Portugal está de luto. Os incêndios de Pedrógão Grande, Figueiró dos Vinhos, Góis e outras zonas da região de Leiria mataram um número nunca visto de pessoas em acidentes naturais registados, em memória recente, no nosso País.
Desde já, às famílias enlutadas os nossos mais sentido pêsames.
Lamento, infelizmente, e para iniciar esta Editorial – é sempre difícil escrever editoriais destas -, os comentários, verdadeiramente, irracionais de certos pseudoformadores de opinião, ou meros profetas da desgraça, nas redes sociais e até em alguns órgãos que se intitulam de comunicação social.
Perguntar, numa ocasião destas; numa tragédia destas, com as caraterísticas extraordinárias da mesma, se havia meios suficientes para combater as chamas (?) é no mínimo um ato de provocação. Só quem andou no terreno; só quem já alguma vez cobriu, jornalisticamente, um incêndio – como é o caso de quem vos escreve – sabe, mais ou menos, o que é o descontrolo das chamas, empurradas por ventos ciclónicos, e ainda mais – como foi o caso – com trovoadas secas, temperaturas elevadíssimas (40 e tal graus) e ainda com combustível a ajudar o fogo, oriundo da seca que atinge a maior parte da floresta nacional.
Tivessem os meios necessários, em quantidade e qualidade, ninguém poderia pôr cobro a esta tragédia, dado o facto de estes incêndios (não foi só um: houve quatro frentes e diversas reações paralelas) terem registos verdadeiramente específicos que, no momento, na altura, e no imediato, ninguém (repito: ninguém!) poderia controlar.
Se tivessem aviões canadair, ou helicópteros (como até tinham), eles não poderiam levantar voo, não só devido à altura das chamas, como ao denso fumo e ao forte vento que se fazia sentir. Se tivessem carros de combate suficientes prevendo o maior flagelo de sempre (o que, por si só, é impensável), não os poderiam movimentar, correndo o risco de os mesmos serem engolidos pelas chamas. Se tivessem um bombeiro por habitante, os mesmos poderiam morrer juntamente com os habitantes, como aconteceu em alguns casos nesta tragédia.
Poucos sabem o que são “ondas de fogo”. Uma onda de fogo (e se estiver errado, alguém que me corrija), ajudada por ventos ciclónicos que, de um momento para o outro, podem mudar de direção e apanhar desprevenidos quem quer que seja, podem percorrer quilómetros em poucos segundos. Quem está preparado para combater uma coisa destas? Ninguém!
Para quem tem, por exemplo, os Estados Unidos, ou a Austrália como referência de terem tudo e mais alguma coisa de bom para satisfazer as mais básicas necessidades das populações, relembre-se das tragédias já ocorridas nesses países com incêndios parecidos com os que ocorream dias 17 e 18 de junho na região de Leiria.
Falar por falar. Falar ao desbarato sem conhecimento de causa é um ato criminoso. Se não é, devia ser!
Esses paladinos da verdade, e suprassumos da retórica foleira, deviam durante o ano, e nas redes sociais – em vez de comentarem – por exemplo no Facebook – ou divulgarem imagens (para rir daqui a quinze dias) das mamas da Cristina Ferreira, do rabiote do Goucha, ou do casamento de um periquito com uma jiboia- deviam (repito) desenvolver diálogos, comentários, sobre os PDM das suas regiões; sobre a prevenção de incêndios; sobre a falta de meios de combate nesta ou naquela região. O Facebook pode ser também formativo.
Não é na altura das desgraças que se encontram soluções e se critica ao desbarato e de forma irresponsável algo que deve ser abordado, estudado, ao longo do ano, e, principalmente, antes da época de fogos.
O Presidente da República disse tudo o que devia ser dito na altura da tragédia. Que este incêndio teve factos imprevisíveis aos quais ninguém poderia dar resposta, salientando, e muito bem, o papel corajoso de todos quantos combateram as chamas, com especial destaque para os Bombeiros.
O próprio presidente da Associação Nacional de Bombeiros, normalmente crítico quanto às políticas governamentais de apoio às corporações, disse que os meios estavam lá, mas nunca seriam os suficientes para dar resposta aos incêndios com as dimensões registadas em Pedrógão Grande e Figueiró dos Vinhos.
Para mal dos nossos pecados, ainda houve quem se aproveitasse politicamente desta tragédia, focalizando-se nas eleições autárquicas e esquecendo-se dos reais factos de uma tragédia. Há gente para tudo. Há gente que, em boa verdade, nunca devia ter nascido.
A questão dos incêndios tem de ser discutida, é verdade. Discutida e estudada sem que a essa discussão e a esse estudo se sobreponham interesses político-partidários, e que, na altura, os caciques das muitas terras deste nosso país, deixem de ser os putos deste povo a aprenderem a serem homens, e sejam homens de uma vez por todas!
Pode discutir-se, e deve discutir-se, tudo; pior será dar cabo dos criminosos tendo que prever a ação de um maluco em atear fogo a uma floresta. É mais difícil adivinhar atos tresloucados, mas é preciso – até aos malucos – dar resposta cabal à sua ação, porque, caso contrário, outros malucos surgirão a criticar de forma irracional, inoportuna e animalesca as consequências de algo que só a Natureza domina. A Natureza às vezes é cruel, e quando o é, é-o sem dó nem piedade. Viu-se!
E quanto às prevenções, sabemos, infelizmente, como os portugueses a elas reagem. Fazem-se campanhas de prevenção nas praias – atenção aos agueiros – mas por lá continuam a morrer pessoas afogadas por negligência. Avisa-se os incautos a não irem para as serras quando há nevões, mas não falta quem se atreva à aventura e por lá fique, para de lá sair rumo ao cemitério.
Portugal está de luto por muitas razões.
Pior foi daqueles que morreram “injustamente” nesta tragédia. Pior foi daqueles que tudo perderam. Pior é de um Pais que tem como formadores de opinião cabeçudos que se acham inteligentes.
Aos bombeiros, à Proteção Civil, aos representantes do Governo no local da tragédia; aos escuteiros, aos voluntários anónimos, a todos os que, no terreno, deram o corpo ao manifesto contra o monstro das chamas, a minha sincera e justa homenagem. Portugal precisa de gente assim. Obrigado por terem nascido!
José Gonçalves
18jun17