Após longos anos de abandono, os vários cais localizados nas margens da Ria no território ribeirinho do concelho de Ovar começam a ganhar nova imagem através de obras de requalificação no âmbito do programa de intervenção da Polis Litoral – Ria de Aveiro. Mas os projetos da Polis que vão ganhando forma, não deixam de inquietar os cidadãos e munícipes mais ligados às atividades proporcionadas pela Ria, sejam económicas, culturais, ambientais ou desportivas, quando começa a ser percetível que uma outra obra fundamental como é o desassoreamento da Ria e dos diferentes canais que ligam a Laguna aos Cais em recuperação, até para dar coerência às obras em curso, deveria ser também feito para tornar estes braços da Ria navegáveis e assim serem realmente rentabilizados nas várias vertentes os investimentos que estão a ser assumidos em cada uma das obras adjudicadas pelo Conselho de Administração da Polis Litoral que começou a lançar concursos públicos de empreitadas em finais de 2012.

Com fundos Comunitários do Programa Operacional da Valorização do Território (POVT) e do Programa Operacional da Região Centro (PORCentro), os concursos públicos lançados pela Polis da Ria de Aveiro, após a sua viabilização entre os Municípios e o Governo (Ministério da Agricultura, Mar, Ambiente e Ordenamento do Território, MAMAOT), incluíram dez empreitadas num valor total de 10.423.000,00 euros. Desta primeira fase de intervenções que tiveram início no segundo semestre de 2013, constavam o Reordenamento e Qualificação da Frente Lagunar de Ovar, como as obras em curso no Cais da Ribeira e a sua ligação através de uma pista até à Foz do Rio Cáster. Este investimento que atinge os 800 mil euros inclui ainda o Areínho, a Azurreira e o Cais do Carregal. Os sucessivos projetos apresentados pela Sociedade Polis da Ria de Aveiro à Câmara Municipal de Ovar têm merecido, quer do executivo anterior, quer do atual liderado por Salvador Malheiro, a sua aprovação por unanimidade.

O mais recente foi o projeto de execução para o Cais da Pedra orçado em 442 mil euros, integrado num Plano Regional de Reordenamento e Valorização de sete núcleos piscatórios lagunares nos concelhos de Aveiro, Estarreja, Ílhavo e Ovar que contempla ainda o Cais do Puchadouro (Válega). Estes investimentos no “Reordenamento e Valorização da Atividade Piscatória – Núcleos Piscatórios Lagunares” decorrem da candidatura ao PROMAR e incluem também os cais da Ribeira da Aldeia (Estarreja), da Cova do Chegado, da Bestida e do Bico entre outros na Murtosa e Ílhavo.
Trata-se de um conjunto de obras que visam criar condições de atividades económicas de cariz tradicional ligadas ao sector das pescas. Uma operação que, nomeadamente na Torreira, obrigatoriamente, implicará o urgente desassoreamento no porto de abrigo daquela freguesia piscatória da Murtosa. Para tais trabalhos estão orçados 1,2 milhões de euros que incluem o desassoreamento dos canais de acesso aos cais.

Nestes projetos em curso, prevê-se ainda a requalificação dos equipamentos e estruturas de apoio e o reordenamento e valorização das áreas envolventes aos cais para usufruto público, a exemplo do que está a ser construído no Cais do Carregal.Populações sensibilizam autarcas para pontos críticos nas obras
Se, em Válega, no Cais do Puchadouro, os responsáveis da Cenário, associação ligada ao restauro e valorização de embarcações tradicionais de vela na Ria, como relíquias do património náutico, não compreendem tanto o atraso nas obras neste cais, nem muito menos a sua desvalorização no projeto da Pólis, bem como os critérios de prioridades, já que este cais vai muito além do que o Polis lhe destina, ao integrá-lo no lote de projetos dos “Núcleos Piscatórios Lagunares”.
Preocupação igualmente acompanhada por quem dá, verdadeiramente, vida na componente dos desportos náuticos ao cais do Puchadouro como são os dirigentes e atletas do CCO (Clube de Canoagem de Ovar) que não vêm perspetivas de vir a beneficiar das condições que a modalidade há muito merece e exige, como escola de formação e preparação de remadores que têm neste canal a pista de ligação à Ria para treinarem sempre que as marés o permitem. Condições que dignifiquem a prática da canoagem exigidas também em terra, para corresponderem á realidade que representa hoje o CCO e a sua presença em várias provas nacionais e internacionais, incluindo vários atletas presentes nas seleções nacionais.

Já na Ribeira de Ovar, os moradores não perderam tempo em alertar os autarcas para alguns pontos críticos que foram manifestando com o desenrolar da obra, nomeadamente na construção de um caminho entre o Cais da Ribeira e a Foz do Rio Cáster, nomeadamente a ausência de sistemas de drenagem que garantam o escoamento das águas nas terras ao longo das margens do Rio Cáster e a Ria.
Trata-se de sistemas de drenagem já muito antigos e fundamentais nestas terras da frente lagunar, que, estranhamente, os projetos de intervenção da Polis teimavam em não ter em linha de conta, não só o melhoramento dos existentes, mas ainda o seu reforço, para melhor garantir a estabilidade do próprio acesso que está a ser construído entre o Cais da Ribeira e a Foz do Rio Cáster.
Mas os moradores da Ribeira de Ovar mais familiarizados ao longo dos anos na relação com o Rio e toda a rede de canais, regueiras e travessias para as terras através do leito do Rio Cáster não se ficaram por estas questões e avançaram ainda outras reivindicações, como a, há muito reivindicada limpeza do Rio e o seu desassoreamento até à popularmente designada “Boca do Rio”, assim como o indispensável desassoreamento do Cais da Ribeira e respetivo canal para que seja navegável independentemente das marés. Um exemplar exercício de cidadania, que no caso das obras da Polis em curso, permitiram merecer o reconhecimento dos autarcas chamados ao local, da Câmara e União de Juntas, para a necessidade de junto da entidade responsável pela obra, se proceder a algumas adaptações ao projeto, nomeadamente no que toca aos sistemas de drenagem ao longo do caminho em construção.

Consensual parece ser a ideia de que, simultaneamente às obras em curso de Reordenamento e Qualificação da Frente Lagunar de Ovar que estão a valorizar espaços públicos nas margens do canal da Ria de Ovar incluindo a sua vertente turística e património ambiental. Tal só se justifica e completa se as obras não se resumirem às intervenções superficiais, deixando a Ria, canais e os cais assoreados e sem vida. Desta forma, o embelezamento em curso será apenas para adiar um destino inevitável de abandono caso os cais continuem atolados em lama.
Cenário que a repetir-se só pode ser o resultado de projetos planeados em gabinetes sem terem em linha de conta a realidade destes espaços naturais, que exigem, mais do que obras superficiais, medidas bem mais concretas e objetivas como é o desassoreamento que vem sendo a causa principal do abandono de toda a riqueza que representa toda a área lagunar neste caso, ao longo do canal da Ria de Ovar.
PROGRAMA POLIS PARA A PROTEÇÃO DO LITORAL
(QUASE?!) ESQUECIDO COM A FÚRIA DO MAR

Em 2009, o então primeiro-ministro José Sócrates deslocou-se a Ovar para apresentar o Polis Ria de Aveiro destinado a uma linha de costa de 60 km e envolvendo onze municípios. Um programa que tinha como prazo de execução de cinco anos, orçado em 97 milhões de euros, contemplando obras como a elaboração do Plano de Pormenor Esmoriz/Cortegaça considerada na altura zona de maior risco nas preocupações de erosão que assolavam a costa ovarense. Eram ainda valorizadas as restantes componentes do programa na área lagunar. Na altura os municípios envolvidos na gestão do Polis Ria de Aveiro consideraram como projetos mais importantes a avançarem, o desassoreamento e balizamento dos canais da ria, mas também o reforço do cordão dunar.
A proteção do litoral português era assim assumida pelo Governo através de protocolos com as sociedades Pólis e a APA-Agência Portuguesa do Ambiente até 2015 para o que seriam disponíveis 106 milhões de euros, dos quais 79 milhões do fundo de coesão.
Destes milhões, para as praias do concelho de Ovar estava destinada uma fatia de 6,2 milhões de euros, para a proteção e estabilização das dunas na praia de Cortegaça e a reabilitação de troços das defesas aderentes de Esmoriz, Cortegaça e Furadouro. Foi mesmo considerado o maior pacote de investimentos na proteção e valorização da orla costeira com financiamentos comunitários.
Na altura houve mesmo um governante que afirmou que as obras podiam ser concretizadas a tempo para em 2015 estarem concluídas e haver um “avanço imenso na proteção do litoral”.
É verdade que ainda estamos em 2014 e por isso o prazo de 2015 ainda não chegou ao fim para concretização do programa Pólis de proteção do litoral. Mas já ninguém fala sequer no Polis para o litoral tal é o descrédito das diferentes estratégias que foram literalmente destruídas e afrontadas pelas violentas investidas do mar que neste dois primeiros meses de 2014 ainda não deram tréguas neste caso em Ovar e em vários outros pontos da costa portuguesa com igual inquietação, face à destruição em zonas urbanas e fundamentalmente das investidas em áreas mais fragilizadas, engolindo dunas e alterando significativamente paisagens ambientais.
Curiosamente os autarcas já não falam do cumprimento do programa Polis para o litoral tal é o cenário dantesco deixado pela fúria do mar que descaraterizou completamente os pressupostos de intervenção deste programa Polis anunciado em 2009.
O que os autarcas reclamam já em desespero de causa, como o fez no dia 15 de Fevereiro após mais uma dura investida do mar, o presidente da Câmara Municipal de Ovar, Salvador Malheiro, é que o Governo cumpra a promessa que fez a quando dos primeiros embates destruidores que se fizeram sentir no Furadouro, que, segundo o ministro do Ambiente, Ordenamento do Território e Energia, Jorge Moreira da Silva, seriam disponibilizados de imediato três milhões de euros dos 300 milhões que o ministério disse ter para toda a costa portuguesa, que aliás também reclama urgência face aos recentes acontecimentos de galgamentos muitas vezes inesperados ou pouco habituais para as populações ribeirinhas confrontadas com tanta facilidade com que as ondas do mar sobem as defesas aderentes que os autarcas querem reforçar, mesmo sem garantias de seus efeitos práticos para evitarem maiores situações de risco.
Texto e fotos: José Lopes
(Correspondente “Etc e Tal Jornal”, em Ovar)
01mar14




Quando se admitia que o pior já tinha acontecido a quando da “onda” gigante no Furadouro a fúria do mar voltou, não para a folia, mas para destruir ainda com maior força e intensidade os passeios ao longo da marginal ao sul que ainda em plena época balnear tinham sido reparados para acolher os veraneantes no Furadouro.
Desta vez a destruição foi mais visível e inquietante, ao ponto de forçar a Câmara a assumir em mãos medidas SOS para tentar travar o mar. A resposta, perante esta pressão do mar resulta naturalmente em mais pedra sobre pedra que consequentemente se virá a enterrar na areia. Cenário que inevitavelmente atrasará o processo de se repensar novas soluções para além da pedra. A ver vamos…