José Lopes (*) / Tribuna Livre
A fúria privatizadora do atual governo no setor estratégico dos resíduos, que a maioria de direita que o suporta na Assembleia da República abriu caminho ao aprovar a Lei nº 35/2013, de 11 de junho, para a pretendida reorganização do sector, tornando assim possível que a exploração e gestão de sistemas multimunicipais da recolha selectiva de resíduos urbanos passassem a poder ser atribuídas a empresas privadas, teve recentemente como corolário do processo de reprivatização da Empresa Geral do Fomento, S.A. (EGF) a sua venda à Mota Engil, correspondendo à lógica liberalizadora de entrega do sector dos resíduos a privados.
Com tal processo de privatização o governo põe em causa um serviço público, mas sobretudo, coloca a saque, o património desta então empresa pública lucrativa, avaliado em cerca de mil milhões de euros e investimentos que em 2012 atingiram os 45 milhões de euros. Ao mesmo tempo que, sendo o governo sócio de vários municípios, por via das empresas detidas pela EGF, apenas estabeleceu a possibilidade de, no âmbito do processo desta privatização, estes venderem as suas participações.
Perante tal quadro imposto pelo governo PSD/CDS, a Câmara Municipal de Ovar com uma maioria PSD, ainda que antes tenha defendido que a ERSUC deveria manter-se na competência das autarquias, afirmando mesmo o seu executivo que estava disponível para comprar participações de outros municípios na ERSUC, acabou por vir aceitar que não havia outra alternativa há venda da participação na ERSUC, uma vez que a privatização da EGF era um facto consumado e que, estando a maioria da participação de 51por cento nas mãos da EGF logo os municípios estariam sempre numa posição minoritária.

A decisão de alienação da participação do Município de Ovar na ERSUC tomada em reunião de Câmara de 14/07/2014 teve os votos contra dos vereadores do PS. Mas viria a ser na Assembleia Municipal de 21/07/2014 em que o executivo camarário recorreu a novos argumentos para garantir a aprovação da opção de venda da participação do Município no capital social da ERSUC, que provocou agitação entre os autarcas da oposição, quando o próprio presidente Salvador Malheiro, adiantou, que “quem votasse contra a Opção de Venda das ações da ERSUC, estaria a votar contra o reforço do Fundo de Emergência Social Municipal”.
O autarca tem ainda justificado a opção de venda como sendo resultado do processo de privatização da EGF “por imposição da troika”. E como em sua opinião, os municípios que integram a ERSUC não têm possibilidade de aumentarem o seu capital nesta empresa, para ficarem com a maioria das ações, e poderem influenciar na fixação das tarifas, a solução foi a venda.
Com esta polémica venda, o Município de Ovar garante um encaixe financeiro de cerca de 400 mil euros para a Ação Social, que pode reforçar o Fundo de Emergência Social que tem neste momento um orçamento de 75 mil euros. Mas, para o PS, que votou contra a alienação, “existiam, claramente, alternativas à opção de venda da participação do Município no capital social da ERSUC. Não temos dúvidas ter sido esta a pior posição possível que o Município poderia ter assumido no âmbito do processo de privatização da Empresa Geral de Fomento, desencadeado pelo Governo à revelia da grande maioria das autarquias”. Na mesma sessão municipal o PCP apresentou uma moção que acabou reprovada, em que rejeitava o processo de privatização da EGF e propunha ainda “exortar o município a adotar as medidas para preservar no domínio público a competência do tratamento de resíduos sólidos urbanos”, lembrando que a privatização da EGF “tem sido alvo de forte contestação por trabalhadores, sindicatos, associações ecologistas, bem como numerosos municípios do país, pelo perigo de piora do serviço, subida dos preços e precarização dos vínculos laborais que acompanham as privatizações”.
Já para o BE, que voltou ao tema na sessão da Assembleia Municipal de 26 de setembro, “dizer que a verba de 400 mil euros seriam para aumentar o apoio social e para pagar o remanescente caso as tarifas sejam aumentadas. Também isto nos deixa duas dúvidas. Quererá isto dizer que o aumento do apoio social só poderá ser possível porque há este encaixe extraordinário? Bem mais interessante é que o dinheiro que o vencedor da privatização vai gastar na compra das ações será aos poucos ressarcido através da subsidiarização da Câmara nas tarifas”.
Mas para o Bloco, o argumento da Câmara sobre a posição minoritária para alienar a sua participação na ERSUC, deixa antever que, “mal as Águas de Portugal sejam privatizadas, uma vez que já saíram dos sectores estratégicos nacionais num documento do governo, este executivo camarário na mesma linha, apoiará e alienará a sua participação na AdRA”, concluindo ainda que, “quem aliena sectores estratégicos do sector público é contra o interesse público, não preserva os interesses dos munícipes e é contra a população Ovarense sendo responsável e responsabilizado por isso”.
Os argumentos da oposição não foram suficientes para contrariarem a opção da Câmara e da Assembleia Municipal de Ovar que deram o seu contributo ainda que ao nível local no âmbito de empresas intermunicipais como a ERSUC, para limpar o caminho de potenciais obstáculos, que representaria resistir, mesmo em minoria à lógica privatizadora do Governo na defesa na manutenção nos municípios, individualmente ou através de empresas intermunicipais, que garantissem a gestão dos sistemas multimunicipais de resíduos geridos pelas empresas detidas pela EGF.
Fotos: Pesquisa Google
(*) Correspondente “Etc e Tal Jornal”, em Ovar
01-nov/dez14
O “Tribuna Livre” é o seu espaço. Aqui pode dizer de sua justiça, abordando, ao pormenor, assuntos que lhe sejam caros e de interesse geral. Sempre respeitando o Estatuto Editorial deste jornal, pode enviar para a nossa caixa de correio eletrónica (etcetaljornal.site@gmail.com) até ao dia vinte de cada mês, o seu artigo, escrito em Microsoft Word e acompanhado, se assim o entender, da sua fotografia, neste caso em formato JPG ou JPEG.
Contamos com a sua colaboração. Este é um Espaço de Liberdade responsável…