António D. Lima/ Tribuna Livre
Lembrei-me do grande poeta revolucionário Ary dos Santos e do seu magnífico poema “As Portas que Abril Abriu”. Escreveu este poeta no poema acima citado:
“Quem a fez era soldado/homem novo capitão/mas também tinha a seu lado/muitos homens na prisão”.
Um camarada de armas, de seu nome Carlos A. A. Neves, abriu uma página no facebook com o nome “Os Combatentes do Ultramar e suas Famílias”.
Rapidamente, esta página começou a ter muitos, mas mesmo muitos aderentes. Em resultado desta aderência, e porque também antes de ser homem feito, foi também militar.
Todos sabemos (só não sabe quem não quer, ou quem usa palas só para olhar enfrente) que este nosso desgraçado país tem filhos e enteados.
Os filhos são aqueles bois… desculpem, quis dizer “Boys”, que estão no arco da governação e roubam que se fartam. As vítimas destes ladrões são os de costume, o Povo.
Deste povo do qual eu também faço parte, a juventude da década de 60 e até quase finais da década de 70 foi a mais sacrificada com esta inútil guerra do Ultramar.
Tínhamos três terríveis frentes de combate. Guiné, Angola e Moçambique. Estas três frentes de combate foi, como se sabe, uma tragédia para muitos jovens. Uns morreram, outros ficaram inutilizados (mutilados) para todo o sempre e outros perderam a saúde com o trauma da merda destas guerras.
Todos sabemos que estas guerras são o conflito entre capitalistas e naturais negros.
Foi um conflito entre nações no plano político.
Foi o conflito entre os capitalistas de vários países, sempre ávidos por se apoderarem do que é dos outros
Passou a ser um conflito de interesses dos naturais negros (a ambição de poder não tem cor).
Também havia, e há, naturais brancos com os mesmissimos direitos que os negros e que não foram devidamente acautelados por quem de direito, por quem engendrou a descolonização. Mário Soares e Almeida Santos.
Os resultados destas guerras trouxeram muita dor para as famílias que perderam os seus familiares. Para os que ficaram para sempre nas mais diversas situações de terem de depender de outros. Os que padecem de perturbações do foro psiquiátrico desligando-se da família e de tudo o resto que os rodeia.
Estes são os sem-abrigo, os que vegetam, os que vivem da solidariedade do voluntariado. Não, não falo da Cruz Vermelha nem de outras instituições ditas de caridade. Estas mais não são do que um antro do salve-se quem puder e olham muito para o seu umbigo e para os seus bolsos.
Os sem-abrigo continuam a ser os sem-abrigo. As famílias continuam a não ter os seus familiares e nem podem, pelo menos, fazer o seu funeral. Os outros, como eu, chegados a esta idade, temos como paga pelo sacrifício feito em defesa da pátria, a total ausência de qualquer privilégio. Somos isso sim, os eternos esquecidos que até a taxa moderadora pagamos.

A pensar nesta injustiças e depois de falar com algumas patentes militares, o camarada de armas Carlos A. A. Neves organizou uma manifestação de combatentes do Ultramar com o objetivo de se conseguir algumas regalias, pelo menos era uma forma dos governos reconhecerem o importante papel desempenhado pelos militares que lá combateram.
Pedia-se que o 18 de Abril* fosse feriado nacional e fosse assinalado como o dia dos Combatentes e das Forças Armadas. Tornava-se, assim publica a homenagem aos soldados tombados no cumprimento do seu dever. Relembrados pelo menos uma vez por ano, era justo.
Isenção das taxas moderadoras nos hospitais e centros de saúde.
Transportes gratuitos.
Subsídio de combate para todos os que estiveram no Ultramar.
Durante quase dois meses trabalhou a organizar tudo isto. Falou com as chefias militares, policia etc.
As adesões, pelo menos no facebook, chegaram quase aos 8 mil.
Tudo apontava para uma grande manifestação. Não foi, pelo contrário foi um fracasso, apareceram poucos, muito poucos para o que se pretendia. Naturalmente que o governo e outros temiam esta manifestação.
Não tenho qualquer dúvida que, (embora esta manifestação não sendo de cariz partidário nem era tolerada qualquer referência, tanto em palavras de ordem, como cartazes ou tarjetas) algumas máquinas partidárias, em especial as do governo, tudo fizeram junto dos seus militantes, esquecendo-se estes que antes de serem militantes, foram combatentes conseguindo assim, desmobilizar muitos camaradas de armas.
Um outro fator negativo é a crise, ainda fica caro camaradas deslocarem-se das suas terras para Lisboa.
Um ultimo fator, talvez o mais importante foi a falta de publicidade nos órgãos da comunicação social, quer escrita quer falada.
Já tive a oportunidade de escrever aos camaradas de armas que estiveram na primeira linha do combate. Disse-lhes, não perdemos a guerra. Perdemos uma batalha. Eles como todos os outros sabem, que devemos recuar, reorganizar as forças e voltar a atacar.
Unidos venceremos, a Vitória Final será Nossa.
* Dia 18 de Abril foi o dia em que embarcou, de avião, o primeiro esquadrão de combatentes.
Fotos: Pesquisa Google
Por vontade do autor, e de acordo com o ponto 5 do Estatuto Editorial do “Etc eTal jornal”, o texto inserto nesta rubrica foi escrito de acordo com a antiga ortografia portuguesa.
01mar15
Fomos muitos mil… que querem caladinhos, sem fazerem ondas onde a voz possa surfar ;somos ainda mulheres que eram noivas, irmãs ou já mulheres; são ainda os filhos a quem esses muitos mil, não falam de África nem de barcos com gente nos porões, nem das caixas de pinho que traziam pedaços de muitos jovens…muitos mil…E FEZ-SE ABRIL E MATOU-SE A GUERRA COLONIAL E FICARAM OS CORPOS DE RASTOS.