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A Fénix de Jancido

Lurdes Pereira

(texto e fotos)

 

Gondomar, mais concretamente a freguesia de Foz do Sousa, fica muito próximo da grande cidade do Porto. Pode até parecer-se com uma cidade, mas longe de imaginar que nos recantos esquecidos há lugares onde a memória, a magia e o renascer das cinzas acontecem. Do antagonismo da violência de uma cascata, até à serenidade das águas do Sousa, renasce o sonho de Jancido.

No pretérito, o país era profundamente rural. As maiores povoações, principalmente aquelas que geograficamente se implantavam junto ao mar ou rios mais afluentes, tinham o “lodo” para desenvolver enquanto as mais inóspitas ficavam esquecidas, sofrendo a miserabilidade, o abandono e o consequente enrugar do tempo. Terrenos que outrora foram o magro sustento da família aos poucos iam conhecendo a profunda tristeza de se sentir assaltado pela imensidão da erva daninha, sem que mais nenhum fruto alguém lhe viesse colher.

Assolado pela diáspora, o lugar foi, aos poucos, aprendendo a conviver com a solidão. Ao Deus dará a lei do mais forte deixou a possibilidade de, no meio sem cuidado, o equilíbrio das espécies sobrevivessem.

Os moinhos de Jancido que haviam sido as grandes indústrias de transformação do milho e outros cereais, estavam destinados ao esquecimento, envoltos na imensidão do descuido que os adormeceu no silêncio da mata. Junto à foz do Sousa, a terra era boa para o cultivo, mas aos poucos ficaram à mercê do rio. E os moinhos emudeceram feridos pelo tempo de abandono.

Ano após ano, o silêncio incomodava a razão humana até que um dia, um grupo de amigos decidiram ali passar o tempo na reabilitação da floresta e da cascata reconstruindo sonhos colorindo lugar e a indústria da infância.

Agora, os terrenos já não são sachados nem cultivados, ou antes, são cuidados com objetivo de oferecer prazer a todos os que aqui vêm conhecer o espaço, os moinhos numa verticalidade vertiginosa acompanhando o agradável caudal da cascata que depois de oferecer a pujante força aos moinhos vem envolver-se no caudal do Sousa.

Alguns estão restaurados, mas há muito trabalho a fazer. Limpezas de excessos e sobrantes, organização do espaço, controlo das espécies autóctones, preservação da fauna, montagem de passadiços terrestres. As espécies de árvores existentes saciam a curiosidade através da identificação das mesmas. Também se identificam algumas plantas e arbustos nativos e a fauna engorda a pluralidade de espécies entre anfíbios, insetos, répteis e mamíferos.

Tudo num só santuário para tornar este lugar aprazível tanto para os adultos que debaixo do silêncio, gostam de fazer uma caminhada segura, como para os mais jovens que preferem dar uns mergulhos nas baixas águas do Sousa.

Jancido surge como uma Fénix no vai e vem dos curiosos, na musicalidade e força das águas em queda livre, na orquestra da linguagem de todas as espécies, no bailado do patos selvagens, no perfume de plantas e flores, enquanto a corda de Tarzan partilha as acrobacias em troca do sorriso e da felicidade no olhar de cada criança.

 

01out20

 

 

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8 Comments

  1. Nuno Mota de Castro

    Conheço o terreno, as pessoas e a história. Apesar da afluência exagerada que aconteceu no passado verão, o trabalho realizado por estes “carolas” é de louvar.
    Todo este património estava esquecido no meia de mato e silvas. Eu passava por lá sem me aperceber da riqueza escondida. Agora sempre que alguns amigos amantes da natureza passam pela zona, levo-os lá e ficam deliciados. Isso diz tudo. Parabéns pelo trabalho realizado.

  2. Ana Silva

    Eu sou da Foz Do Sousa, adoro o que fizeram com o espaço, adoro a força de vontade dos homens que ali andam, faça chuva ou sol, no entanto enquanto moradora do local e frequentadora assídua, neste momento devido á quantidade exagerada de pessoas que vão para ali, não vou com tanta frequência como gostaria! No verão são grupos de 10 pessoas ou mais! O que o local tinha de melhor, a sua privacidade, o silêncio, nestes meses perdeu-se devido ás excursões. Esperemos que para o próximo ano no verão no local deixe de estar na moda e passe a receber menos pessoas.

  3. Adalberto Torres

    Ao ler lembrei-me: Felizes estes músicos! Realizam uma arte que nao quer dizer nada, mas que enche a gente.
    Miguel Torga.
    Parabéns a todos.

  4. Ferreira da Costa

    Parabéns e o meu bem-haja a todos quantos algo fazem pela Mãe Natureza, tão mal tratada pelo Homem. Um abraço.

  5. Anónimo

    Olá António Gonçalves
    Não posso deixar de vos parabenizar pela vossa insistência para fazer o sonho renascer. Ainda bem que gostou, a crónica surgiu graças a si e outros que, como o António não deixam sonhos morrer.
    Grande abraço para todo o seu grupo e um bem haja, Lurdes Pereira

  6. Anónimo

    Olá Manuel Sousa, obrigada por estar aqui. Há muitas maravilhas naturais, só temos de as saber encontar e entender.
    Obrigada, Lurdes Pereira

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