A cidade do Porto tem quase mil “ilhas” (aglomerados habitacionais formado por casas térreas de reduzidas dimensões, que surgiram como “cogumelos” em meados do século XIX e princípios do XX, destinos a albergar trabalhadores e suas famílias, aquando da revolução industrial verificada na cidade), isto segundo um levantamento, recentemente, apresentado por Isabel Breda e Paulo Conceição, da Universidade do Porto, com a “chancela” da Câmara Municipal.
Ao certo, e segundo o referido levantamento, são 957 as “ilhas” que fazem da Invicta um verdadeiro “arquipélago” e onde vivem aproximadamente 10.400 pessoas em condições sociais, na maioria dos casos, verdadeiramente precárias, com Campanhã a assumir-se como “capital”, já que, só nessa freguesia (uma das maiores do Porto em termos territoriais e demográfico), existem 243 aglomerados habitacionais com essa especificidade.
No “ranking” de “ilhas do Porto, a União das Freguesias do Centro Histórico e Cedofeita surgem em segundo lugar (176), e logo atrás Paranhos, com 155 “ilhas”.
Se bem que, hoje, o retrato que se faz das “ilhas” seja bem diferente do de há umas décadas atrás (casa de banho comunitárias, ausência de água canalizada e deficiência de esgotos), a verdade é que esses continuam a ser locais onde as graves carências sociais são visíveis quase à vista desarmada, e dizemos “quase” porque esses espaços escondem-se, normalmente, por detrás de prédios. Têm uma única e estreita entrada, passando, assim, quase despercebido ao cidadão comum, ainda que no seu interior possam existir mais de uma dezena de “habitações”. De salientar, e de acordo com o referido levantamento, as 957 “ilhas” são compostas “por mais de oito mil casas, mas somente 4.900 estão habitadas.
“Ilha” da Bela Vista … exemplo de reabilitação
Para já, é também de enfatizar o facto da Câmara Municipal do Porto, tal como está já acontecer com a “ilha” da Bela Vista (uma das últimas na propriedade do município e situada na freguesia do Bonfim) querer aproveitar esses espaços para “a reabilitação urbana da cidade, a preços competitivos”, sendo de destacar ainda “o estilo de vida comunitária que proporcionam, o qual está de acordo com o caráter da cidade”. Um dos objetivos da autarquia tripeira é o de transformar as “ilhas” em “laboratórios” para que os “privados possam nelas intervir e, assim, trazer, mais população para o Porto”.
Ernesto Santos: “O trabalho que a Câmara do Porto está a desenvolver é extremamente positivo”
Campanhã, como atrás se referiu, é a freguesia do Porto com maior número de “ilhas” (243), sendo, assim, já considerada a “capital” do “arquipélago”.
Ernesto Santos, presidente da Junta, em declarações ao nosso jornal, salientou o facto de “Campanhã representar um quarto das “ilhas” da cidade do Porto”, sendo que a freguesia da qual é presidente de Junta “represente, territorialmente, um quinto do Porto”.
“Uma parte das ilhas não estão, de momento, habitadas. Faleceram já muitas pessoas idosas, mas, em contrapartida, há casas que estão a ser ocupadas por pessoas que perderam os seus apartamentos por incumprimento de pagamentos aos bancos”.
Segundo Ernesto Santos “ o trabalho que está a ser desenvolvido pela Câmara Municipal do Porto no que concerne à reabilitação das ilhas, é extremamente positivo, começando esse projeto piloto, pela da Bela Vista, na freguesia do Bonfim. É, no fundo, preciso dar mais qualidade de vida às pessoas que residem nas ilhas, uma parte considerável já com certa idade, que de lá não querem sair, porque lá nasceram ou foram criadas e têm uma importante relação de proximidade com os vizinhos”.
Sendo contrário à criação de mais bairros sociais (“ilhas” ao alto) e a deslocalização das pessoas para zonas desconhecidas, o autarca de Campanhã continua preocupado com “as carências sociais que se verificam nas ilhas”, destacando o facto de “muitos idosos não terem sequer dinheiro para pagar medicamentos e muitas dificuldades para cumprirem com as faturas da água e da eletricidade e, pior ainda, para se alimentarem. Há pessoas, e não são poucas, que passam fome!”.
Nesses aglomerados há outra nota de registo a ter em conta: os desempregados, toxicodependentes e demais pessoas beneficiárias do Rendimento Social de Inserção (média de €178 mensais, valor que não dá para pagar o aluguer de um quarto).
Pêgo Negro: a zona mais problemática de Campanhã
Pêgo Negro é, de acordo com Ernesto Santos, a zona mais problemática da freguesia de Campanhã, também ela constituída por “ilhas” sem qualquer tipo de condições de habitabilidade. O autarca, neste caso, defende a construção, no local, de habitações dignas, não obrigando, assim, a que os atuais residentes sejam forçados a ir para outras zonas da cidade.
“É de louvar o levantamento que foi feito pela Universidade do Porto em parceria com a Câmara Municipal relativamente às “ilhas” na cidade do Porto, as tais “ilhas que os carteiros bem conhecem, até porque contactam diretamente com a população e entram por esses bairros dentro sabendo em que condições vivem as pessoas. Eles e elas – profissionais dos CTT – sabem muito bem a triste realidade que afeta largas centenas de famílias”, palavras de Ernesto Santos, líder de uma autarquia que dá, diariamente, apoio alimentar a dezenas e dezenas de pessoas.
Realidades de um Porto que não faz parte dos roteiros turísticos, mas que, em boa verdade, a autarquia (leia-se Câmara) está a estudar para… intervir. Intervindo numa ação de reabilitação até porque as “ilhas” do Porto tem história e caraterísticas sui-generis que moldaram gerações.
Texto: José Gonçalves
Fotos: António Amen (arquivo) e pesquisa Google
Sobre a temática: ler peça de Maria Rodrigues, em “Tribuna Livre” nesta edição do nosso jornal.
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É possível ter acesso a informação sobre as ilhas existentes na cidade do Porto? Localização/Morada?