Maximina Girão Ribeiro
No dia 9 de Abril de 1918 teve lugar a fatídica batalha que se desenrolou no vale da ribeira de La Lys, sector de Ypres, na região da Flandres (Bélgica), durante a Primeira Guerra Mundial, ou seja, a denominada Grande Guerra que decorreu entre 1914 a 1918, entre a Alemanha e o Império Austro-Húngaro, contra a coligação de países de que faziam parte, entre outros, a Inglaterra, a França e Portugal.
Comemora-se este ano o primeiro centenário deste acontecimento e recordamos aqui a participação do Corpo Expedicionário Português (CEP), neste conflito.
Vários motivos justificaram a entrada de Portugal na Primeira Guerra Mundial, nomeadamente a existência de colónias portuguesas, em África, muito cobiçadas pelos alemães por fazerem fronteira com territórios por eles ocupados.
Para além deste facto, também a nossa jovem República pretendia afirmar-se internacionalmente e, embora de início, Portugal não se tivesse envolvido directamente no conflito, após o apelo de Inglaterra para que Portugal abandonasse a sua posição de neutralidade e se posicionasse ao lado deste país com quem mantinha a mais velha aliança do mundo e dos países seus aliados,
Portugal enfrentou a necessidade de participar na guerra. Primeiro enviou tropas para Angola e Moçambique, a fim de defender estas suas colónias contra a presença ameaçadora da Alemanha, que atacava já no Sul de Angola e no Norte de Moçambique. Depois, só a partir de Janeiro de 1917 é que Portugal começou a enviar tropas, o recém-formado Corpo Expedicionário Português, para vários locais europeus, nomeadamente a Flandres (Bélgica) e a França.
Este Corpo Expedicionário Português era formado, maioritariamente, por homens recrutados em meios rurais, “preparados” de forma muito rápida, durante nove meses, nos quartéis de Tancos, “fenómeno” que ficou conhecido como o “milagre de Tancos”.
Na Flandres, os soldados portugueses foram colocados num terreno pantanoso onde se abriram as chamadas trincheiras, buracos ou valas, onde os militares se entrincheiravam à espera dos ataques das forças inimigas. Era uma guerra parada, para a qual não estavam minimamente preparados. Aliás, os défices da instrução recebida em Tancos foram notórios desde a instalação das tropas, “enterradas” nas trincheiras, onde a espera pelo ataque do poderosíssimo exército alemão criava, entre os nossos, uma progressiva ansiedade, um desgaste físico e, sobretudo, um mal-estar psicológico.
A par disto, as queixas eram muitas: a fome ou a comida diferente à qual não estavam habituados, o frio e a chuva (os rigores dos Invernos com temperaturas negativas), as doenças (sobretudo as pneumonias), a lama onde estavam mergulhados, os piolhos e as ratazanas, os gases químicos lançados pelos alemães, a transformação profunda das suas vidas fora do contexto familiar, a ausência de Portugal, a saudade…
Assim, estes homens sem escolarização, quase todos analfabetos, sentiam-se abandonados à sua sorte, quase explorados e esquecidos pelo seu próprio país, tão desmoralizados, que se registaram deserções, insubordinações e até suicídios.
A longa espera e a sobrevivência foram aspectos profundamente traumatizantes para as tropas portuguesas: dois anos, quase permanentemente, em trincheiras!
Foi na madrugada de 9 de Abril de 1918 que oito divisões alemãs (cerca de 100 mil homens e mais de mil peças de artilharia) avançaram sobre os 11 quilómetros, onde estavam estabelecidas as forças portuguesas (duas divisões e cerca de 20 mil homens). Na tentativa de abrir caminho para a França, os alemães avançaram no terreno e trucidaram as tropas portuguesas que foram praticamente aniquiladas pela desproporção numérica entre as duas forças militares e pela desigualdade de armamentos (qualidade e quantidade) – a esmagadora superioridade alemã, sobretudo a ofensiva da sua artilharia, abateu o CEP, embora seja de salientar a corajosa resistência portuguesa para atrasar o movimento alemão e dar possibilidade às forças aliadas para se organizarem.
A batalha de La Lys ficou marcada pela perda de milhares de homens entre mortos, feridos, desaparecidos e prisioneiros – uma derrota, segundo alguns autores, comparável ao desastre militar de Alcácer Quibir!
Este acontecimento deixou marcas profundas na sociedade da época e, até ao presente, ficou a memória destes combatentes e heróis a quem devemos continuar a honrar.
Obs: Por vontade da autora e, de acordo com o ponto 5 do Estatuto Editorial do “Etc eTal jornal”, o texto inserto nesta rubrica foi escrito de acordo com a antiga ortografia portuguesa.
Fotos: pesquisa Google
01abr18