António Carneiro, de seu nome completo António Teixeira Carneiro Júnior, nasceu a 16 de Setembro de 1872, em S. Gonçalo de Amarante. Proveniente de uma família muito modesta, teve uma infância difícil, não só pela pobreza como pelo desamparo pois, aos sete anos, foi abandonado pelo pai, António Teixeira Carneiro e, pouco tempo depois, ficou órfão de mãe, Francisca Rosa de Jesus, uma exposta da Roda de S. Gonçalo. Como da parte de sua mãe não se lhe conhecia família, em 1879, foi entregue no internato do Asilo do Barão de Nova Sintra, no Porto, instituição pertencente à Santa Casa da Misericórdia desta cidade.
Aí fez o ensino primário e, desde muito cedo, começou a manifestar-se a sua inclinação para o desenho, quando começou a copiar figuras que encontrava em textos religiosos ou em periódicos da época. Com o apoio da Santa Casa da Misericórdia do Porto, em 1884, ingressou na Academia Portuense de Belas Artes, onde foi aluno, entre outros grandes nomes, de Soares dos Reis e de Marques de Oliveira. Nesta instituição concluiu o Curso de Desenho Histórico, com a classificação final de dezoito valores. Matriculou-se, depois, no curso de Escultura, do qual desistiu, após a morte de Soares dos Reis. Em 1897, foi como bolseiro para Paris, onde frequentou a renomada Academia Julian vivendo, na capital francesa, já casado com Rosa Carneiro.
De regresso a Portugal, em 1911, foi convidado para leccionar a disciplina de Desenho de Figura, na Escola de Belas Artes do Porto. Assim, além de se distinguir como pintor e ilustrador de dezenas de livros (capas e ilustração dos textos) exerceu, também, a carreira de professor. Mas, a sua acção na sociedade era ainda completada com uma intensa actividade literária, pois colaborou em várias publicações, dirigiu a revista portuense “Geração Nova”, fez parte do movimento cultural “Renascença Portuguesa”, instituída no Porto, em 1911, coordenando a secção artística e literária da revista “A Águia”, publicação que deu voz ao referido movimento, a qual dirigiu a partir de 1912, com o seu conterrâneo e amigo, o poeta Teixeira de Pascoaes.
Também António Carneiro foi poeta mas, a sua obra principal, “Solilóquios”, só foi publicada, em 1936, poucos anos depois de morrer. Nas palavras do escultor Diogo de Macedo (1889-1959), “António Carneiro foi um caso à parte do nosso meio plástico. Nasceu poeta e foi pintor”.
A sua vida foi também preenchida com muitas exposições que levou a cabo, no Porto, em Lisboa, em Paris, Barcelona, no Brasil, nos Estados Unidos,… contactando com os círculos artísticos e intelectuais desses países. Com o mesmo intuito, realizou várias viagens pela Bélgica e Itália, esta última registada com minúcia, num diário. São itinerários que, pelo ambiente cultural encontrado, pela aprendizagem adquirida, pela novidade, tiveram repercussão nos seus trabalhos.
Destacamos a sua presença na Exposição Universal de Paris (1900), onde foi galardoado pela sua obra “Vida”. Esteve ainda presente na Exposição Universal de Saint Louis (Louisiana Purchase Exposition, E.U.A.,1904), em que recebeu uma medalha de prata. Igualmente, na Exposição Internacional de Barcelona (1907), foi contemplado com uma medalha de prata.
António Carneiro salientou-se, sobretudo, como retratista: auto-retratos e retratos que fez a óleo, sanguínea e lápis. É, por alguns, designado como o “retratista das almas”, dado que as obras executadas expressam grande sensibilidade e parecem captar os sentimentos e as emoções dos personagens representados. Gostava de retratar, sobretudo aqueles que conhecia bem para melhor interpretar a densidade psicológica de cada um.
São numerosas as personalidades por ele retratadas, de que destacamos o poeta Teixeira de Pascoaes, o escultor Teixeira Lopes, o seu filho músico, Cláudio Carneiro, o escritor e poeta Guerra Junqueiro ou a violoncelista Guilhermina Suggia.
Além dos retratos, na sua pintura inserem-se também as cenas familiares, os motivos religiosos, como interiores de igrejas, ou figuras como o “Ecce Homo”, além de temas de cariz histórico e paisagens,… A sua obra manifesta alguns aspectos inovadores, dentro da pintura da época. Todos os seus mais íntimos sentimentos e as suas características de misticidade e melancolia, solidão e bucolismo plasmam-se nas suas telas. O carácter místico que revela é, provavelmente, a característica mais marcante da sua personalidade e da sua obra. Era mesmo apelidado como “O Mongezinho de Nova Sintra”, ou como o “pintor místico”, o “contemplativo”, …
Nas palavras que António Carneiro deixou registadas, a sua vida foi “simples, recolhida e imutável […]” é essa “[…] sereníssima vida a que eu aspiro, respirando forte nos horizontes puros do Sonho e do Pensamento; por claustro: a Arte; por burel: o meu sentir”.
Segundo escreveu Jaime Ferreira, na obra de sua autoria, “António Carneiro” (1972), salienta: “António Carneiro foi, desde menino, um místico que olhava para dentro, para ele mesmo e possivelmente para Deus – um místico com especiais sentimentos poéticos caldeados na desventura do seu modesto nascimento. E como pintor era um artista nato, artista por vocação a manifestar-se desde a adolescência.”
É difícil inserir a pintura de António Carneiro numa corrente artística bem definida, pois ela é feita de várias inspirações e cruzamentos destacando-se, contudo, o simbolismo como tendência mais marcante.
Foi casado, desde 1893, com Rosa Carneiro, nascendo desta união três filhos: Cláudio (1895-1963) que se notabilizou como músico e compositor; Maria Josefina (1898-1925) que morreu ainda jovem, vítima de tuberculose; e Carlos (1900-1971) que foi pintor.
António Carneiro morreu no Porto, a 31 de Março de 1930.
O Porto homenageou-o dando o seu nome à rua onde habitou e trabalhou e onde se encontra a sua Casa-Oficina, hoje sob a orientação da Câmara Municipal do Porto.
Texto: Maximina Girão Ribeiro
Fotos: Pesquisa Google
Obs:Por vontade da autora e, de acordo com o ponto 5 do Estatuto Editorial do “Etc eTal jornal”, o texto inserto nesta rubrica foi escrito de acordo com a antiga ortografia portuguesa.
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