Menu Fechar

Os Sindicatos da Restauração e Hotelaria sobre os patrões e a Covid: “Oito anos seguidos de lucros, e ao fim de quinze dias de encerramento, por causa da pandemia, já não havia dinheiro para pagar salários?! Isto é um escândalo! Mas, há mais…”

A Covid-19 criou, aquando do seu pico, entre março e maio do presente ano, uma acentuada crise no setor da restauração, facto, também extensível ao Turismo em Portugal. O problema acabou por afetar um leque considerável de trabalhadores, indicando a Federação dos Sindicatos de Agricultura, Alimentação, Bebidas, Hotelaria e Turismo de Portugal – FESAHT, afeta à CGTP-IN, para, atualmente, se registarem mais de 75 mil desempregados no setor.

No Porto, o encerramento de estabelecimentos emblemáticos como a Cervejaria Galiza e a Casa Aleixo alertaram, por assim dizer, a população para um problema que extravasa em muito estes dois casos, e que tem vindo a preocupar sobremaneira o Sindicato dos Trabalhadores da Indústria da Hotelaria, Turismo, Restauração e Similares do Norte (STIHTRS), como nos deu a conhecer o seu presidente da Assembleia Geral e também dirigente da FESAHT, Francisco Figueiredo, ladeado pelo presidente da Direção, Nuno Coelho.

 

José Gonçalves                  Francisco Teixeira

(texto)                                        (fotos)

 

Sem papas na língua, os sindicalistas levantam questões pertinentes quanto à defesa dos trabalhadores da restauração e da hotelaria e vão mais longe, ao apontarem o dedo à entidade patronal que, em seu entender, tem lucrado com a crise, ou seja, tem “enchido os bolsos à custa da Covid”.

O diálogo com o Governo e com os patrões não tem sido fácil, tanto mais que uma reunião agendada para o passado dia 26 de agosto, com a ministrado Trabalho, acabou por ser “cancelada” por ausência da governante.

Mas, outros são também os pertinentes problemas que se abordam nesta entrevista, na qual Francisco Figueiredo, releva a inoperância da Inspeção do Trabalho, facto, entre outros, que leva a FESAHT a reclamar, a reabertura dos estabelecimentos que se encontram (“estrategicamente”) encerrados, a reposição e aumento de salários dos trabalhadores, e um conjunto de outras soluções que poderão ser profiláticas para os trabalhadores quanto ao surgimento de uma segunda ou terceira vaga de pandemia…

Francisco Figueiredo

Quais as consequências de uma crise não anunciada (relacionada com a Covid) e uma outra que já era conhecida (crise em algumas empresas) e que, se diz, foi aproveitada com a pandemia?

NC – “Ninguém estava a prever isto, foi algo que aconteceu de repente…  a pandemia não estava anunciada. Quanto a dificuldades? Não há empresas em dificuldades pelo que temos visto nos últimos anos. O Turismo, até há pouco, estava a crescer exponencialmente. Em 2019, houve um acréscimo, em relação a 2018, no Turismo, e principalmente em termos de ocupação. Ninguém estava a prever isto. Não sei se houve um engano das empresas, mas o primeiro trimestre do ano até foi positivo. Por isso não se saber onde se encontram as dificuldades”.

Nuno Coelho

Mas, por exemplo, a “Casa Aleixo” já estava com salários em atraso…

NC – “Mas, isso em nada está relacionado com a pandemia, isso tem a ver com má gestão.  Os patrões apoderam-se, muitas vezes, das receitas das suas empresas para proveito próprio. Isso tem a ver com a gestão e não com a questão do mercado”.

Diretamente relacionado com a pandemia, estamos a falar em quantos desempregados?

NC – “Aqui no Porto, não lhe posso dar um número exato. Mas houve muitas empresas que, no início de março, começaram a mandar embora trabalhadores que estavam em período experimental. Depois, foram os trabalhadores que ainda estavam a contrato, e que as empresas fizeram caducar  para não os ter de renovar. Isso ainda está a acontecer. Aqueles trabalhadores que estão a contrato, as empresas estão a despedi-los. Mas, em termos de números exatos ou perto disso, de momento, não sei ainda…”

FF – “Neste momento, ainda há cerca de 25 mil empresas, a nível nacional, com mais de 75 mil trabalhadores que estão sem emprego e sem salário. Refiro-me a trabalhadores que ainda não têm a sua situação definida. Os estabelecimentos estão encerrados, etc. e há um conjunto de problemas muito graves no setor. Que não é um problema somente da região Norte, mas a nível nacional e em todo o setor da atividade”.

OS GRANDES GRUPOS ECONÓMICOS ESTÃO A APROVEITAR-SE DESTA CRISE SANITÁRIA PARA AUMENTAREM OS SEUS LUCROS

Nesta altura, com alguma acalmia em relação à propagação da pandemia, houve alguma retoma no setor?

FF – “A FESAHT está a exigir é a reabertura de todas as empresas! Os grandes grupos económicos – veja-se, por exemplo, o caso da «Brasileira», aqui no Porto, do Grupo Pestana, que está encerrado; o grupo Vila Galé, com o hotel de Lamego encerrado -, estão todos a aproveitar-se desta crise sanitária para aumentarem os seus lucros, e estão a pôr em causa, de forma grave, os direitos dos trabalhadores.

De momento, o grande objetivo da FESAHT, e dos seus sindicatos a nível nacional, é a reabertura de todas as empresas. Nós não podemos aceitar que as empresas continuem encerradas – hotéis, restaurantes, cafés… – e em particular a hotelaria, até porque estamos numa altura em que se regista um grande pico de ocupação. Em todo o litoral, de Valença a Vila Real de Santo António, mas também no interior – veja, por exemplo, a Pousada do Gerês, tem uma ocupação extraordinária – verifica-se uma grande ocupação. E, agora, com a reabertura da rota aérea do Reino Unido já se nota uma diferença muito grande…”

… principalmente no Algarve…

FF – “… não só no Algarve, mas também no Porto, até porque os preços do Algarve e de Lisboa são bastante superiores aos daqui, do Porto. Portanto, as companhias aéreas e os seus clientes começam à procura de bilhetes mais baratos e zonas mais concorrentes, e o Porto, naturalmente, que vai encher, como já se torna habitual.

Agora, há um aproveitamento da pandemia por parte das empresas do Turismo a nível nacional, ou seja, dos tais grandes grupos económicos, como o grupo Fénix, que, aqui no Porto, tem cinco hotéis, encerrou quatro, tem um aberto, e tem empurrado à força os trabalhadores todos para esse hotel. E os clientes quando chegam às receções do Ipanema Porto, do Tuela ou Tuelinha, são forçados a irem para o Ipanema Park. Aí, estão a concentrar os clientes todos,  assim como estão a concentrar os trabalhadores  pondo até em causa razões de saúde e proteção, etc.”

Proteção relacionada, naturalmente, com a pandemia…

FF – “… exatamente! A sala de pequenos-almoços do Ipanema Park não tem condições para receber tantos clientes. A empresa faz isso porque tem os trabalhadores a tempo parcial – estão a trabalhar a 50 por cento ou até menos -, com horários reduzidos, portanto há aqui toda uma manobra do grande capital para aumentar os lucros. Não desperdiçam crises para aumentarem os lucros, e nós estamos confrontados com a situação dos trabalhadores… a qual é horrível”.

Depois é preciso repor os direitos.

“Hoje, estamos a exigir a reabertura das empresas, e a reposição dos Direitos, porque há Direitos que foram retirados aos trabalhadores a nível nacional: férias forçadas – os trabalhadores não tiveram férias este ano, e precisam ir de férias. Estão a trabalhar de férias, em dias de folga, feriados … de borla. Há ainda um aproveitamento para retirar prémios aos trabalhadores, alguns deles que os recebiam há dezenas de anos, e que agora não foram repostos”.

É PRECISO NEGOCIAR OS SALÁRIOS E, ASSIM, DAR UM ESTÍMULO AOS TRABALHADORES PARA COMPENSAREM OS MESES QUE FICARAM SEM TRABALHAR…

“Há também a questão do pagamento dos salários em atraso, facto que, obviamente, temos de reclamar, como o Hotel Beta, como os hotéis de Mirandela; de Bragança, o Turismo São Lázaro; o de Vila Real, MiraNeve; e há hotéis a funcionar com trabalhadores com salário em atraso… Obrigam-nos a exercer as suas funções sem salários de há três ou quatro meses.

Também no Algarve há grupos económicos com salários em atraso. Portanto, o pagamento desses salários  é um questão importante, assim como os aumentos salariais, porque, em 2019, muitas empresas não deram aumentos salariais. Nós não conseguimos negociar com as maiores associações patronais nacionais, nem com a Associação dos Hotéis de Portugal, nem com a APHORT, que tem sede aqui no Porto. A única associação que negociou, no ano passado, foi a AHRESP. Este ano, não conseguimos negociar com quer que seja. É preciso negociar os salários! É preciso dar um estímulo aos trabalhadores. É preciso que eles recebam um pequeno aumento salarial para compensar os meses que ficaram sem trabalhar…”

E 2019 foi mais um ano extraordinário em termos de ocupação…

FF – “Sim, mas, a verdade, é que há uma descapitalização das empresas em geral. Para já, muitos patrões de cafés, restaurantes e pastelarias, etc., metem dinheiro ao bolso. Ao fim de quinze dias de encerramento, por causa da pandemia, já não havia dinheiro para pagar salários. Isto é um escândalo! É preciso ver o que é que se passa com isto! As empresas têm direito – refiro-me aos gerentes, aos sócios, às sociedades – a lucros para as suas empresas, mas não podem descapitalizá-las. Todavia foi isso que se verificou”.

Mas, como já aqui se falou, registaram-se problemas de gestão em algumas empresas…

FF- “Sim. Para além de problemas de gestão de um ou de um outro estabelecimento, mas, os quais, deram logo o berro. O «Mal Cozinhado» e muitos restaurantes e cafés da cidade, o «Cancela Velha» por exemplo, chegaram ao final de março e já não pagaram o salário. Restaurantes há, que tinham uma boa ocupação e que já não pagaram o salário de fevereiro, e os que pagavam, faziam-no às prestações, apesar de oito anos consecutivos de grande ocupação do setor; de grandes lucros… Resumindo: os patrões têm metido dinheiro ao bolso! Tiveram de 2011 a 2018 sem negociar salários. Algumas associações patronais negociaram em 2017, antes disso ninguém negociou, e depois, em 2018, 2019, poucas. E em 2020, nenhumas!”.

NESTE PERÍODO DE PANDEMIA, O SINDICATO DO NORTE FEZ 237 DENÚNCIAS E A INSPEÇÃO DO TRABALHO RESPONDEU A… 26

Foto: pesq. Google

O sindicatos têm, por certo, contestado estas situações…

“Realizamos uma quinzena de luta no final do mês de julho e início do mês de agosto, em que as questões centrais que tínhamos nas moções, aprovadas pelos trabalhadores, foram  a reabertura de todas as empresas; a reposição dos direitos; o pagamento dos salários em atraso, e aumentos salariais para os trabalhadores. Estas são questões centrais, para as quais exigimos que a Inspeção do Trabalho atue…”

Não tem atuado?

“Não. Não tem atuado! Veja-se o caso do Sindicato do Norte, que fez 237 denúncias neste período da pandemia, e a Inspeção do Trabalho respondeu a 26. Ficaram sem resposta 211, e 211 situações graves, de despedimentos, de contratados a termo de pessoal em período experimental, ou acordo forçados, retirada de direitos, etc., e a Inspeção do Trabalho ficou nos gabinetes. Não andou, nem ainda anda, pelas empresas.

A prática da Inspeção do Trabalho foi, e é, altamente penalizadora para os trabalhadores, porque contribui para um clima de impunidade geral. Houve patrões que disseram que iam reabrir, mas sem férias, nem folgas. Dito e feito. Mas, eles, os patrões, só falam assim porque sabem que a Inspeção do Trabalho não atua”.

NC –“Estão a obrigar os trabalhadores a dar o tempo que tiveram de férias…”

FF – “pouca gente tinha marcado férias para o período em que se verificou o pico da pandemia, mas, mesmo que tivesse marcado, as empresas deveriam anular essas férias. Nunca teriam umas férias em condições devido à pandemia e a tudo quanto ela criou. De acordo com a Constituição Portuguesa, as pessoas têm de ter férias de modo a recuperarem física e psicologicamente e num quadro de integração social, de convívio familiar, etc. Portanto, esta pandemia impediu o gozo de férias, e alguns patrões aproveitaram-se da pandemia para não dar férias no setor. Ninguém goza férias nestas condições, isto é uma violência que estão a fazer aos trabalhadores”.

A INSPEÇÃO DO TRABALHO VAI SACUDINDO A ÁGUA DO CAPOTE E LOGO QUANDO TEM UM PAPEL FUNDAMENTAL NA DEFESA DOS DIREITOS DOS TRABALHADORES

E qual é a reação do Governo a estes casos, ou, mais concretamente, o Ministério do Trabalho?

FF – “Lava as mãos como Pilatos. O Governo, para já, não dialoga com os sindicatos. Neste período de pandemia, a ministra só, muito forçada, recebeu uma vez a nossa Federação.  Há tempos tínhamos marcado uma reunião com a Inspeção do Trabalho. Inspeção de Trabalho que acabou por se esquecer dessa reunião. Veja lá! A senhora diretora da Região Norte esqueceu-se da reunião para se fazer um balanço.

Há, aqui, uma falta de respeito, e a Inspeção do Trabalho vai sacudindo a água do capote, e logo quando ela tem um papel fundamental na proteção dos trabalhadores, até mesmo porque a esmagadora maioria dos trabalhadores, e noventa e tal por cento das empresa,s são PME, como dez ou menos trabalhadores. Aí é que precisamos da Inspeção do Trabalho, de modo a que os direitos dos trabalhadores sejam protegidos. A Inspeção tem de andar nas empresas para obrigar os patrões a cumprirem com os horários. Ainda há trabalhadores em lay off, em tempo parcial, mas que estão a trabalhar a full time”.

NUNCA OS TRABALHADORES DA «GALIZA» RECEBERAM OS SALÁRIOS EM DIA COMO NA ALTURA EM QUE ESTIVERAM A GERIR A CERVEJARIA

Foto: Miguel Nogueira (Porto.)
Foto: Miguel Nogueira (Porto.)
Foto: Miguel Nogueira (Porto.)

O facto de casas emblemáticas do setor, como a cervejaria Galiza, ou a Casa Aleixo, no Porto, terem encerrado as portas, levou a que a crise que terá afetado a restauração e a hotelaria fosse mais visível… com uma outra projeção,  e, assim, chegasse mais ao público… Aliás, o caso da “Galiza” teve até a solidariedade de autarcas e outras pessoas conhecidas do grande público. Na Casa Aleixo, já se registavam salários em atraso, salvo o erro, desde maio. Estes casos específicos estiveram relacionados somente com a Covid? 

FF –“A cervejaria Galiza é um caso particular, especial… diferente. Esteve em autogestão, praticamente, durante oito meses, e com isso  conseguiu pagar… dez salários. Nunca os trabalhadores da «Galiza» receberam os salários em dia, como receberam na altura em que estiveram a gerir a cervejaria. Os trabalhadores, que receberam em novembro do ano passado, obrigaram a empresa a reabrir o estabelecimento, recebendo, dessa forma, o salário de outubro que estava em atraso. Assim como, o subsídio de Natal de 2018, e ainda todas as suas retribuições. E chegaram a receber, a tempo e horas, mesmo no pico da pandemia. A cervejaria cumpriu com os direitos dos trabalhadores no que concerne aos salários. Agora, o que aconteceu à cervejaria Galiza foi que um credor requereu a insolvência, processo esse que decorre, esperando-se que reabra dentro de pouco tempo”.

NA «CASA ALEIXO» HÁ UMA QUESTÃO QUE NÃO É COMPREENSÍVEL, MAS QUE AS AUTORIDADES NADA FAZEM PARA FAZER COMPREENDER

Foto: pesq. Google
Foto: pesq. Google
Foto: CGTP

E a Casa Aleixo…

FF – “Quanto ao restaurante, casa, Aleixo – e outros restaurantes da cidade que encerraram -, isso, como se disse, deveu-se a má gestão, ou, então, a uma grande confusão. Também eram unidades que já estavam com problemas.  Já que centrou a questão na Casa Aleixo – que era um estabelecimento de grande visibilidade, até tinha preços altos, e uma boa ocupação… era familiar -, não houve um trespasse! Ali veio ao de cima uma questão familiar de há muitos anos. Porque, às vezes, quando há um trespasse, e o adquirente paga muito dinheiro, isso cria, por vezes, dificuldades. Mas, aqui, não! Não foi o caso. Há, aqui, uma situação que não é compreensível, mas que as autoridades também nada fazem para fazer compreender. Ninguém vai ver as contas da Casa Aleixo e dos outros estabelecimentos. Aquilo agora vai para a insolvência, mas como não é uma insolvência dolosa, há que ver, então, para onde foi o dinheiro. Para onde foi o dinheiro das empresas?”

Dificilmente se saberá.

FF – “Não há nenhuma expectativa nesse aspeto, mas devia haver! Devia haver uma fiscalização, porque os restaurantes, os cafés e as confeitarias, oficialmente, não faturam…. anda tudo à margem da lei, e, por isso , é que quando chega o final do mês metem o dinheiro para o bolso, e, depois, quando é para pagar aos trabalhadores parece que estão a pagar do próprio bolso, e não estão…. o dinheiro é da empresa, é das contas da empresa.

Por estas e por outras, neste quadro de pandemia, quem esteve e está a perder é o trabalhador nos seus direitos, nos seus salários, porque o Governo também não aceitou a proposta da FESAHT, e dos sindicatos, de criar um fundo especial para os trabalhadores ilegais e clandestinos”.

QUANDO CONSEGUIRMOS FALAR COM UM INSPETOR DO TRABALHO ESTARÁ A ACONTECER UM MILAGRE

Mas, por que é que não aceitou?

FF _ “O Governo não apresentou nenhuma razão. Na altura em que confrontamos, pela primeira vez, a ministra do Trabalho sobre essa questão, a assessora referiu que esses trabalhadores – ilegais e clandestinos – estavam cobertos. Estavam cobertos como? Quando foi a questão dos trabalhadores a recibo verde, eles ainda chegaram a poder aceder ao subsídio de desemprego, mas estes trabalhadores ilegais e clandestinos, não declarados, nada receberam.

Entretanto, muitos estabelecimentos encerraram, não reabrindo portas, e os trabalhadores desses locais não tiveram proteção. Isto é um disparate por completo. É uma violência que estão a fazer aos trabalhadores… É um escândalo um trabalhador estar impedido de recorrer ao subsídio de desemprego pelo facto da Inspeção do Trabalho não ter atuado de acordo com as suas atribuições e competências, e não passar o modelo para o Fundo de Desemprego! Isto, ou porque o inspetor está de férias, ou porque não sei quê?!  Quando conseguirmos falar com um inspetor do Trabalho estará a acontecer um milagre!”

O que acabou de referir, em democracia, é muito estranho…

FF –“É completamente anormal. Mas, isso é um facto que nós verificamos e que é inaceitável”.

NÃO PODEMOS ACEITAR QUE O «GRUPO PESTANA POUSADAS» TENHA, ILICITAMENTE, TANTOS ESTABELECIMENTOS ENCERRADOS

Foto: pesq Google

Agora, pergunto se alguns desses empresários se encontram na fila de espera pela, denominada, “bazuca”, ou seja, pelos apoios oriundos da Europa?

FF – “É natural que estejam. Serão, por certo, os primeiros. Aliás, os incumpridores são, nestes casos, sempre os primeiros a, de alguma forma, irem buscar dinheiro. Os «pequenos» fazem isso, mas os «grandes» também o fazem. Nós, não compreendemos como é que as instâncias do Estado não atuam perante factos denunciados por instituições credíveis, como, por exemplo, são os sindicatos. Não atuam! Como é que a Inspeção do Trabalho, por exemplo, de Guimarães, não faz participação criminal contra o Grupo Pestana Pousadas, que está a empurrar os trabalhadores para Viana do Castelo, a mais de oitenta quilómetros de casa; ou para a Pousada da Caniçada, ou para o Porto? O grupo Pestana está a fazer essas transferências ilícitas, forçadas, aos trabalhadores. E, por outro lado, tem o estabelecimento encerrado, quando, e de acordo com a Lei, o estabelecimento não pode estar encerrado! De acordo com a Lei isso configura a prática de um crime. Fazem do Código de Trabalho letra morta! Mas, há Código de Trabalho. Isso não aceitável, e como tal não podemos, obviamente, aceitar que o Grupo Pestana Pousadas possa ter tantos estabelecimentos encerrados ilicitamente.

Há uma percentagem considerável de trabalhadores que já não estão em lay off?

FF – “Sim, atualmente há um número considerável de trabalhadores que já não estão no lay off, mas  a redução de horário. O grupo Fénix tem cerca de duzentos de trabalhadores, todos eles em redução de horário, o que não se justifica., pois estão a acumular os clientes e os trabalhadores.

É bom que se diga que as unidades hoteleiras sempre tiveram ocupações altas e baixas, e há algumas, no Porto que, em agosto, não têm grande ocupação pois são mais destinadas a «negócios». Enquanto há outras destinadas mais ao Turismo, e não tanto aos «negócios»,  e têm,uma taxa maior de ocupação durante os meses de Verão. As situações são diferentes”.

Mas, a Covid afetou, obviamente, certas empresas. No meio disto, não há bons exemplos “comportamentais”?

FF-“Claro que afetou. O que nós não compreendemos é que as empresas, ao fim de quinze dias de encerramento, se pusessem logo com aqueles problemas todos. Ou seja: é evidente que a crise sanitária afetou a economia em geral, e o Turismo em particular, mas para um setor que há oito anos consecutivos tem aumento de ocupação de camas, e, assim, um aumento de receitas muito grande, a nosso ver, não é aceitável que, esses grandes grupos económicos, como é o caso da restauração da Ibersol, ou do grupo Pestana, ou do Vila Galé, etc. , tivessem logo mandado os trabalhadores de férias em tempo de pandemia. Depois, pô-los a acumular horas enquanto não houve os apoios, e mesmo depois de vir o lay off, puseram os trabalhadores, que estavam em lay off, com contrato suspenso, a gozar férias… isto em tempo de pico da pandemia. Portanto, houve um aproveitamento da situação, e isso é que não é aceitável. A situação pandémica afetou as empresas, sem dúvida alguma, mas a quem é que ela prejudicou fundamentalmente? Foi aos trabalhadores. E vai continuar a prejudicar nos próximos anos.”

SE NÃO REPUSEREM, AGORA, OS DIREITOS DOS TRABALHADORES, E NÃO REABRIREM AS EMPRESAS, VAI SER PIOR QUANDO HOUVER UMA SEGUNDA OU TERCEIRA VAGA DA COVID

E coloca-se a hipótese de haver uma segunda vaga da pandemia. Aliás, pelo que se sabe, isso será, praticamente, certo…

FF-“Não vamos pensar na segunda, nem na terceira vaga. Neste momento estamos com a setor a crescer. Nós precisamos é que sejam repostos os direitos dos trabalhadores, e a reabertura imediata das empresas. Se não repuserem, agora, os direitos dos trabalhadores, será pior caso surgir uma segunda ou terceira vaga da Covid; se não pagarem os salários em atraso vai ser pior  quando surgir uma segunda ou terceira vaga. Os patrões não podem dizer, agora, que não dão aumentos pela hipótese de haver uma segunda ou terceira vaga… não podemos entrar nessa situação. Os patrões têm o seu plano: aumentar os lucros e aumentar a exploração dos trabalhadores. E os sindicatos têm um plano diferente: defender os direitos dos trabalhadores, as suas condições de trabalho e promover a qualidade de serviço”.

E têm desenvolvido, por certo, contactos com os trabalhadores…

FF-“…Temos desenvolvido muitas ações, tanto através do nosso Sindicato do Norte, como de outros sindicatos filiados na FESAHT, da CGTP, tudo em prol dos direitos e interesses dos trabalhadores. Temos levado a efeito imensas atividades a nível nacional e que têm resultado em termos de algumas situações concretas de reposição de direitos. Também é preciso que os sindicatos, com uma grande força, possam dar uma esperança aos trabalhadores.

Eles estão com receio do presente e do futuro, e a voz do sindicato é fundamental, como os porta-a-porta que fizemos nos cafés, restaurantes, nas confeitarias, mas também nos hotéis; uma manifestação de trabalhadores com a exigência e a entrega de uma moção a reclamar os direitos dos trabalhadores. Os trabalhadores, assim, sentem-se mais protegidos. É esse o papel dos sindicatos! Nós temos que contrariar esta propaganda miserabilista do capital, dos patrões da restauração, etc. , que se têm aproveitado da situação, e já andam a falar numa segunda e terceira vagas… Para eles vai haver vagas até 2030!

Os patrões andavam, até 2012 – depois de dois ou três anos em que estagnou o setor -, sempre a dizer que as coisas estavam mal, para, a partir desse ano ou mesmo de 2013, as coisas começarem a melhorar. E o que é que os patrões começaram, então, a dizer? Ah, está bem, isto está a melhorar, mas temos de ter cuidado, porque isto é uma fase e a seguir vem uma fase pior”.

OS TRABALHADORES PRECISAM DE MAIOR PROTEÇÃO FACE À SITUAÇÃO QUE SE VIVE

Foto: pesquisa Google

Já estavam a adivinhar a Covid…

FF-“Parece que sim! E andaram a dizer isto durante oito anos. E que não podiam dar aumentos, porque, no entender deles, era preciso recuperar e solidificar as empresas, etc. O presidente da Confederação do Turismo disse, no ano passado, que as empresas do setor estavam muito bem capitalizadas. Então, não estão?! Logo no primeiro momento deixaram de pagar tudo. Cortaram com tudo aos trabalhadores… Fugiram com o dinheirinho, meteram-no ao bolso, descapitalizaram as empresas, e os trabalhadores ficaram na situação que toda a gente sabe…”

Então, com a Inspeção do Trabalho a não funcionar, e com – como dizem – uma certa apatia do Governo, como é que esta situação pode ser resolvida?

FF-“Continuamos a lutar! O quadro que traça é real. Esta é uma altura em que os trabalhadores precisavam da proteção da Inspeção do Trabalho. De acordo com as suas competências, deviam fazer cumprir os direitos e, consequentemente, a Lei, mas têm feito vista grossa… e não têm atuado, minimamente, sequer. E de facto, neste quadro,  quando os trabalhadores precisavam de mais proteção, é que se encontram completamente desprotegidos. Deixaram-nos à sua sorte. Assim, não! É precisa uma maior proteção dos trabalhadores face a esta situação. Nós precisamos e reclamamos medidas de apoio ao setor, mas, essencialmente, aos trabalhadores, porque esses é que estão a precisar de apoio”.

Quando falamos em trabalhadores, estamos a falar em famílias, ou porque laboram no mesmo local, ou até no mesmo setor?!

FF-“Sim. Há desemprego no setor, há sim senhor, mas não concordamos com aquela manobra de distração, promovida pelo senhor primeiro-ministro, quando diz que se poderia reconverter os trabalhadores do setor do Turismo, em trabalhadores das IPSS. Nos sabemos que as IPSS precisam de trabalhadores, e precisam deles porque pagam salários miseráveis. Esses trabalhadores, que desenvolvem atividades – nos lares de idosos, etc. -, têm uma formação durante um ano e são pessoas, mais ou menos, qualificadas. Ora, ninguém do nosso setor tem qualificação para desenvolver esse tipo de trabalho; não têm formação adequada; não têm sequer vocação para tratar, por exemplo, de idosos. É necessária formação… e vocação! Se me dessem formação para ir para um lar de idosos, eu não ia, porque não tenho vocação para desenvolver esse trabalho! Ia ficar maltratado… eu e os idosos.”

 OS PATRÕES SÃO TODOS MAUS! SÓ HÁ ALGUNS QUE SÃO MENOS MAUS QUE OS OUTROS…

 Resumindo e concluindo…

FF-“Estamos num quadro difícil, mas não vamos entrar nessa linguagem miserabilista utilizada pelos patrões de que vem uma segunda e terceira vaga de Covid. Nós não estamos todos no mesmo barco! Estamos num barco diferente. Nós, temos os filhos dos trabalhadores a passar fome; os filhos dos patrões não estão a passar fome. Este barco não é igual. O outro é um barco para os ricos, não é para os pobres. O nosso afunda-se! Os deles mantêm-se sempre a navegar!”

Em termos gerais, e refiro-me ao contexto europeu, este nosso caso, em concreto, é deles todos o pior?

FF-“É igual. Os patrões são iguais em todo o mundo! Temos alguma informação dos sindicatos com quem a CGTP colabora, e as notícias que temos, por essa via, são iguais às nossas. Os patrões são todos maus, há só uns melhores que outros. Alguns são menos maus que outros… essa é a minha visão das coisas. Ando há quarenta e tal anos na atividade sindical, pelo que para mim os patrões são todos maus, só que alguns são menos maus que outros. Não podemos fazer uma leitura de que há 50 por cento de patrões bons e outros cinquenta maus. Não, não: são todos maus!”

 

Para finalizar, refira-se que estava agendada para o passado dia 26 de agosto uma reunião da FESAHT com a ministra do Trabalho, Ana Mendes Godinho, mas, segundo soubemos – e por intermédio da referida Federação – que a mesma não se realizou por “ausência” da governante. Fica a informação!

 

CGTP ANUNCIA“AÇÃO DE LUTA NACIONAL” PARA 26 DE SETEMBRO

A CGTP anunciou, ontem (31ago20), uma ação de luta nacional para dia 26 de setembro, o objetivo principal é a defesa dos aumentos salariais. A iniciativa, com o lema “Aumentar os salários! Desenvolver o País“, tem como objetivo fazer convergir todas as reivindicações da central sindical, nomeadamente, as que se referem ao aumento geral dos salários e pensões e do salário mínimo nacional, pagamento da totalidade da retribuição a todos os trabalhadores com cortes salariais e garantia do emprego e do combate à precariedade.

“A Ação de Luta Nacional do dia 26 de setembro, visa expressar a determinação dos trabalhadores para romper com o novo ciclo de incremento da exploração que o capital tem em desenvolvimento, e dar centralidade à valorização do trabalho como fator determinante para a melhoria das condições de vida e de trabalho e para o futuro do país”, defende ainda a CGTP.

 

 01set20

Partilhe:

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado.

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.