Menu Fechar

O ISLÃO no PORTO. Tão perto e… tão longe!

Chegamos à hora marcada ao 223 da rua do Heroísmo. A porta fechada é em tudo igual a qualquer porta de um prédio urbano do Porto, através da qual nada se consegue alcançar, pela opacidade dos vidros e pela ausência de qualquer vestígio sobre a vivência da fé que existe para além dela.

Os segundos que demoraram para nos abrir a porta pareceram-nos infinitos, talvez pela inquietude natural de quem pretende aproximar-se de algo novo para descobrir.

Fomos recebidos por Abdul Rehman Mangá, o presidente do Centro Cultural Islâmico do Porto, de forma calorosa e simpática, que nos convidou a tirar os sapatos e a entrar para a sala principal onde desenvolvem o culto. Estávamos pois na única associação religiosa e cultural do grande porto, reconhecida pelas autoridades portuguesas, criada e frequentada por muçulmanos. Não se trata de uma mesquita, porque não foi construída de raiz para o culto da religião islâmica. Contudo, uma vez que ali se praticam as cinco orações diárias, os muçulmanos assumem o espaço como tal.

O lugar de Culto

Após subirmos uns pequenos degraus, esperava-nos uma sala ampla, rigorosamente limpa, já que , como disse o nosso entrevistado “ A higiene é metade da fé”. O chão, coberto por carpete vermelha, transmite uma sensação de conforto e bem-estar para quem chega e se “descalça”, também, da agitação da cidade.

Neste “chão” de culto, estão bem demarcados os “lugares” para os muçulmanos fazerem as suas orações em congregação, que devem ficar de pé “encostados, ombro a ombro, uns aos outros, todos virados para “Meca”. Este “alinhamento” para meca é uma forma de reforçar a unicidade e dirigir as orações num sentido convergente.

Ao fundo da sala, em destaque, a nobreza e, ao mesmo tempo, a simplicidade da madeira onde se distingue o espaço para os livros e o espaço de oração – o Mehad. Ao lado, a Cadeira, para a qual o responsável religioso – Imam -sobe, para dirigir o sermão, no dia sagrado para os muçulmanos – as sextas-feiras.

Impera o silêncio, a simplicidade, a paz refletida no rosto de um senhor que fazia as suas orações, numa postura de respeito, adoração e prostração, enquanto decorria a parte final da nossa entrevista. Para os muçulmanos, a oração faz-se numa relação direta com Deus, com Allah, pois como nos diz Abdul Mangá “falamos e dialogamos diretamente com Deus. Não há santos, não há nada, não temos fotografia absolutamente de nada, temos alguns versículos do Alcorão e mais nada… temos um relógio que nos ajuda a situar no tempo, para as orações, porque elas estão devidamente estipuladas”.

mesquita 04 - 01nov13

mesquita 05 - 01nov13

A comunidade muçulmana no Porto…

É nessa viagem pelo tempo, e agora em visita ao passado, que verificamos que a chegada de Muçulmanos ao nosso país deu-se, substancialmente, a partir do 25 Abril de 1974. Provenientes das ex-colónias portuguesas, acabavam por se instalar em Lisboa pois o único voo direto que havia para Portugal era para a capital. Com o passar dos anos a comunidade muçulmana foi-se dispersando pelo país e aumentando devido aos movimentos migratórios e pela via do casamento (as mulheres muçulmanas só podem casar com homens muçulmanos), assim como pela conversão ao islão independentemente do casamento.

Segundo Abdul Mangá, há 25 anos atrás “apenas uma média de 10 pessoas muçulmanas se reunia no Porto. Hoje, o grande Porto conta com a presença de, aproximadamente, cinco mil muçulmanos, número que, por si só, nos deverá impor a responsabilidade de sabermos um pouco mais sobre esta comunidade e sobre a religião do Islão de que são seguidores, relativamente à qual existem muitos estereótipos que só o conhecimento poderá ajudar a desconstruir. Esse número tende a aumentar, tal como acontece por toda a europa. No Porto muita gente se vem converter. Uma pessoa por semana. Ou por casamento ou pela religião, mas a maior parte das conversões não têm nada a ver com casamentos”.

mesquita 02 - 01nov13

Na mira dos Média

O Islão é uma religião para a humanidade, e sendo assim, as comunidades muçulmanas são muito heterógenas: existem muçulmanos árabes, persas, portugueses, e de muitas outras origens e naturalidades, sendo portanto comunidades muito diversificadas culturalmente. Esta pluralidade de realidades culturais e de diferentes tradições, tem contribuído para a má interpretação por parte da comunicação social e da sociedade em geral, relativamente a acontecimentos de violência que fazem parte da nossa historia e, relativamente aos quais, existe uma tendência infeliz para os associarem à religião do Islão.

Como nos diz Abdul Mangá, “sendo uma religião universal, é uma religião que neste momento esta na mira, vá la, de todos os media, dos jornais, das televisões. Por uma razão simples: uma razão de questões territoriais que estão a acontecer em toda a parte do mundo. Vou-lhe dar o exemplo da Palestina. A Palestina, que nós consideramos a Palestina ocupada, e que os palestinianos que estavam lá foram obrigados a abandonarem as suas terras e enviados para os campos de refugiados e os campos de refugiados já estão lá há mais de 40/50 anos, sem condições absolutamente nenhumas, nem condições de saúde, nem de salubridade nem de higiene, absolutamente nada… nem de escola. E as crianças vivem, nascem e crescem lá. Tornam-se adultos, com revolta, ficam revoltados a verem que a sua terra está a ser usurpada e que eles próprios estão na sua terra e não têm direitos absolutamente nenhuns. E então cria-se aquela questão da revolta… e a revolta cria violência.”

E acrescenta ainda…

“Os muçulmanos que estão longe da palestina também sentem pena dos palestinianos. As posses da terra prejudicam bastante as relações entre as pessoas”. E o que esta a acontecer na palestina, na síria, no Egipto, etc., etc… são questões territoriais, questões que ainda não ficaram bem definidas em termos de fronteiras, em termos de culturas- Há uma grande diversidade de culturas. Um país tem várias culturas, o exemplo do Bangladesh, que tem uma série de culturas que muitas vezes explodem e muitas vezes trazem essas culturas para dentro da religião e confundem cultura com religião. Não tem nada a ver … ”.

mesquita 03 - 01mov13

Cultura e religião

Existe uma tendência, também por falta de informação, para associar os muçulmanos, exclusivamente, ao mundo árabe. Mas, tal como nos refere Abdul Mangá: “Os muçulmanos, a maior parte não são árabes, só cerca de 15 a 18 por cento de muçulmanos de todo o mundo é que são árabes. Há uma grande diversidade de muçulmanos em todo o mundo. Também há árabes que são judeus, que não têm religião nenhuma, e há árabes muçulmanos. Na peregrinação a Meca, que está agora a acontecer, vimos lá pessoas de todos os quadrantes desde pessoas com olhos em bico (os orientais), irmãos do oeste, irmãos da America do Sul, Irmãos Asiáticos, vemos uma diversidade muito grande e muitos irmãos de olhos azuis, cada vez mais”.

Hoje a maior parte dos muçulmanos que estão em Portugal são cidadãos portugueses, mas os constrangimentos ao nível da sua integração ainda existem “muitos emigrantes que vieram das suas terras já idosos ainda conservam as culturas e a língua e as ideias dos países de onde vieram e portanto dificilmente deixarão essas tradições, vai levar tempo. Agora os jovens que vieram mais novos e os que nasceram cá, esses sim, já começam a adquirir a integração na sociedade sem deixar de ter a sua cultura e sem deixar de ter a sua religião. Portanto, temos de ter a consciência do seguinte: a sociedade portuguesa, a cultura da própria pessoa e a religião. São três fatores que um muçulmano terá de assimilar, o que não é muito fácil. Não é muito fácil, mas consegue-se. Consegue-se!”.

No que respeita à integração profissional, na opinião do nosso entrevistado, ela “ tem sido notória, mas o muçulmano sofre aquilo que qualquer pessoa sofre que é a falta de emprego para todos. Há algum fator discriminatório mas não muito relevante, porque isso é humano., pode haver uma cortina que condicione, mas de uma maneira geral não considero isso. Falo do meu exemplo, eu sou diretor administrativo de uma grande empresa/ grupo económico em Portugal e sou presidente da comunidade aqui no Porto”.

A Solidariedade e a Educação

O Centro Cultural Islâmico do Porto vai muito além de um lugar de culto, na medida em que se dedica também a causas sociais, de beneficência e solidariedade, contribuindo com donativos para instituições de apoio social como o “Coração da Cidade”, a AMI e outras organizações similares.

O centro possui também uma Madrassa, conceito nem sempre bem “tratado” pelos órgãos da comunicação social, mas que, como nos diz Abdul Mangá. “Aquilo que muitas vezes os jornais e a televisão chamam de Madrassa não é mais do que uma escola islâmica. Quando os jornais e as televisões falam em Madrassa falam num sentido pejorativo. Mas a Madrassa é, de facto, uma escola, uma escola puramente islâmica”. Uma vez que o culto é feito em árabe, é fundamental ensinar às crianças as principais palavras em árabe assim como, naturalmente, ministra-las no culto islâmico.

A Educação é um valor fundamental para os Muçulmanos, e a religião do Islão orienta os seus fiéis nesse sentido. “ Há uma frase do nosso profeta que diz: buscai o conhecimento nem que tenhais de viajar até à China. Isso ele já dizia há 1400 anos atrás. Porque o conhecimento, tanto para o homem como para a mulher, é extremamente importante, para as pessoas poderem viver em sociedade, livremente e viverem com melhores condições. Sem conhecimento não há propriamente nada.”

mesquita 06 - 01nov13

mesquita 07 - 01nov13

O papel da mulher na sociedade e o acesso à cultura é outro dos assuntos relativamente ao qual se assumem, inúmeras vezes, como dados generalizáveis, factos que dependem de cultura para cultura. Referimo-nos às mulheres muçulmanas que devem também ter a sua escolarização, e o Islão não só não se opõe como orienta nesse sentido. Como nos diz o nosso entrevistado: “Nós já temos muçulmanas engenheiras, medicas, etc. só que muitas vezes nós focamos os países pobres onde existem lá os muçulmanos, e onde já é diferente, porque quando há emprego os empregos são entregues aos homens e as mulheres ficam a tomar conta da casa.  Aconteceu também aqui em Portugal há anos atrás. Agora, naqueles países o desenvolvimento está a começar a dar-se e as coisas vão evoluindo. Agora nessas mulheres não se fala, fala-se mais nas mulheres que estão retidas em casa porque o próprio contexto social obriga a isso”.

Conhecer o Islão

“Conhecer o outro é importante para que não haja desconfianças, isso é muito importante para nós”. Abdul Mangá

Há medida que se vai conhecendo melhor a religião do Islão, com mais convicção ficamos de que se trata, de uma religião de paz e, de facto, de um autêntico código de vida, ou se quisermos, um código de conduta que orienta os muçulmanos para uma vida terrena mas que os prepare para a vida eterna.

“O alcorão e o livro das tradições do profeta Muhammed, para alem das tradições religiosas também indicam-nos, portanto, como nós devemos viver. A questão por exemplo da higiene, a religião diz que a higiene é metade da fé. E para nós praticarmos, por exemplo, qualquer ato de adoração ou de oração nós devemos estar completamente limpos. O corpo limpo, a roupa limpa, e o espirito também limpo. E também ensinamos como devemos comer, como devemos viver em sociedade, como devemos viver casados. Que o casamento é um dos pilares fundamentais da sociedade, ensina-nos isso e nós transmitimos isso aos nossos filhos”

Para os muçulmanos o respeito pela família, pela consanguinidade – pelos pais e pelos mais idosos é algo muito importante e tentam passar também esses valores aos seus filhos.

“Um companheiro do profeta chegou a ele muito arrependido e disse: Oh profeta eu saí de casa hoje e deixei os meus pais muito tristes. E ele ficou… deixaste os teus pais muito tristes? Então regressa a casa e vais deixa-los muito satisfeitos e muito risonhos e depois é que regressas outra vez.”

A religião do islão orienta também para a vivência da própria morte, que surge como algo para o qual os muçulmanos se vão preparando ao longo da vida, fisicamente, mas sobretudo psicológica e espiritualmente. “Esta vida é uma vida de passagem e a vida futura, sendo eterna, não terá fim, mas entrar numa das duas vivendas que existem no céu: o paraíso ou o inferno, dependerá do que se faz cá na terra. Deus criou todo o ser humano e deu-lhe o livre arbítrio. E de facto o homem tem, o que chamamos em português, a faca e o queijo na mão. Tudo o que ele quer decide”.

Na despedida desta vida, o funeral, é feito com grande simplicidade, cumprindo-se também aqui todas as tradições e procedimentos que o ultimo profeta da humanidade, Muhammed, transmitiu.”Porque os falecidos não vão com um caixão, vão simplesmente com um pano branco, um pano branco como nos embrulharam quando nós nascemos. Não precisamos levar absolutamente nada, apenas que nos deem um banho, nos embrulhem num pano branco e nos enterrem na terra, diretamente na terra”.

Em Lisboa existe um cemitério para os muçulmanos, o que ainda não acontece no Porto, embora a associação tenha já solicitado um talhão de terra, para esse efeito. Até lá, muitos muçulmanos têm sido enterrados no cemitério do Prado do Repouso, outros, preferem que os seus corpos sejam enterrados em Lisboa e assim se faz.

O Islão é de facto um código de conduta espiritual e social :“Assim como as autoridades também impõem limites na sociedade em que vivemos, na espiritualidade também deus impõe certos limites para nós não ultrapassarmos. Estamos dentro de uma barreira para que possamos viver numa sociedade em que nos possamos auxiliar uns aos outros e não nos atropelar uns aos outros. Mas infelizmente o ser humano, como tem o livre arbítrio atropela o outro ser humano”

mesquita 08 - 01nov13

O Deus Único

“Há muita confusão, inclusivamente aqui em Portugal que dizem: vocês adoram um deus diferente do nosso, vocês adoram Allah e nós adoramos a Deus. Então eu digo: os ingleses adoram a God,(…) e as pessoas ainda não entenderam essa questão.” Abdul Manga

“A religião islâmica é uma religião monoteísta. É uma religião que provém do tronco do profeta Abraão, com 3 ramificações: judaísmo, islamismo e o cristianismo. Curiosamente, são três religiões que acreditam num deus, num único deus, num mesmo deus. Os muçulmanos chamam a Deus, Allah, mas também os árabes cristãos ou drusos chamam de Deus, Allah. São cristãos e chamam Allah. Os egípcios, por exemplo, chamam de Deus Allah porque é a língua árabe que chama de Allah. Como nos diz Abdul Mangé, “É Deus da humanidade toda, mesmo daqueles que não acreditam nele, é Deus também deles!”.

Cinco pilares do Islão

Qualquer pessoa que se queira converter ao islão deve ter esta fé:

Primeiro – Acreditar que há um Deus Único e que o profeta Muhammad é o seu ultimo mensageiro. (Shahada). Para além de acreditar no Deus Único é preciso também que os muçulmanos acreditem nos imensos mensageiros e profetas que Deus enviou. “Se ele não acreditar em um único sequer ele deixa de ser muçulmano. Jesus, por exemplo, é um grande profeta e mensageiro de Deus, Moisés, Abraão, Jacób, Isac, todos eles são profetas de Deus”.

O que diferencia os muçulmanos dos cristãos é que aqueles não acreditam que Jesus seja filho de Deus, mas sim que ele é um grande profeta, um grande mensageiro, e um dos cindo principais mensageiros, e que ele voltará antes do fim do mundo.

Cinco orações por dia (Salat)

“Estamos a conversar com Deus. Quando estamos na oração nós estamos desligados de tudo. Estamos a falar ou a dialogar com deus”.

Todos os muçulmanos têm de cumprir com 5 orações por dia. Uma no início do dia antes do nascer do sol, outra ao meio dia, por volta da uma hora, mais ou menos, a outra ao meio da tarde e depois a outra ao por do sol, e à noite, passado uma /duas horas do por do sol temos então a oração da noite.

“Estas orações devem ser feitas de preferência na Mesquita. Se não puder fazer na Mesquita pode fazer no escritório, na fábrica, em casa, onde ele puder fazer. Se tiver grandes dificuldades, por nós vivermos num país que não é muçulmano, se tiver grandes dificuldades em fazer as orações no seu próprio local de trabalho, porque o patrão não deixa ou por qualquer outra razão, então faz essas orações em falta em casa, quando chegar. Deus não quer… não cria dificuldades a ninguém. Antes pelo contrário, facilita a vida de qualquer pessoa”.

As orações são uniformizadas: “Nós lemos capítulos do alcorão, recitamos capítulos do alcorão, durante a oração, e cada um récita o capítulo que melhor entender, que melhor decorou, sem quaisquer constrangimentos. E depois de ele fazer a oração, essa prece, ele levanta as mãos para Deus e pede tudo o que ele quer. Tudo o que é bom para ele, ele pede”.

Ramadão / jejum 

“As pessoas aguentam porque é a fé que comanda o corpo. a mente e que comanda o corpo”.

“ O jejum é a abstinência de alimentos desde o nascer do sol até o por do sol (durante 30 dias), mas não é só de alimentos, é também de deixar de dizer o mal, deixar de praticar o mal, tentar nesse mês do ramadão cumprir com a solidariedade humana, ser mais ativo nessa solidariedade. E estar muito mais ligado a Deus. É por isso que no mês do ramadão não há nenhum pobre que se diga que é pobre que não tenha nada para comer. Todos, pelo menos nesse mês, têm que comer”.

O Ramadão não calha sempre no mesmo mês do calendário gregoriano. Os muçulmanos seguem o calendário lunar e o calendário lunar é doze dias menos que o gregoriano. Portanto, ao longo dos anos passa pelas estações todas.

Já aconteceu, e vai acontecer em julho, que é o mês do pico alto em termos de calor. Os muçulmanos deixam de comer desde as cinco da manhã até às nove da noite. Portanto estamos a falar de cerca de 12 horas sem comer e sem beber, e muita gente trabalha na construção civil e acaba por aguentar porque, como nos refere Abdul Mangá, é a mente que comanda o corpo. Imediatamente apos o por do sol comem tudo sem problema nenhum, até antes do nascer do sol.

“ Nós quando passamos o ramadão, os 30 dias, nós passamos aquela fome, aquele período das horas sem comer, e faz-nos lembrar muito, refletir muito sobre aqueles que não tem nada para comer. É por isso que os muçulmanos tornam-se, nessa altura do ano, ainda mais solidários com aqueles que não têm. E conforme eu disse, nesse mês, não há nenhum pobre que diga que é pobre, em termos de alimentos”.

Durante o Ramadão, todas as mesquitas possuem alimentação, para quebrar o jejum e para o jantar, há alimentação para todos que queiram vir, para os ricos e para os pobres. Os ricos contribuem e todos, portanto comem em conjunto.

Na opinião do presidente do Centro Cultural Islâmico do Porto, apesar de estarmos muito avançados em termos de tecnologia, deveria de haver uma produção excedentária de alimentos para que todos pudessem ter o que comer, alimentação suficiente, e não está a acontecer isto. Não está a acontecer e há muita gente a morrer de fome. “ Num seculo deste, com um desenvolvimento muito grande e está a haver gente a morrer de fome. Isto é inconcebível. Para o ser humano e inconcebível, não faz sentido absolutamente nenhum”.

mesquita 09 - 01nov13

Zakat: Contribuição / purificação da riqueza

Isto é “todo o muçulmano financeiramente capaz deve tirar 2,5 % daquilo que lhe resta no final do ano e dar aos pobres. Dar com a mão direita aquilo que a mão esquerda não sabe. Isto é, para que possamos atenuar o sofrimento das pessoas que não têm nada para comer”.

Esse dinheiro do Zakat é recolhido pelas associações religiosas que depois é distribuído pelas pessoas mais necessitadas. O dinheiro do Zakat servirá para a alimentação, para as pessoas liquidarem algumas divídas, para preencher algumas necessidades básicas das crianças, das pessoas idosas, etc.. Este apoio fica entre os muçulmanos.

Não sendo obrigatório, é recomendado aos muçulmanos darem, além desses 2,5 por cento sempre que puderem, algo mais para a caridade, para pessoas necessitadas, sejam elas muçulmanas ou não, principalmente aos nossos vizinhos que possam estar a passar por dificuldades. “Se eu pensasse o seguinte: que não sou obrigado a dar mais do que os 2,5 por cento do Zakat para os muçulmanos eu não faria essas contribuições para os outros. Mas, eu devo fazer, porque eu estou inserido na sociedade portuguesa, da qual eu faço parte. Apesar de eu ser muçulmano eu sou português e tenho de ser considerado como português e tenho também de trabalhar para o desenvolvimento desta sociedade”.

mesquita 10 - 01nov13

Peregrinação a Meca (Hajj)

“Quem vai apaixona-se por aquele lugar e quer ir mais vezes e fazer a peregrinação.”

Todos os muçulmanos, financeiramente capazes, e de saúde, devem realizar uma vez na vida uma peregrinação à cidade de Meca, durante o mês de Dhu al-Hajj. Em Meca, os muçulmanos vão cumprir todas as atribulações e provações que o profeta Abraão sofreu quando esteve nesse local, nomeadamente quando ele quis sacrificar o seu filho e deus lhe colocou, em vez do seu filho, o carneiro para sacrificar. Entre outros rituais, como por exemplo dar 7 voltas à casa, os muçulmanos sacrificam um carneiro, como nos diz Abdul Mangá.

“Não com aquela ideia de sacrificar animais, não, mas é pura e simplesmente para que as pessoas possam ter alimentação para um dia de festa, para que as pessoas possam beneficiar da alimentação. E o que é que nós fazemos com aquela carne? Nós dividimos a carne em três partes, uma parte é para consumo próprio, outra parte é para darmos aos vizinhos e familiares e a terceira parte é para dar aos pobres para que possam comer carne. Como sabe as pessoas que não têm posses financeiras, praticamente, carne não comem, porque é um artigo praticamente de luxo, em muitos países”.

No cenário de crise atual, em que vivemos, com o panorama das guerras, da pobreza e da exclusão social, a mensagem que o presidente do Centro Cultural Islâmico deixa para os nossos jovens e para todos nós:

“Sempre que faço as minhas intervenções para os não muçulmanos e quando há juventude na plateia, eu costumo dizer sempre a toda a juventude de que as pessoas devem acreditar em deus. Devem acreditar em Deus. Devem ter uma fé, seja qual ela seja. Seja ela judaica, cristã, muçulmana… eles devem acreditar em Deus, devem ter uma fé. Porque a fé vai-lhes ajudar a ultrapassar as dificuldades que as próprias pessoas têm. Não lhes falo das dificuldades financeiras, falo das dificuldades sociais, dificuldades da sociedade em si, de integração, de tudo mais e portanto a Fé em Deus ajuda a ultrapassar muitas dessas situações. E também digo à juventude para que possam estudar. Possam tirar cursos técnicos ou cursos superiores para que possam singrar na vida, para que possam levar este Portugal para bom Porto!”

E diz ainda:

“Não tenham medo… podem ter medo dos muçulmanos, mas não tenham medo do Islão. O Islão não pode meter medo a ninguém porque o Islão é uma religião de paz de tranquilidade… é uma mensagem que transmito transversalmente em todos os encontros que faço, no final da intervenção que eu faço a todas as pessoas, e penso que as pessoas compreendem que não podem aliar a religião islâmica à violência, não tem nada a ver! Porque existe no mundo um bilião e quinhentos milhões de muçulmanos, que a maior parte vive em paz e harmonia, mas desses a imprensa não fala. Fala só daqueles que, de facto, vivem em guerra, que é uma minoria no meio de tudo isto”.

União e Paz

Muito mais haveria para conversar e aprender, com Abdul Mangá. O Centro Cultural Islâmico do Porto deixou-nos as portas abertas para voltarmos. Como foi sendo referido, só o conhecimento da realidade nos poderá tornar livres para decidir o nosso caminho e para fundamentar as nossas ideias e ações. Afinal, o Islão está tão perto e tão longe!

Esperamos, com este pequeno contributo, contribuir para a desconstrução de estereótipos que se refletem em atitudes de discriminação e de afastamento relativamente aos muçulmanos e, sobretudo, à religião do Islão. Afinal, são 5000 os Muçulmanos no grande Porto, temos muito mais a unir-nos do que a separar-nos. Acreditando ou não em Deus, ou que somos todos irmãos, todos vivemos numa sociedade que, desde sempre, mas hoje, mais que nunca, nos “grita” desesperadamente por respeito, tolerância, responsabilidade e solidariedade! A Humanidade precisa de construir a União e a Paz! Só depende de nós, essa construção!

Texto: Ana Cláudia Albergaria

Fotos: António Amen

Partilhe:

5 Comments

  1. Isabel Rêgo

    Há 1 ano e meio que ,descobri a religião ialámica ,e descobri que me sinto em Paz .inch ‘ Allah .

  2. Anónimo

    Para quem gosta imenso da cultura árabe, sem dúvida uma excelente reportagem Ana. Se calhar a próxima poderias fazer sobre a arte desta civilização do qual temos profundas raízes.
    Muitos parabéns por esta primeira colaboração.
    Espero pela próxima.

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado.

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.