Benigno Sousa (Leitor) / Tribuna Livre
É arriscado definir o que se entende por liberdade. Dizemos que há liberdades: religiosa; política, decisão, expressão, etc. Genericamente se caracteriza pela ausência de constrangimento.
Os filósofos não lhe atribuíram sempre o mesmo significado. Para Espinosa, por exemplo, a liberdade era o estado do ser humano que realiza através dos seus atos a sua verdadeira natureza, e considera a natureza humana fundamentalmente pela sua racionalidade, moralidade que a define. Liberdade “nunca é propriedade da vontade.” Só deve considerar-se livre uma causa «que existe só pela necessidade da sua natureza e só por si é determinada a agir.”
No século XVII, Espinosa caracteriza liberdade por algo de “interior”. Não somos livres senão devido à nossa essência e ao que dela advém, e nunca por determinação da nossa vontade. Deste modo, liberdade é uma ilusão fundamental da consciência na medida em que Espinosa acredita a ação voluntária da alma sobre o corpo. O “homem não nasce livre, torna-se livre quando entrou na posse da sua potência para agir”. A potência é o ato e a “potência do homem é uma parte da potência infinita de Deus”.
No século XVIII, Kant caracteriza liberdade por questão moral e não física. O homem é livre quando se assume na dimensão de personalidade, quando deixa de ser inteiramente natural ultrapassa a animalidade e a racionalidade. “A lei moral exprime a autonomia da razão pura prática, isto é, a da liberdade.”
“A lei moral determina a vontade.” Liberdade permite à pessoa a observância: a lei pura liberta de animalidade. Se analisarmos outras perspetivas filosóficas, há necessariamente outras ações. No século XX, Sartre caracteriza a liberdade como condição da ação, afirmando que a mesma só existe na decisão. Ela é o fazer constante, comprometendo o homem. “O homem é não apenas como ele se concebe mas como ele quer que seja; o homem não é mais que o que ele faz, um projeto que se vive subjetivamente.”
Assim, quando se realiza um dos atos que permite realizar o homem que deseja ser, simultaneamente criamos a imagem do homem como julgamos que deve ser. Neste processo, a nossa responsabilidade envolve toda a humanidade. “Sou responsável por mim e por todos, crio uma imagem do homem por mim escolhido: escolhendo-me; escolho o homem”. Toda a liberdade é assim, liberdade em situação e não abstrata. Como ser no mundo, o homem está condicionado por mecanismos físicos, biológicos e sociopolíticos. Paixões, o outro e a teia de relações que nos envolvem, condicionam-na. Mas quando triunfa estabelece liberdades ao abrigo das quais se pode enfraquecer ou desvitalizar. Isto não permite dizer o que é a liberdade. Será a própria capacidade do homem transcender?
Mundo enigmático
Tempo inestético
Inexaurível espaço
Reservado laço
Cassar aviltar
Ultrajante falar
De tudo que não conhecem
Ágapes em vereda arremetem
Errôneo perecer apascentação
Negrume da escuridão
Santos desarreigados
Miríades ímpios candelabros
Dois gumes maná blasfemar
Remanescente unguentar
Excipiente excídio congregação
Esmorecer obstante tribulação
Dever ser
Arco-íris precioso
Ser dever
É espirituoso!
A garantia da liberdade humana se encontra na diversidade e incomunicabilidade do ponto de vista humano. O homem não possui a noção suficiente e completa da sua própria substância individual e, portanto, não pode descobrir nela a razão suficiente das suas ações senão depois de as ter praticado; liberdade humana é precisamente a força ou o poder que o homem encontra em si mesmo para começar ou impedir as suas ações voluntárias. Mas será que o homem é livre no sentido de poder fazer ou não fazer o que quer? Nem sempre!
Diversos motivos há a invocar para a compreensão da urgência de liberdade como fundamental. A atual humanidade apresenta cifras dramáticas e uma precária condição humana; num tempo injusto e necessitando duma mudança, a fim de tornar decisivamente a civilização da Dignidade, cuja meta se traduzirá num humanismo que não deverá nunca distanciar-se de um humanitarismo; na justiça e na bondade, onde a vida humana ganhe algum sentido.
A reflexão de liberdade conduz à experiência quotidiana da Dignidade que gera necessariamente uma sabedoria, capaz de propiciar verdades para a vida, vocacionada a pensar argumentos no afrontamento do erro, da injustiça, da desordem ou violência. Afirmação de valores que constituam a base no agir lúcido e corajoso, mas obediente; é uma responsabilidade solidária capaz de dominar delírios que destroem a liberdade e atraiçoam a justiça. Uma atitude de liberdade constrói um projeto ético para a vida pela qual as atitudes éticas procedem da autonomia da pessoa, mediante intuição dos valores, quer através da liberdade da sua vontade, quer como um projeto para a vida na experiência da liberdade. O ser humano implicitamente afirma a sua conceção do mundo; são ideais que asseguram a autorrealização cujos relacionam com a liberdade e a responsabilidade. Assim, a ação moral é uma experiência dos valores da liberdade, e da responsabilidade; é fins concretos e situações concretas face às quais indiferença ou renúncia é ainda a escolha, onde necessariamente se revelará a vontade livre.
Quantos foram os desventrados pela espada da intolerância; os enforcados na corda da opressão e os baleados à porta do trabalho? Foram todos os que lutaram pela liberdade. Oh, Liberdade! Sempre que me lembro de ti sinto-me preso ao meu corpo. Quero voar pelo espaço e no tempo a cassar opressão. É hora de valeres no sentir e no pensar nua de preconceitos.
Ela se debruça sobre o agir humano, questão alteridade, é pensar a relação com o outro, como ser humano. Alteridade é questão da responsabilidade perante o outro que me é sempre transcendental. É minha experiência da liberdade, condicionalismos e determinismos por vontade que acarretam as possibilidades da ação, consciência dos motivos. São os atos que definem os seres humanos. Tradições são valores dos mortos.
Liberdade é experiência da intersubjetividade. Há, contudo, a questão decisiva: qual o direito dos outros em nos exigirem responsabilidade moral?
Nesta reflexão a moralidade radica na possibilidade da liberdade. Porém, qual o conteúdo? Do ponto de vista moral se encontra numa bipolar dimensão de Liberdade e Justiça, cuja tomada de consciência em todos viabilizará seguramente uma civilização pautada por normativa conducente à realização da ideia de Dignidade. Nos valores da tolerância e da solidariedade, pilares, onde se destaca a prevalência da liberdade e da igualdade objetivando desenvolvimento de sociabilidade e dos direitos individuais que reconhece a importância da determinação dos limites éticos do poder, concretizando-se no que Aronguren designou “Democracia moral”, isto é, a liberdade na experiência de vida como compromisso construído sobre dinamismo da liberdade e da autonomia humana orientada no consenso universal. Assim, podemos compreender o sentido da sua fundamentação na experiência intersubjetiva, isto é, diálogo de homem a homem, assumindo-se com saber acerca da retidão e da justiça, capaz de pôr termo ou, como escreveu Edgar Morin, “resistir à crueldade do mundo”.
Dizemos as mesmas palavras; cumprimentamos ao mesmo sorriso e fazemos as mesuras; obedecemos a mundo de fórmulas e palavras que submetem-nos, subjugam-nos, com pequenas ações de ridículos, imbecilidades. Somos grotescos ao lado da vida e da morte e para não morremos de espanto inventamos as palavras, honra e dever, a consciência e o inferno.
A Cidade regula-se pelos hábitos e regras seculares e só para fingir indiferente o que nos rodeia habituamo-nos e sorrimos. Está aí a morte e a vida, é espanto! Isto é nada – vulgar e quotidiano. Todos se defendem, e por isso existe grandeza em repetir os dias nas mesmas coisas; o homem vive detalhes e as manias têm uma força enorme: são elas que nos sustentam. Em tudo isto entranhou interesse e ódio. Há uma mescla de inutilidade, fé, sonho, mas uma ideia, uma vida, uma alma – tudo isto se impregnou em desespero.
À contemplação é necessário temperamento e estado de espírito adequados; conjunto de circunstâncias externas adequadas. Estes aspetos existem continuamente em formas e sequências repetidas. Caricaturar crença, ridiculizar, enxovalhar, provoca revolta. É que ao seu Deus os crentes não querem roupagem do mal. Terra negra, ingrata, detritos, rocha, é coisa séria: diante do Universo é menos que um caco; pobre coração usado pela dor. “Quem semeia ventos colhe tempestades”. O respeito pelos outros permanece enquanto os outros respeitam o nosso. Na lei moral sempre há uma boca a pregá-la. E tudo tem limites!
01mar15
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