Luísa Camarinho
Querido mundo,
Espero que esteja tudo bem contigo.
Escrevo-te esta carta, pois temos algumas contas para ajustar. Quero insultar-te, dizer que és um velhaco, um patife que passa a vida a trocar-nos as voltas. Pobres de nós. Só queremos fingir ser uma coisa que não somos, só queremos representar um papel que não nos pertence, só queremos apregoar que devemos ser autênticos, mas no escuro da noite vendemos a alma ao diabo para que ele nos conceda só mais um bocadinho de uma vida que não é a nossa. No fundo, queremos que nos deixes fingir e hastear a bandeira dos bons, dos virtuosos, dos fortes, daqueles a quem, o céu, se existir, pertencerá.
Não me interpretes mal, acho legítimo que nos queiras tornar melhores pessoas, contudo, já tens idade para saber que o que importa no nosso tempo, não é o que somos, mas sim o que parecemos. O que importa não é ser boa pessoa nem sequer ser feliz, o que importa é parecer ser tudo isto e mais umas quantas coisas.
Nas palavras de Charles Bukowski “Não era o meu dia. Não era a minha semana. Não era o meu mês. Não era o meu ano. Não era a porra da minha vida”. Não vivemos a porra da nossa vida, vivemos a porra da vida que criamos para que aos olhos da sociedade tenhamos a porra da vida perfeita. Desde o momento em que abrimos os olhos até ao momento em que os fechamos para sempre, representamos papéis e colocamos máscaras para esconder aquilo que realmente somos.
Para terminar esta carta quero apenas dizer-te que a autenticidade, uma das mais belas virtudes do ser humano, é agora uma espécie de tesouro apenas acessível àqueles que ousam desafiar as regras da sociedade e viver segundo as suas próprias regras. Assim sendo, sugiro que esqueçamos os preconceitos e comecemos realmente a viver, porque quem quase foi feliz não foi feliz realmente e quem quase viveu, não chegou a viver.
Votos de muita sorte e paciência da sempre tua,
Luísa
01jan22