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Um olhar à Esquerda…

Lúcio Garcia

 

 

 

 

 

Será que após 12 anos de percurso no Século XXI, ser-se de esquerda significa continuarmos agarrados às ideias que geraram a revolução bolchevique?

Será que ainda têm significado as palavras Camponeses e Operários com a conotação que tinham em 1917?

Será que, nos dias de hoje, ainda é legítimo estar preso aos ideais comunistas da era anterior à queda do Muro de Berlim?

Será que hoje temos na esquerda novos líderes e regimes como o da Coreia do Norte para nos inspirar?

Em Portugal há quem pense que sim. Basta consultar os programas e conclusões dos últimos congressos de alguns partidos que se autoproclamam da verdadeira esquerda.

 

 

Provavelmente, alguns leitores ficarão desiludidos por eu não “malhar” (palavra muito utilizada no livro de visitas da anterior série do nosso jornal) seja em quem for por tudo e por nada.

Prefiro desenvolver uma ideia baseada em factos, com objetividade, com consistência histórica e sem qualquer populismo, que abomino.

O que escrevo reflete a minha opinião e uma visão do mundo em que vivemos, não de outro. Alguns leitores concordarão comigo, outros não, mas a finalidade é sempre deixar uma ideia que possa ser lida e refletida, espero que, com abertura de pensamento e análise critica.

O meu ideal sempre foi de esquerda, a utopia um sonho a preservar, porque, como diz o poeta, “o sonho comanda a vida” e dele não podemos abdicar.

A vida, no entanto, não se faz só de sonhos, ela é muito real e, por vezes, quando o caminho tem muitos obstáculos, temos que caminhar devagar para não tropeçar.

 

De esquerda e sem partido, sendo o que vulgarmente se chama de um independente confesso, que quando surgiu o Bloco de Esquerda tive a esperança de que algo de novo tinha surgido na sociedade portuguesa que iria permitir um caminho mais fácil para um entendimento à esquerda.

A verdade é que no mesmo dia em que o Bloco surge de umas eleições com uma margem de votos significativa – o que até lhe permitia alguma vantagem de negociação -, o seu líder, Francisco Louça, ataca de forma tão violenta o PS, que torna irreversível qualquer hipótese de entendimento.

O seu castigo não tardou e hoje o Bloco está a desfazer-se.

 

 

Em relação ao PCP, nada de novo.

O PCP, sempre teve como seu alvo prioritário o PS, ainda hoje – apesar das terríveis políticas que o Governo de Passos todos os dias nos bombardeia -, Jerónimo de Sousa, em entrevista à TV, dá duas palavras contra o governo e quatro no PS, como se isso lhe adiantasse alguma coisa ou tivesse algum efeito.

Só uma política de ódio visceral pode explicar este tipo de atitude.

Ela é no mínimo irracional. Ou talvez não… como eu o compreendo, Jerónimo pensa que bater no PS, traz votos ao PCP, mas nas tantas reuniões que o PCP já fez, ainda não descobriu um analista que tenha percebido que essa forma de fazer politica nunca beneficiou o PCP?

Que nunca beneficiou a esquerda e que só põe a rir a direita portuguesa?

Veja-se a flutuação de votos de eleição para eleição para constatar a verdade do que afirmo.

Tenho a maior desconfiança no PCP, digo-o com toda a franqueza.

Sendo o partido comunista o mais ortodoxo da Europa, partido não europeísta, a sua estratégia passa sempre pelo quanto pior melhor, prefere a direita no poder do que uma esquerda mais à sua direita.

Fala contra a troika e o seu pacto de “agressão”, mas foi um dos principais obreiros à sua vinda, quando outros avisavam que seria de fazer tudo para impedir que tal acontecesse.

 

 

O PCP sabe que quanto pior estiver o povo, melhor são as condições para crescer, usando de propaganda populista, e com soluções sem explicação.

Ao longo da minha vida, já longa, conheci muitos comunistas, amigos e conhecidos com quem travei diálogos mais ou menos vivos. Hoje, quase todos estão ou no PSD, ou tem ideias que muito se aproximam de uma ditadura de…direita.

Fui sindicalista muitos anos, eleito pelos trabalhadores, negociei contratos de trabalho com o patronato. Na altura, ligado a um sindicato que integrava a Intersindical, apercebi-me do que realmente era o Movimento Sindical.

A verdade é que para conseguir o acordo para o qual estava mandatado, tive que me distanciar da mesa de negociações já no Ministério do Trabalho, com o acordo das partes.

Numa reunião em separado com o meu opositor, em três horas resolvemos um assunto que demorava já semanas e semanas. O que tinha, até então, impedido a resolução da negociação e o que estava por trás era a manutenção de um conflito e não uma negociação séria para resolver os problemas.

 

Muitos anos volvidos, a estratégia continua a mesma.

Como se pode entender, que com tantos portugueses com salários de miséria, haja sindicatos predominantemente afetos à Intersindical, e dirigidos por comunistas, que façam greve por tudo e por nada, que banalizam a Greve Geral, que qualquer dia tem tanto efeito como uma outra greve qualquer.

Por mais que o neguem, a Intersindical é um instrumento da política do PCP, é dos livros.

Que movimento sindical é este que mantém dirigentes mais de trinta anos no poder, (nem ditadores assumidos o conseguiram)? O escândalo era tanto que, finalmente, mais de um terço, repito um terço foram para casa, com as suas reformas bem gordinhas, alguns já os conhecia desde…1974. É obra.

Que movimento sindical é este, que ao fim de tantos anos de democracia, nunca criou – não há um único sindicato que o tenha criado -, o fundo de greve?

Quem já viu em Portugal um sindicato defender os desempregados ou pensionistas, sendo que muitos deles até foram seus filiados?

Estes desempregados e pensionistas só servem para engrossar as manifestações da Função Público.

Deslocados em autocarros, não me parece que esses desempregados e pensionistas tenham dinheiro para pagar essas deslocações, seria bom perguntarmo-nos quem paga.

 

O curioso, é que não falta para aí, quem pense que isto é ser-se de esquerda.

Desconfio sempre dos slogans, repetidos à exaustão. Um deles é: “Amplas liberdades” frase ainda cara a Jerónimo de Sousa. Nunca percebi o que são amplas liberdades, a liberdade não é ampla, ou existe ou não.

Só alguém que não percebe muito bem o sentido da liberdade é que necessita de andar sempre a apregoá-la.

Se é esta, a esquerda que alguns pensam ser a correta, a esquerda que pouco depois do 25 de Abril tentou pôr em causa a liberdade, não obrigado.

Como disse outro poeta “sei que não vou por aí”.

Factos são factos e a história faz-se deles.

O estado social mais bem conseguido no mundo, foi sem sombra de dúvida o europeu.

Que eu saiba, nenhum Partido Comunista na Europa teve qualquer papel relevante na sua construção.

Nem em Portugal, o estado social que temos ou que ainda vamos tendo, foi protagonizado pelo PCP. Sempre arredado do poder pelos portugueses, o seu papel é irrelevante.

O seu furioso apego ao populismo e a aversão à negociação, apenas porque se julga o detentor da verdade e o dono da esquerda, impedem-no de tal. Na sua linha sindical, nunca foi praticamente possível construir soluções para um pacto social, com nenhum governo.

Abandonou praticamente todas as tentativas de concertação social desde o 25 de Abril, nunca chegou ao fim de nenhuma…que me lembre.

 

Estas atitudes nunca trouxeram valor acrescentado para os trabalhadores, antes pelo contrario, deixaram sozinhos aqueles que continuaram a lutar por melhores condições, olhando um mundo de hoje e não um mundo cujas realidades já desapareceram há muito.

Nem sempre conseguindo o que queriam mas conquistas foram sendo feitas, passo a passo sem tropeções.

Atravessamos hoje uma das fases mais difíceis da história do último século. As conquistas dos trabalhadores conseguidas principalmente no pós II Grande Guerra estão seriamente em causa.

Urge, que todos os que se reclamam de um ideal da esquerda democrática, trabalhem no sentido de um rápido entendimento entre as diversas tendências da esquerda, não se limitando apenas aquém-fronteiras mas que expandam este esforço ao espaço europeu.

A verdade tem que ser dita,

Portugal não conseguirá por si só alterar o rumo dos acontecimentos. Negar esta evidência é populismo.

É necessário uma politica de esquerda ao nível da União Europeia e rapidamente.

Essa frase populista utilizada pelo PCP e até pelo Bloco, de que “perdemos soberania” com a Europa, só atrasa o processo europeu. Problemas existem, não o nego. Como diz o povo, “Roma e Pavia não se fizeram em um dia”. São os mecanismos de integração europeia que necessitam de ser melhorados e, com isso, aumentar o nível de participação dos cidadãos numa Europa mais sua, mais democrática, mais solidária, com órgãos eleitos e responsabilizados. Na minha opinião é necessário caminhar bem mais depressa na construção de uma Europa Federal.

 

O Ideário dos partidos comunistas durante o regime soviético era a união dos povos sob a “Bandeira do Grande Partido Comunista da União Soviética” tão caro aos comunistas portugueses e internacionalistas. Até se apropriaram, da canção “ A Internacional” composta por Eugène Pottier, um operário francês, membro da Comuna de Paris em 1871. A canção acabou por se transformar no hino da União Soviética.

A vida é madrasta e afinal os povos da Europa acabaram por se unir mais depressa com as democracias do que com os golpes da União Soviética. Só não entendo porque é que hoje o PCP acha que perdemos soberania quando os outros povos da Europa perdem da mesma forma, ou seja, todos perdemos para todos, com um objetivo comum.

No passado, Álvaro Cunhal e outros comunistas ajudaram e participaram no Golpe de Praga do que resultou o fim da democracia e na invasão e ocupação pelas tropas soviéticas da Checoslováquia.

Nessa altura era tudo em prol das amplas liberdades e a libertação dos povos, nada de perda de soberania.

A história não deixa margem para dúvidas, mas o PCP e a “sua” esquerda ainda me deixam muitas.

 


 

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