outras falsas promessas e anda o povo nisto, enganado, agora, por estrangeiros que fizeram do país um protetorado à custa de erros que partiram de jogos bancários e de irrefletidos deslumbramento dos portugueses (o comprar tudo e mais alguma coisa), para hoje se encontrarem endividado até às orelhas.

O povo já saiu em massa às ruas, em duas manifestações organizadas por associações inorgânicas, que foram efémeras, mas que, mesmo assim, revelaram relevando a contestação de milhares e milhares de portugueses quanto às mais recentes políticas governativas. Eles, os governantes, acabaram por se rir. É certo que a coisa, para eles, esteve quase a dar para o torto, mas só…”esteve quase”. Em nada deu!

Isabel Ribas
Isabel Ribas

Outra das conquistas do Portugal Democrático nascido com o 25 de Abril foi, sem dúvida, a Liberdade de Expressão, conquista muito cara a quem, criativo, produz algo para o povo e o povo, criativamente, pode, intervindo, falar ou escrever, sem qualquer tipo de “lápis azul”, o tal que, censurando, cortava tudo a que aos fascistas era inconveniente.

O sublinhado azul era vírus que atingia o teatro, a música, a literatura… os jornais. Eram, os criativos, obrigados a um redobrado esforço de criatividade. Nas entrelinhas diziam, escreviam tudo o que os parvos censores deixavam, por burrice (com respeito ao animal), deixavam passar. No campo da canção, o Festival da RTP, era, em tempos de ditadura, o grande desafio para criadores contestatários do regime fascista. As senhas para “motorizar” as forças militares libertadores na madrugada da Revolução foram canções e canções escritas por poetas de referência: José Afonso, Manuel Alegre e José Niza. Mas também, e sempre, Ary dos Santos, salientando, pessoalmente, a canção “Tourada”, interpretada pelo (agora) emigrante Fernando Tordo e vencedora do Festival da Canção de 1973. Os censores estavam bêbados ou drogados. A letra é de um ataque explícito ao Regime ainda que em época de “Primavera”… marcelista.

Na altura, a rádio, e mais tarde a televisão, eram instrumentos totalmente controlados pelo aparelho fascista. Primeiro a rádio – a televisão aparece mais tarde, e quando aparece poucos eram os que tinham dinheiro para comprar um televisor. E depois os jornais. Eram muitos os títulos e muitos mais foram depois do dia libertador.

Hoje, sem a antiga censura, outra censura condiciona a atividade jornalística. Nestes últimos quarenta anos, tanto surgiram como morreram, inúmeros títulos que foram de referência para o povo português.

Entretanto, a criação de novos canais televisivos (privados), como a SIC e a TVI, veio revolucionar por completo o panorama televisivo, no que diz respeito à informação independente, assim como, mas antes, e em termos radiofónicos, o aparecimento das denominadas “rádios livres”, algumas delas – reorganizadas – ainda hoje resistem, com destaque, a nível nacional, para a TSF.

A Liberdade de Expressão, ainda que desse algum espaço à libertinagem durante alguns anos após a Revolução, consolidou-se, mas não deixou de sofrer severos ataques. Os interesses político-partidários nunca deixaram de controlar os órgãos de comunicação social, principalmente, de serviço público de rádio e televisão. Aliás, ainda hoje se discute a importância desse serviço e a forma como ele se consolidará em termos de independência.

Nikias Skapinakis
Nikias Skapinakis

Não falando em certos conteúdos televisivos, que os canais privados em sinal aberto exportaram e que marcaram – pelos melhores ou piores motivos – a história da televisão em Portugal – o mais célebre: “Big Brother” -, é, na realidade, com o aparecimento do “Cabo” que se dá um “novo 25 de Abril” na comunicação social, surgindo um sem-número de canais internacionais de referência e, depois, outros, regionais – portugueses –, alguns qualidade duvidosa, a fazerem parte do dia-a-dia do cidadão.

Se o Cabo, para as televisões, foi crucial, a Internet é para estas, como para as rádios – mas mais para os jornais – a grande porta aberta para a difusão dos seus trabalhos. São muitos os títulos que aparecem na rede eletrónica, e outros que deixam o papel – mais oneroso – para trabalharem exclusivamente na e para a “Net”. Uma revolução 40 anos após a outra Revolução, que sofria, entretanto, outro “boom” com o aparecimento das redes sociais (Facebook, YouTube, Twitter, Google+ entre outras), podendo, cada um, em sua casa criar, quiçá, o seu próprio jornal e o seu canal de televisão ou espaço de rádio.

Acompanhar e dar resposta às exigências do tempo moderno foi algo a que os portugueses foram desafiados. A resposta foi positiva, e tão positiva foi que os grupos económicos privados, interessados em controlar a informação e a liberdade da mesma foram tentando, como continuam a tentar, controlar, começando, por mais incrível que possas parecer, pela “gestão” dos trabalhos redatoriais, sempre com o peso decisório das audiências e, consequentemente, dos interesses das grandes empresas fornecedoras de publicidade.

Enquanto as revistas cor-de-rosa (do “antigamente” poucas sobreviveram) apareceram como “cogumelos” registando grandes audiências, e os jornais desportivos passam a diários (a maior parte eram trissemanários até meados do século passado) também com audiências dignas de registo, já os jornais regionais sofreram um revés para lamento e sufoco das empresas gráficas.

Controlados por caciques ou dependentes de subsídios camarários e da Igreja, os “regionais” foram desaparecendo em papel, acabando as redações formadas por três ou quatro jornalistas profissionais, para só um (profissional ou aprendiz de jornalismo) fazer o jornal… em casa.

pintura abril 05

Quarenta anos depois da Revolução do 25 de Abril muito mudou. Muitas ainda são as exigências que, não só no jornalismo, mas em tudo o que diz respeito à nossa vida, estão a ser questionadas, estudadas de modo a se saber, mais ou menos, o que será o futuro deste país, e até que ponto a democracia, tal como a vemos e vivemos no ocidente europeu, sobreviverá a todos estes constantes desafios.

Há trinta anos não havia telemóveis, hoje, e através deles, convocam-se manifestações e às manifestações vão milhares e milhares de pessoas. Falta saber que tipo de manifestações daqui a 40 anos anos serão convocadas por outras redes, outros meios de comunicação, e se, sem ditadura explícita ou implícita, a democracia sobrevirá.

“Liberdade” é uma palavra cara para muitos dos que hoje viveram o 25 de Abril de 1974, baixa, contudo, o “preço” para quem depois dela nasceu. Não há democracia sem Liberdade, seja ela de expressão ou do que for. Hoje já há um défice de Liberdade – ou estás caladinho, ou vais para a rua! – e, consequentemente de Democracia. A democracia participativa, ativa, presente das pessoas; das tais pessoas cada vez mais virtuais e anónimas, medrosas e falsas.

40 anos depois, e depois?

Depois, os media vão continuar a fazer da sua agenda a agenda dos políticos se os políticos forem parecidos com os atuais. Não serão, poderão é ainda ser piores! Hoje, a fuga é meio caminho andado – para quem pode, ou seja, quem tem dinheiro para pagar viagens e residir num outro país – para muitos portugueses.

A Liberdade, daqui a uns anos, será diferente, será uma Liberdade controlada, exigente, automatizada. Será que teremos, uma vez mais que sair à rua (muitos, aos montes) com bandeirinhas de Portugal saudar o cortar de fitas de um primeiro-ministro ou Presidente da República qualquer? Iremos? Se formos, por certo, nessa altura, não haverá Liberdade de Expressão. O lápis que outrora era azul e censurava, passará a ter outra cor, podendo até não ser um lápis… mas seja o que for estará lá para censurar. Se formos cantando e rindo para a rua, e uma nova Mocidade por aí aparecer, outros “Hóteis”, como o da Rua do Heroísmo, aqui no Porto (PIDE) – reabrirão portas mas com uma outra fachada.

Vieira da Silva
Vieira da Silva

O povo está sedado, robotizado, manipulado… descrente, mas, pelos vistos, resignado para alegria de quem o controla.

Quarenta anos depois do 25 de Abril ainda há quem peça uma outra Revolução; quem avise que os portugueses não são de brandos costumes – a História prova-o -; mas, quem o faz, daqui a uns anos não estará cá, e quem cá ficar, se não for ensinado, construído, a ser Gente, será escravo, para sempre, de um autocrata ou ditador qualquer.

Nessa altura, não sei se será tarde para relembrar Abril. Tal como hoje se relembra o 5 de Outubro.

Não sei… mas, se calhar será.

Mas, hoje, ainda não é tarde!

Acho que ainda vamos a tempo.

E vocês acham, ou não acham?

Acham?

 

José Gonçalves

(Diretor)

 

 

01abr14

 

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11 Comments

  1. Paulo Bastos (Lisboa)

    Excelente edição. Jornalismo de qualidade. Independente. Parabéns senhor Director e a todos os colbaoraes deste “Etc e Tal jornAL”.

  2. Paulo Martins (Viana do castelo)

    Eis um relato dos 40 anos de Abril. Bem escrito. Escrito sem merdices, ou à espera de “likes” ou “gostos” desgostosos.

    Parabéns senhor diretor.

    PS: Maravilha o que aconteceu na Junta de Freguesia do Bonfim, com o Torneio de Xadrez.
    Se um jornal tem, e deve ser ativo e participativo na sociedade, não se confinando às quatro paredes de uma redação, este ( o ETC E ETAL JORNAL) é um exemplo

  3. Lourdes dos Anjos

    ACHAM OU NÃO ACHAM!?…Eu acho que merecemos estes amigos que vão lendo as nossas loucuras e alimentando a nossa irreverência e dando força ao nosso sonho de GENTE LIVRE, NOBRE E LEAL…PORRA, ESTAMOS FARTOS DAS ALGEMAS!

  4. António Duarte Lima

    Ilustre amigo.
    Li o seu artigo, está dentro da minha linha de pensamento relativamente à sua pessoa, eu acredito neste povo, acredito no povo que nós somos. Gostei por isso termino com o o que eu…
    ACHO
    Acho que esta letargia
    Que este nobre povo se deu
    Vai acordar um dia
    Vai acabar com a oligarquia
    Vai mostrar que não se rendeu.
    Um fraterno abraço.

  5. Carla Sousa (Funchal)

    A C H O !

    Também ninguém me cala. Venha Jardim ou menos Jardim! Passos ou menos Passos!

    Continuem o vosso trabalho, a coisa está boa… excelente!

  6. Celeste Reis (Gondomar)

    A C H O !

    Tá dito

    Este jornal está cada vez melhor. Parabéns a todos e um beijinho especial para o Zé Gonçalves

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