Carmen Navarro
Ao longo dos séculos a Mulher foi sempre suporte da sociedade, sempre lutou lado a lado com os homens que o paternalismo e o machismo sempre tudo fizeram para a encobrir e amesquinhar o seu valor e o quanto dela necessitavam, o medo aliado à sua força física, impediram sempre a mulher de ser livre para viver a sua própria vida.
A sociedade criou o lema que: – “Mais importante do que a Mulher ser livre é ser honesta” outra – Sim, meninas, que me estais a escutar, só há para vós uma emancipação digna e legítima: o casamento. Fora disso só existem atitudes equívocas e pouco dignificantes» grandes tiradas estas para banir a Mulher da história.
Muitas foram as mulheres que ao longo dos séculos lutaram para libertar a Mulher do jugo masculino; foram violentadas, denegridas, queimadas vivas e sempre com o ferrete da servidão e da obediência. Ser dócil e obediente era, e para muitos ainda é, ser como mandava a cartilha.
Não vamos, nem essa é a nossa intenção de fazer uma lista de todas as mulheres inspiradoras da luta, e foram muitas, para serem consideradas seres humanos iguais aos homens com as devidas diferenças de que fazem um homem e uma mulher.
As mulheres portuguesas mudaram o País e a História de Portugal e derrubaram fronteiras e acabaram sempre por ser ignoradas…
Enquanto haja tempo…
Hoje a mulher não levantou…
Não teve café
nem roupa lavada
nem almoço
Filhos choraram a falta
do carinho
da doçura
do amor
Hoje a mulher adormeceu
para sempre
É que ontem ela decidiu
enfrentar seu algoz e
ergueu a voz!
Mas era tarde demais.
Helena da Rosa
No início do século XX, as mulheres não tinham direitos cívicos nem políticos, mais de 80% eram analfabetas. Dependiam da vontade do homem para tudo… Começava logo pela obediência à vontade de pai, não podiam estudar, nem casar sem a autorização do pai, a mãe limitava-se a observar e calar… as mulheres eram educadas para casar e serem as fadas do lar, se tentavam escrever, não podiam publicar sem autorização do marido, nem podiam usufruir de privacidade, o dote que lhes era atribuído pelo pai no casamento era arrecadado pelo marido e elas continuavam na dependência económica.
Afonso Costa, em 1910, acabou com esse ultraje e libertou as mulheres que escreviam a publicar sem ter que recorrer a pseudónimos, mesmo assim pouco passava apenas de ser lei. No entanto Angelina Vidal conseguiu libertar-se e ser autora e jornalista e diretora de um Jornal Republicano “Emancipação” e colaboradora em muitos outros tornando-se conhecida no país devido as suas ideias revolucionarias para a época.
Estamos em 1880, nesse tempo era a única mulher republicana que defendia ideias políticas e retratava no seu jornal o atraso das mulheres portuguesas, quando o recente formado Clube Republicano Rodrigues de Freitas, no Porto, teve a iniciativa de fazer um Sarau no Teatro Baquet para angariar dinheiro para obterem verba para fazer uma escola de divulgação das ideias republicanas, para atrair mais pessoas convidaram Angelina Vidal que apareceu vestida, não se sabem porquê, de verde e vermelho.
Ela tinha uma figura máscula e audaciosa, entrou no palco, de cabelo cortado um pouco desgrenhado com fitas vermelhas e verdes, o que causou logo grande espanto, foi logo apupada por graçolas inconvenientes, apesar de estar entre um público defensor de ideias novas. Ela como mulher culta de talento e revolucionária que era prosseguiu, o que fez com que o publico silenciosamente a ouvisse sem que alguns se manifestassem no fim de forma tumultuosa. Para acabar com aquilo que não a impressionou, Angelina Vidal lembrou-se de cantar a Marselhesa (muito mal) acompanhada ao piano por outra senhora presente. No fim foi presenteada com flores e palmas. E assim a primeira mulher republicana se manifestou no Porto. Quando saiu teve que ser escoltada pela polícia até ao Hotel.
Se havia progressistas que convidavam Angelina Vidal para fazer conferências outros ainda dizia que o papel das mulheres era em casa a pontear as meias. Angelina Vidal continuou a lutar pelos Direitos da Mulher e da Republica e pelas melhores condições de vida dos trabalhadores.
Só 26 anos depois de Angelina Vidal, outra mulher corajosa falou em público para defender os direitos das mulheres e a igualdade de género.
No entanto mesmo nessa época já havia homens que se batiam pelos direitos das mulheres eram depreciativamente chamados de: – “homens feministas”, como José Joaquim Lopes Praça, que em 1872 publicou “A Mulher e a Vida” e outros… Hoje são muitos os homens que também lutam pela igualdade de género.
O Feminismo em Portugal e a sua luta pela igualdade de género tem uma longa e ativa história de reivindicação, em que se destacaram as sufragistas portuguesas Ana de Castro Osório (1872-1935), Adelaide Cabete (1867-1935), Carolina Beatriz Ângelo (1877-1911) e Maria Veleda (1871-1955), entre muitas outras.
Ana de Castro Osório disse:
“Eu (…) quero a Republica como libertação e felicidade para as Mulheres, visto que a humanidade é composta dum só grupo de animais, indiferentemente masculinos e femininos…”
Sem destacar Carolina Beatriz Ângelo, uma das primeiras vozes do Feminismo em Portugal e uma mulher que tanto lutou pela emancipação das portuguesas.
Carolina Beatriz Ângelo fundou a “Liga Republicana das Mulheres Portuguesas”, inserida num grupo de outras mulheres. Envolveu-se na fundação da “Associação de Propaganda Feminista” da qual foi dirigente nesta luta pela emancipação da mulher projetou a Escola de Enfermeiras.
A primeira mulher a votar em Portugal foi Carolina Beatriz Ângelo, de 33 anos, médica, servindo-se de uma lacuna na Lei que dizia: “todos os cidadãos maiores de 21 anos, chefes de família, que soubessem ler e escrever” podiam politicamente ter um papel ativo na política do país e podiam votar.
Esta mulher era viúva e tinha a seu cargo uma filha, portanto era chefe de família e tinha formação superior. Levou o caso a Tribunal invocando o direito de ser considerada “chefe de família” e assim poder votar nas eleições constituintes. Após as eleições foi acrescentado à Lei “apenas chefes de família do sexo masculino”
Como médica ela previra o seu fim próximo faleceu de uma lesão cardíaca a 3 de outubro, 5 meses depois do seu feito histórico de certa forma este acontecimento significou a morte dos sonhos…
Libertação
insisto em ser
o que apavora
o que me cobram
não posso dar
se não cabe no que
é ser mulher.
que não me basta
ser apêndice
sou liberdade de corpo
inteiro
de corpo livre.
não quero menos
só quero pleno
só quero ser igual.
Lia Sena
Natália Correia, feminista de grande audácia, escritora, poetisa, lutadora contra o fascismo, foi vítima desta luta mas a sua escrita, a sua voz nunca se calou, foi sempre uma lutadora contra a Ditadura.
Atualmente muitas são as mulheres e homens que à sua maneira continuam a lutar pela dignificação da Mulher.
Luta
Por reformas sociais
todas sempre vão a luta.
Por justiça e por verdade
Por creches e liberdade.
A violência doméstica
maltrata e deixa marcas.
Discriminação de género
todos devem denunciar
Consciência coletiva
por melhores condições.
Não vamos calar a voz
à herança machista patriarcal.
Precisamos
de políticas melhores,
preventivas e educativas
para proteger a mulher.
O poema é um bom lugar
Para começar as mudanças
e empoderar a mulher.
Gladis Deble
Muitas dezenas de anos se passaram e as mulheres continuam à procura desta igualdade e libertação…
Muitos preconceitos já foram vencidos, mas o machismo e as ideias de patriarcado ainda estão presentes na sociedade que nos tenta calar e muitas vezes até o consegue… Mesmo feridas por dentro, e muitas até com sete palmos de terra em cima, continuaremos a lutar para ajudar a construir uma sociedade mais humana em que todos se respeitem!…
Fotos: pesquisa Web
01dez21