José Lopes
A tragédia de Pedrógão Grande, as mortes, a destruição e área ardina que resultaram dos incêndios iniciados no fatídico dia de 17 de junho. Pelo impressionante cenário de horror e desolação dos sobreviventes, tinha, pela sua própria dimensão, deixado bem para trás todos os balanços de anos anteriores, mesmo aqueles cujos acontecimentos também trágicos, provocaram dor e luto nas últimas décadas.
Mas quando já se assumia o incêndio de Pedrógão Grande, Figueiró dos Vinhos, Castanheira de Pêra e Góis, como, não só o mais trágico em número de mortes (65 vitimas mortais e cerca de 250 feridos), mas também o maior e violento de sempre no país, ao terem sido consumidos em conjunto, perto de 50 mil hectares de floresta, destruição de casas, empresas e áreas agrícolas. Eis que três meses depois, em outubro (domingo dia 8), num verão prolongado, somos surpreendidos, num dia marcado por fenómenos climáticos que não terão sido levados muito a sério, por uma nova e ainda maior tragédia, que manchou de negro várias regiões do interior ao litoral, atingidas por paredes de fogo gigantescas, que galgaram com impressionante velocidade por áreas florestais essencialmente de pinheiro e eucalipto, engolindo aldeias indefesas em vários concelhos e distritos, num autentico inferno que cercou populações abandonadas à sua sorte e que em algumas das frentes, poria à prova qualquer tipo de meios que ousasse resistir à sua fúria devastadora.
Foi um horror, que deixou, de Viseu à Guarda, ou de Aveiro e Coimbra a Leiria, autênticos cenários de guerra, com mais 45 vítimas mortais, centenas de animais mortos e destruição de áreas industriais e explorações agrícolas. Feridas que se procuram agora curar com promessas e milhões de euros, que o Governo ativou ao reconhecer tratar-se de uma “catástrofe natural” que atingiu três dezenas de concelhos. Assim sejam prioridade na gestão dos fundos do Portugal 2020 e do Plano de Desenvolvimento Regional 2020 que, solidariamente terão de ser redefinidos, relativamente a outros projetos e estratégias de investimentos destes apoios comunitários.
Vivemos um tempo de dor, vergonha e indignação, que teve uma acesa disputa política sobre quem são os responsáveis, porque de governação em governação passam sempre ilibados face ao estado desordenado da floresta e de todo o sistema de prevenção e segurança das populações, bem como do abandono do interior do país. Um país que voltou a ficar de luto e se questionará: E quando as lágrimas secarem? Sim, porque apesar de tudo e de toda a sua questionável postura perante dias tão trágicos, o primeiro-ministro António Costa, teve um desabafo que, ainda que inoportuno, não deveria ser mal interpretado face às consequências provocadas pelas alterações climatéricas, ou seja, “situações dramáticas como esta, vão-se repetir”.
Claro que tais fatores não podem nem devem justificar tudo, mas faltou acrescentar: Se não arrepiarmos caminho na relação com a natureza e sobretudo na concretização efetiva de políticas de gestão do território, que tardam também por um coerente consenso politico mais sustentável, independentemente dos diferentes grupos de pressão.
Entre Pedrogão e outubro…
Sobre o drama de Pedrogão, tinha-se feito o luto. As famílias choraram os mortos, as populações sujeitas às burocracias dos apoios, reerguiam-se das cinzas e o país entrava em período de veraneio, com uma época balnear que promete estender-se no tempo.
O bom tempo para o lazer nas zonas balneares no litoral, nas praias fluviais no interior ou para as férias no campo, quase nos faziam esquecer que, afinal os dramas dos incêndios continuavam bem presentes, a queimar hectares de floresta em várias regiões do país de norte a sul e ilhas. Uma realidade a que já nos habituamos. No entanto, lamentavelmente, também nos vamos habituando a cenários inquietantes, como as novas realidades de tais fenómenos, que vinham implicando a sucessiva evacuação de localidades e realojamento de populações a que se assistia pelas notícias, como uma preocupante e acentuada diferença do tipo, dos tradicionais fogos florestais. Imagens que transportavam para cenários de guerra.
Apesar destes campos de batalha contra o fogo que os soldados da paz e restantes entidades envolvidas, como Proteção Civil, iam dando resposta, Portugal em finais de julho continuava a bater recordes pelos piores motivos, com o país a arder. Lembremo-nos dos dramas vividos em Soure, Mação, Vila de Rei, Ribeira de Pena, Miranda do Corvo, Cantanhede, Montemor-o-Velho, Tomar ou Oleiros, entre muitos outros conselhos e freguesias, cujas populações, em geral idosas, entre a tragédia de Pedrogão Grande e outubro, resistiam até ao limite das suas forças ao inimigo que na generalidade dos casos eram vizinho, através de manchas florestais sem perímetros de segurança.
O tempo era na verdade de corrida para o litoral, para as praias, para os concertos e diversificados eventos culturais ou de entretinimento ao longo de todas as zonas balneares, promovidos pelos respetivos autarcas locais num ano em que as eleições autárquicas obrigaram a reforçar orçamentos.
E como festa que é festa tem que ter fogo-de-artifício, nem a lei travava o ambiente de luz e cor a rebentar nos céus. Assim as animações de praia ou das festas nas aldeias, confundiam-se com as campanhas eleitorais ao ponto de em muitos casos, se desvalorizar as responsabilidades das autarquias na defesa das populações, nomeadamente na garantia de perímetros de segurança, cuja desvalorização deixou aldeias isoladas e à mercê do tipo de fogos, que os próprios populares que viveram momentos dramáticos, testemunham nunca terem visto tal. Ainda assim, os autarcas foram eleitos e reeleitos e ninguém lhes pediu responsabilidades por tanta incúria, tão básica da sua competência na defesa das populações, que em alguns casos poderiam salvar vidas humanas.
E o protagonismo do eucalipto?
Publicadas as conclusões do Relatório da Comissão Independente, ainda que tenham merecido um amplo consenso, ficou a dúvida sobre um capítulo não tornado publico em que será abordado, o excesso de plantações contínuas de eucaliptos e pinheiros bravos. Trata-se de um mau sinal para a chamada “reforma florestal”, assim sujeita aos interesses de grupos de pressão (celuloses), que tudo farão para contrariar e descaraterizar a lei que se propõe limitar a plantação de eucaliptos, aprovada pelo Parlamento para entrar em vigor em março do próximo ano. Um prazo longo, que deixará de novo as populações à mercê da proliferação desta espécie com capacidade de arder rapidamente, dadas as cascas e folhas altamente inflamável.
Assim como se definem as árvores autóctones como “árvores bombeiras” (carvalhos ou castanheiros), com particular e destacado protagonismo, o eucalipto não escapa à designação de “árvores incendiárias”, segundo alguns biólogos. Porquê então insistir e facilitar a invasão premeditada de eucaliptal, que vêm dominando a paisagem, ocupando terras abandonadas e aproximando-se perigosamente das aldeias e populações, que assim passaram a viver com medo das gigantescas paredes de fogo violento e de altas temperaturas que sobrevoa quilómetros, em condições atmosféricas como as que deixaram o país de luto.
Os promotores da liberalização do eucalipto, negam-se a reconhecer o ciclo vicioso que se transforma num pasto de chamas e que se vem repetindo de ano para ano. Resta pois, em nome, pelo menos dos mortos das tragédias que marcaram uma época de fogos que o Governo também desvalorizou, que haja coragem política para travar uma espécie que ironicamente é o verde que mais rápido floresce de forma indiscriminada após as tragédias dos incêndios.
Fotos: pesquisa Google
01dez17