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ANTÓNIO FONSECA: “A MINHA PASSAGEM PELA PRESIDÊNCIA DA ‘UNIÃO DE FREGUESIAS DO CENTRO HISTÓRICO’ PODE NÃO TER SIDO, POLITICAMENTE, PACÍFICA, PROVAVELMENTE, POR CULPA DE RUI MOREIRA”

Foi presidente da União de Freguesias do Centro Histórico durante oito anos – o correspondente a dois mandatos (2013-17/2017-2021) – e, além de, atualmente, ser líder das direções da Associação de Bares da Zona Histórica do Porto e da Associação para Intempéries e Calamidades, é-o também, e desde há, sensivelmente, um ano, da Associação Cívica ‘Mais Porto’.

Falamos de António Fonseca, que, em termos autárquicos, iniciou as suas lides como secretário da Junta de Freguesia de São Nicolau (2009-13). E, por mais estranho que, à primeira vista possa parecer, chegou à presidência da U.F. do ‘Centro Histórico’ nas listas do Movimento que apoiou, e apoia, o presidente da Câmara Municipal do Porto, Rui Moreira. E salientamos o “por mais estanho que possa parecer”, porque, de forma negativa, é, precisamente, Rui Moreira, que António Fonseca, mais crítica, ao longo da entrevista que deu, em exclusivo, ao ‘Etc. e Tal’.

Como presidente da ‘Mais Porto’, ou + Porto, o nosso entrevistado refere que o principal objetivo da associação é o de “ajudar quem governa” através de propostas, chamadas de atenção para determinados problemas, e de iniciativas, nas quais participam personalidades com provas dadas na vida da cidade e que “servem, e servirão, para enriquecer o debate sobre o Porto”.

Segue-se, então, António Fonseca, na primeira pessoa do singular e do plural…

 

 

José Gonçalves                    Ursula Zangger

(texto)                                    (fotos)

 

 

A Associação Cívica ‘Mais Porto’ quando é que foi fundada, e por quem foi criada? Por si, que é o presidente?

Foi fundada há cerca de um ano e foi criada por um grupo de pessoas qualificadas em várias áreas, da engenharia do ambiente à engenharia civil, passando por diversas tecnologias. Não são pessoas conotadas com qualquer força política… são apartidários. Esta associação tem como objetivo ajudar quem governa. No fundo, o que é que pretendemos? É, a partir das nossas experiências, e do conhecimento que temos da cidade do Porto – quer relativamente à Habitação, quer à Mobilidade, etc. -, que vamos, junto de quem de direito, denunciar casos no sentido dos mesmos serem resolvidos.

Em 2005 – estava longe de ser autarca -, e isto aquando das eleições para a Câmara Municipal do Porto, a própria Associação de Bares da Zona Histórica da Cidade do Porto apresentou a todos os candidatos, um manifesto de preocupações e de ideias para soluções. Curiosamente, só foi resolvido apenas um caso ou outro que constava nesse manifesto, daí que, em 2009, e já que nós, associação, estávamos a fazer o que os autarcas deviam fazer e não faziam, decidi ser… autarca. Fui, então, convidado pelo PSD, como independente, e acabei num executivo do PS – que tinha perdido a maioria absoluta –, como secretário e número dois da Junta de Freguesia de São Nicolau. Foi uma experiência muito interessante, o que me levou, em 2013, a aceitar ser candidato pelo Movimento de Rui Moreira, à presidência da União de Freguesias do Centro Histórico.

De realçar que sempre fui a favor da agregação das juntas de freguesias! Como autarca, em São Nicolau, tive a experiência de trabalhar, numa freguesia tão pequena, que, por esse motivo, estava limitadíssima na concretização dos seus objetivos, como por exemplo o de receber competências. A Junta não as podia receber devido ao facto de não ter escala demográfica para tal. Daí, ser favorável à agregação das juntas de freguesias… já que com essa união a força é maior, a começar na questão relacionada com o número de eleitores.

A sua passagem pela presidência da União de Freguesias do Centro Histórico não foi, porém, politicamente, pacífica…

Provavelmente por culpa do Dr. Rui Moreira! E por quê? Porque quando aceitei o convite para liderar a lista, havia o tal manifesto, o qual continha uma série de preocupações – algumas até recentes, como a que se está a passar na Pasteleira. Já nessa altura havia essa preocupação, e se, nessa altura, fossem tomadas medidas, não acontecia o que está, agora, a acontecer -, e verifiquei que esse manifesto não estava a ser cumprido. De salientar, que, na metade do primeiro mandato de Rui Moreira, houve quem abandonasse o Movimento, desligando-se dele completamente.

Eu próprio apresentei um programa específico para a União de Freguesias do Centro Histórico, e na presença do candidato à Câmara. E foi específico, pois no nosso concelho, as realidades são diferentes de freguesia para freguesia. A partir do momento em que apresentei o programa verifiquei, então, que o Doutor Rui Moreira não estava disposto a passar competências para as juntas de freguesia, ato que estava consagrado em Lei, no ano de 2013.

Fui uma voz de exigência nesse sentido, ou seja, na passagem de competências para as juntas ou uniões de freguesia, só que a Lei de 2013 dava seis meses às câmaras municipais para essa transferência ser uma realidade. Em 2019, há, entretanto, uma Lei que obriga as câmaras a passar as competências para as juntas. Só dizendo, à Direção-Geral das Autarquias Locais (DGAL,) que não havia interesse nessa transferência, é que, especificamente, essa junta ou união de freguesias, não teria que assumir qualquer responsabilidade acrescida

Ora, um presidente de câmara que seja competente, sabe que se passar as tais responsabilidades para as juntas ou uniões de freguesia, liberta-se de determinadas situações. O presidente de câmara podia ser incomodado na rua por um popular a apontar-lhe um buraco, e ele diria, pura e simplesmente, que esse problema não era da sua competência, pois, nesse caso, seria a junta a resolver a situação. Este é só um de muitos exemplos que lhe podia dar. Haveria, assim, um determinado número de competências que passariam para as juntas e uniões de freguesias. Mais: as verbas do Estado iam diretamente para as juntas ou uniões de freguesias, em vez de irem parar à câmara, assim como os recursos humanos que se encontrassem na edilidade seriam transferidos para as freguesias…

A CÂMARA DO PORTO CONTINUA A QUERER FAZER TUDO SOZINHA

Essas competências ainda não foram transferidas?

Não! O Porto continua a ser governado como uma aldeia. Em Lisboa, as competências já foram distribuídas pelas freguesias, logo a partir de 2013, enquanto, aqui, no Porto, a Câmara Municipal continua a querer fazer tudo sozinha! Desta forma, eu não consegui manter-me como presidente da União de Freguesias do Centro Histórico. Já, em 2017, estive para não aceitar ser candidato! Mas, aceitei! Por quê? Porque, se não aceitasse, ficava para memória futura o facto de, depois de ganhar a primeira vez, não ter condições para continuar e ganhar a autarquia. Só por isso é que aceitei! Recorde-se, entretanto, que Rui Moreira, em 2015, retirou-me a sua confiança política, por, nessa altura, eu ter denunciado determinadas situações….

Em 2019, pedi, então, ao presidente da Câmara, para a União de Freguesia do Centro Histórico receber as suas competências. Uns dias depois, o senhor presidente da Câmara telefona-me e pergunta-me: ‘queres tudo?’. ‘Não quero tudo, quero as competências’, respondi-lhe, e ele só disse: ‘agora não dá jeito… isso tem de ser feito faseadamente’. O que ele pediu-me foi para nós fazermos uma alteração, de modo a adiarmos para 2020 essa questão, e, nessa altura, fazermos uma negociação faseada da transferência de competências. Eu, para isso, tive de levar à Assembleia Municipal um documento a relevar o facto que a União de Freguesias do Centro Histórico não iria aceitar a atribuição de competências, de modo a que a DGAL fosse informada dessa posição .

A partir daí, e porque nada, até então, foi resolvido, achei que não havia condições para, em 2021, me recandidatar. E tudo porque não conseguia continuar a trabalhar com um presidente de Câmara que teimava, como teima, em não transferir para as juntas ou uniões de freguesia as competências que, por Lei, lhes devem ser atribuídas.

QUINZE DIAS NO ‘CHEGA!’ NÃO SE PODEM SOBREPOR A 12 ANOS DE AUTARCA!

Entretanto, nas últimas eleições autárquicas surpreendeu tudo e todos ao candidatar-se à Câmara Municipal do Porto como cabeça-de-lista pelo ‘Chega!’, que é considerado, pela esmagadora maioria dos portugueses que se veem representados na Assembleia da República, uma força racista, xenófoba, pró-salazarista, antidemocrática, etc.….

Sobre isso tenho que dizer o seguinte: eu aceitei o convite que me foi feito, contra tudo e contra todos – família incluída! Demorei algum tempo a refletir sobre o assunto; e numa reunião com o presidente do partido ‘Chega!’, disse-lhe que se aceitasse essa candidatura, o programa para a Câmara Municipal iria rever-se, única e simplesmente, na minha forma de estar na cidade do Porto. Conheço a realidade; não tenho problemas com cores de pele, ou comunidades venham elas de onde vierem… já tinha dado provas disso. O importante, para mim, é que as pessoas vivam na cidade, desde que cumpram as regras, como qualquer cidadão português. E ele disse para fazer o programa e do programa fazer o que quiser. Disse-lhe que para a lista iriam só as pessoas que eu escolhesse, entre as quais independentes. E o André Ventura disse: ‘a lista é sua, faça como quiser!’

Mas, mesmo assim, não deixou de ter atrás de si a bandeira do ‘Chega!’…

A questão que aqui se coloca, é que a minha duração no ‘Chega’ não passou de quinze dias! Não se pode sobrepor 15 dias a 12 anos de autarca! Por essa ordem de ideias, também estive ligado ao PS no executivo da Junta de S. Nicolau; ao PSD, e ao Movimento do Rui Moreira. Só porque estive quinze dias ligado a um partido, e porque as políticas locais nada têm a ver com as nacionais, não vão, agora, pôr em causa um património de 12 anos como autarca Isto fora o tempo que ocupei com ações no terreno, pela videovigilância, e questões sociais que foram desenvolvidas há cerca de trinta anos.

Também quando aceitei ser candidato pelo PSD à Junta de Freguesia de São Nicolau quase que me matavam! Não sei o que é que as pessoas veem em mim? Uns dizem que sou de esquerda, outros que sou de direita?! Tanto é, que – e isto só para ter uma ideia – o Partido Comunista, antes de eu ser candidato a São Nicolau, e o próprio Rui Sá, esteve comigo reunido, mas, depois, a partir do momento que fui candidato pelo PSD á Junta de São Nicolau, afastou-se de mim. Passei a ser o mau da fita! Às vezes, confundimos bandeiras políticas com pessoas. O que é certo, é que muitas das vezes nós temos de ter um veículo – pela logística e por todas as despesas que isso acarreta…

UMA JUNTA OU UNIÃO DE FREGUESIAS TEM DE SER AUTÓNOMA…

E o “veículo”, para 2025, será a ‘Mais Porto’?!

A ‘Mais Porto’ não tem um objetivos políticos à distância. Obviamente, que são cidadãos que da associação cívica fazem parte, e como cidadãos, se forem convidados a concorrer às ‘Autárquicas’, eles decidirão de livre vontade o seu futuro. O nosso objetivo é, fundamentalmente, o de ajudarmos quem precisar de ser ajudado. A nível da governança, é denunciar o que está bem e o que está mal, e nunca a crítica pelo bota-abaixo. Ainda recentemente tivemos um debate sobre ‘Habitação’, realizado no Ateneu Comercial do Porto…

…o nosso jornal esteve lá presente, mas por problemas de ordem técnica, não conseguiu publicar essa reportagem… coisas de gravador…

… onde apresentámos as nossas soluções! Tivemos oradores de diferentes quadrantes políticos, incluindo alguns independentes. Esta foi uma iniciativa das muitas que pretendemos realizar… é uma atitude de cidadania que temos de fazer. O meu percurso político permitiu-me ter conhecimento real das necessidades e, ao mesmo tempo, das dificuldades em poder discutir determinadas situações devido ao facto de as juntas e uniões de freguesias se encontrarem dependentes da vontade ou boa disposição de um presidente de câmara. Uma junta de freguesia, ou união de freguesias, tem de ser autónoma! Não se pode ser bajulador… votando favoravelmente determinadas propostas, mesmo sabendo que essas propostas irão, mais tarde ou mais cedo, prejudicar a junta de freguesia da qual se é presidente! Isso, nunca! Em 2017, com muitos eleitores presentes, o senhor doutor Rui Moreira ouviu o nosso programa. Depois senti dificuldades em aplicá-lo com a agravante de, durante oito anos, a Câmara Municipal do Porto ter retirado a União de Freguesias do Centro Histórico da sua agenda.

A NOSSA ASSOCIAÇÃO NÃO SERÁ UM VEÍCULO PARA DIZER EM QUEM VOTAR

Mas, a associação cívica a que preside vai dar apoio a alguém em especial para a presidência da Câmara Municipal do Porto?

Apresentaremos soluções aos candidatos à Câmara do Porto. Dou-lhe um exemplo: houve uma altura que o PS tinha a maioria absoluta na Assembleia da República, e o candidato dos socialistas para a presidência da Câmara do Porto era Francisco Assis… já lá vão alguns anos. Fizemos, então, um almoço com o candidato e a sua comitiva, na qual também estava Luís Catarino, e nos esclarecimentos relativos à zona histórica, realcei o facto de as casas com pé direito não conseguirem licenciamento. Ele, Francisco Assis, pediu ao Luís Catarino para apontar o problema, referindo que iriam apresentar a questão ao Governo e à Assembleia da República, até porque o PS tinha maioria absoluta e, assim, a situação mais depressa poderia ser resolvida. E foi. Isso caiu bem! Nós não podemos recomendar o voto no partido ‘a’ ou no ‘x’, mas não podemos, nunca, ignorar ou deixar de dar a conhecer algo que, por nós alertado, foi levado em conta e colocado em prática. Independentemente dessa posição, a nossa associação não será um veículo para dizer em quem votar…

E quanto a alertas relativos a problemas que estão a afetar os cidadãos da cidade, e esse é, sem dúvida, um dos objetivos da ‘Mais Porto’, veja o exemplo das pessoas que ficaram prejudicas com a tormenta de sete de janeiro, e que ainda não viram o dinheirinho de apoio; o dinheirinho ainda não chegou! Verificamos também que, na Praça da Batalha, colocaram uns ‘pins’ e não avisaram nem moradores, nem comerciantes. Portanto, chego à conclusão que, na Câmara do Porto, há um problema de falta de comunicação, e depois não aceitam as críticas. Eu, e a associação ‘Mais Porto’, vamos continuar a alertar os responsáveis para os problemas que encontrarmos. Nós fazemos isto porque gostamos de ser úteis. São atitudes deste género que faltam aos cidadãos, os quais se vão desligando das realidades. Acho que todos nos devíamos criar ou fazer parte integrante de movimentos…

DUVIDO QUE SEJA O MOVIMENTO (QUE APOIOU RUI MOREIRA NAS ÚLTIMAS ELEIÇÕES) A GANHAR A CÂMARA DO PORTO, EM 2025

As próximas eleições Autárquicas, a realizar em 2025, terão, e no que à Câmara Municipal diz respeito, um outro – mais apetecível – atrativo, isto pelo facto de Rui Moreira não poder recandidatar-se ao cargo de presidente. Os concorrentes vão, assim, e quase de certeza, apostar em figuras, politicamente, fortes para ocuparem o lugar. Acha que o atual vice-presidente, Filipe Araújo, poderá ser essa figura, apoiado que será, e porque dela é o presidente, pela vossa congénere ‘Porto, o Nosso Movimento’?

As ‘Autárquicas’  de 2025, no Porto, serão um ‘déjà vu’ (já visto) das de 2013, mas com protagonistas diferentes. Na minha ótica, e face já ao que se passou em 2013, os cenários de eventuais vencedores – as sondagens valem o que valem -, são muito improváveis. Não sabemos se o PSD se apresentará ‘inteiro’ ou dividido por ‘força’ do Movimento que apoiou, e apoia, Rui Moreira.

Atenção, que, e normalmente, os partidos apresentam candidatos fortes, quando quem está na presidência da câmara a ela não se recandidata, ou, neste caso, a ela não se pode recandidatar. Portanto, estou em crer que, em 2025, haverá candidatos fortes. O Movimento Rui Moreira que, neste último mandato, deveria ter feito um ‘passeio’, foi penalizado… algo se passou de errado! Duvido, assim, que seja esse movimento a ganhar de novo a Câmara do Porto…

PARA SER CANDIDATO A ALGUMA COISA, ALGUÉM VAI TER DE ME CONVIDAR

E o António Fonseca será candidato?

Serei candidato a nada! Se for candidato a alguma coisa, alguém vai ter de me pedir… de me convidar. Nunca me ofereci para ser candidato, e sempre que fui candidato, quer para as associações, quer para as autarquias, nunca pedi para o ser… convidaram-me.

Se for candidato autárquico, a que órgão for, terá mais força ser apoiado por uma associação como a ‘Mais Porto’, do que, propriamente, pelo ‘Chega? Ou, não?

O ‘Chega’ está fora de questão. Continuo o achar que, da forma que isto está, faz falta um partido novo.

Mas, já há dois novos partidos.

Eu acho que, para políticas locais, é preciso ter muito cuidado, tem de se saber separar a política local da nacional.

ESTÃO A DESERTIFICAR A CIDADE!

Mas, o Porto evoluiu, ou não, nos últimos dez anos?

Em que aspeto?

Em todos!

Em qualidade de vida não evoluiu! Temos de dividir a sua pergunta em duas respostas. O Porto, não foi com o Rui Moreira, que teve a dinâmica turística que conhecemos, pois ela surgiu em 2010. E toda a reabilitação começou nesse ano. Não foi por acaso que o Porto foi considerado como ‘melhor destino, em 2011. Houve, na realidade, uma grande reabilitação no Centro Histórico do Porto, mas, não houve, em todos estes anos, uma preocupação de fixar moradores nesse importante território da cidade.

Vou dar-lhe um exemplo: há dias li num jornal que a Câmara Municipal do Porto quer criar mais trinta quilómetros de zonas pedonais. Há ruas pedonais em que não passa um carro. Dessa forma, as zonas pedonais não destinam-se a fixar moradores. É para alojamento local, hotéis, ou ‘residências flutuantes’. Como é que nós podemos fixar moradores, neste espaço que vai das Fontainhas à Casa da Música – que é considerado o ‘centrão’ da cidade – se, no fundo, todas as condições de arruamentos que estão a ser criadas vão no sentido de não fixar moradores em ‘residência permanente’? Os custos das habitações estão a preços elevadíssimos! Estão a desertificar a cidade! Ninguém aprendeu o que quer que seja com a pandemia!

O preço das habitações e das rendas são, realmente, incomportáveis…

E por que é que são incomportáveis? Por uma razão muito simples: …

…mas, há apoios ao arrendamento.

Sim. Claro! Mas, não conheço muitas casas de renda acessível. Deve haver para aí meia-dúzia delas! Quando era presidente da União de Freguesias do Centro Histórico, tínhamos um apartamento que, depois do falecimento do inquilino, fizemos candidaturas para jovens até aos 35 anos, para um T2, a duzentos e tal euros. Acho que temos de criar condições para os jovens que querem constituir família. É que, além de contribuírem para o crescer da taxa da natalidade, estão ajudar a que a cidade cresça em termos de população residente.

O Porto é, hoje, um grande centro de emprego, graças à dinâmica turística. Ninguém está contra o turismo! E o turismo não pode ser culpado… tem é de haver políticas para que o turismo não bloqueie a dinâmica da própria população. Qualquer dia teremos de andar por aí com atores a fazer que são portuenses… que são moradores! Repare que há zonas no Porto em que a maior parte das pessoas, que por lá passam o dia, não moraram no Porto.

A REABILITAÇÃO DO EDIFICADO DA CIDADE DEVE-SE À INICIATIVA PRIVADA

 

A população começou a deixar a cidade nos anos 80 do século passado…

Isso é diferente! Nos anos 80 e 90, muita gente saiu do Centro Histórico do Porto porque viviam em espaços com trinta metros quadrados…

..e foram para a periferia?!

Na altura não tínhamos, no Porto, equipamento habitacional para essa gente toda. Entretanto, o que evoluiu, de facto, foi a qualidade, foi a imagem da cidade, que estava completamente degradada. Mas isso não foi graças a Rui Moreira, nem à Câmara Municipal do Porto… tudo isso, foi graças ao setor privado que aproveitou a dinâmica turística e reabilitou esses espaços. Ou seja, a Autarquia, às vezes, fala como se fosse responsável por toda a dinâmica e pela reabilitação, e não é verdade! Tudo o que foi feito na cidade do Porto e que tem melhorado o património de todo o edificado é de iniciativa privada.

A Câmara Municipal tem a sua intervenção nos bairros sociais, mas o que falta aqui é a ajuda para a criação de rendas acessíveis, que já devia ter acontecido em 2013. Estamos em final de mandato – daqui a dois anos há eleições –, nada de concreto foi feito e a cidade está a esvaziar-se. Gostava de saber qual o ‘travão’ que foi colocado para que esse problema não crescesse da forma que está a crescer?! Não foi por falta de avisos, ou de alertas. Há pessoas que não podem pagar e têm de estar abrangidas por rendas sociais. Nesse aspeto, a ‘Domus Social’ tem feito um bom trabalho. Alias, eu só vejo duas empresas municipais a trabalhar e que fazem sentido: é a ‘Aguas do Porto’ e a ‘Domus Social’… tudo o resto não vou comentar. O que se coloca aqui, é o seguinte: o Porto está mais bonito, mais lavado, mas não está humanizado!

HÁ ESTUDANTES, ORIUNDOS DE DIVERSOS CONCELHOS DO PAÍS, A PAGAR 600 A 700 EUROS MENSAIS POR UM BELICHE…

Qual foi a decisão, ou o trabalho, mais positivo de Rui Moreira à frente dos destinos da cidade?

Tenho alguma dificuldade em responder a essa pergunta. Tenho dificuldade porque o manifesto, que foi subjacente ao movimento, não foi cumprido. Trabalho positivo? Tenho alguma dificuldade em encontrar. O único trabalho positivo não foi do doutor Rui Moreira, foi na Cultura e por parte de Paulo Cunha e Silva que nos deixou e que nos faz muita falta. Repare que as dinâmicas da cidade dizem respeito ao Turismo e à Academia. Temos 70 mil estudantes; muita empregabilidade… e depois? Há estudantes, oriundos de diversos concelhos do País, a pagar de 600 a 700 euros mensais por um beliche! Vou dar um exemplo concreto: houve, há semanas, um incêndio na Sé. As senhoras que residiam nesse imóvel ficaram 15 horas à espera para saber onde iam ficar. A Câmara refere que a primeira decisão tem de partir da Segurança Social. Lembra-se quando aconteceu um incêndio na Rua de Alexandre Braga?! O que é que eu fiz, como presidente da União de Freguesias do Centro Histórico? Eu! Arranjei de imediato um espaço para que a família tivesse num local até a Câmara arranjar casa. Ora, se estivesse à espera da Segurança Social, essa família tinha de ir para um centro de acolhimento; a senhora idosa ia para um sítio, e o filho ia para outro. E depois os centros de acolhimento são o que são…

O que está acontecer aqui, é que a Câmara Municipal, quando as coisas se complicam, sacode a água do capote: ‘ah! Isso é um problema da Segurança Social’… dizem eles! O presidente de Câmara se quer dormir descansado, sabendo que tem pessoas que ficaram desalojadas, ou por um incêndio ou por outro qualquer motivo, têm um sítio para estar, tem de ter uma folga de edificação até que consiga uma situação mais permanente, e, assim, não se encontre ‘pendurada’ na Segurança Social. Até porque, a própria Social tem dificuldade em arranjar sítios para realojamento temporário aqui no Porto.

Se fosse presidente da Câmara qual era a medida que tomaria de imediato?

Isto do ‘se fosse’… é muito fácil. As energias seriam canalizadas para resolver o problema da Habitação! Em mil novecentos e oitenta e tal, quando era presidente da Câmara Municipal, Alfredo Coelho de Magalhães, houve um empreendimento da ‘Soares da Costa’, na chamada Urbanização de Santa Luzia… o bairro foi criado e a Câmara comprou 180 habitações. Fizeram o concurso; as pessoas concorreram e conseguiram as casas. Penso, que não podemos estar sempre a alegar que não há casas. Se há um empreendimento, um alojamento local, ou seja lá o que for, mas tem lá dez habitações, a Câmara que as compre e as alugue com uma renda acessível. As pessoas poderão lá residir por um determinado período ou de forma permanente, conforme a realidade das famílias. A Habitação é uma prioridade.

NO PORTO, NÃO HÁ OPOSIÇÃO

 

E a Câmara Municipal, no ponto de vista financeiro, deu um importante ‘salto’… praticamente ficou sem dívidas…

… atenção que o presidente Rui Moreira herdou muito dinheiro do executivo de Rui Rio. As câmaras também têm capacidade de endividamento, para resolverem os problemas da sua população…

Mas, essa realidade foi aplaudida por unanimidade…

Continuo a achar que, aqui no Porto, não há oposição.

Mas, a oposição existe só para dizer mal de tudo… para o ‘bota-abaixo’?

A oposição tem de existir para apresentar projetos; apresentar soluções, mas essas soluções não são aplicadas. Depois, andam todos de braço dado. A questão é que fazem o teatro, mas saem do palco de braço dado. Por exemplo, e regressando ao tema da Habitação, penso que parte da Taxa Turística devia ser aplicada, sobretudo, em casas. Há que melhorar os bairros sociais, incluindo o interior de determinadas habitações. Há também que apostar nos jovens que, de momento, estão a trabalhar no Porto, mas que deslocam-se da Maia, de Gondomar, etc., e que gostavam de ter aqui uma casa para a sua família…

Os transportes têm escapado a esse rol de ‘chamadas de atenção’?!

Quando o doutor Fernando Gomes lançou o projeto do Metro do Porto, todos disseram que ele era megalómano. Não sei o que seria da cidade sem o Metro?! Quanto à questão de se é, ou não, um luxo viver no Porto? É e não é. Se tivermos mais população a viver no Porto, ela por certo utilizará mais os transportes públicos, e as que tiverem viaturas, por certo que as deixarão de usar. E com tudo de essencial muito perto das suas residências poderão andar pela cidade sem problemas…

Então as ruas pedonais tem a sua lógica?!

Não. As ruas pedonais só prejudicam a fixação dessas pessoas. Há sempre limitações. Veja: até há, por exemplo, horários específicos para as casas comerciais serem abastecidas. Mais importante que as zonas pedonais é a fiscalização, nas zonas onde se circula, onde continuam a haver carros…

O que é que, em seu entender, vai acontecer com a desértica Rua 31 de Janeiro?

Tendo em conta os edifícios que já foram comprados a peso de ouro… poderá estar a ser criado um ‘tapete vermelho’ entre a cota alta e baixa do centro da cidade. De momento, existem por lá dois ou três agregados, e já estão previstos um ou dois hotéis e, provavelmente, alguns empreendimentos para habitação. Agora, não tenha a mínima dúvida que por lá nascerão lojas de luxo. Mas, para já, aquilo está como está! É a política do ‘deixar morrer a coisa’, e a prova é que a maior parte dos edifícios estão devolutos.

AS OBRAS DO METRO SÃO NECESSÁRIAS! HÁ ATRASOS E, ASSIM, HÁ QUE ACAUTELAR A VIDA DOS COMERCIANTES…

Quanto às obras do Metro do Porto e ao relativo atraso nas obras, estão a complicar a vida no centro da cidade?

Quando foi do primeiro projeto do Metro também aconteceu esse atraso. Acho que há obras que são necessárias. Agora, temos é que acautelar – e a Metro deve ter isso em atenção -, a vida dos comerciantes… eles não podem ficar mais anos com quebra nos rendimentos. Na primeira ‘investida’ da Metro foram poucos os comerciantes que sobreviveram ao tempo que durou as obras e à, consequente, quebra nos rendimentos. É preciso ver que, nestas zonas, as rendas são elevadíssimas, há aí lojas a pagar seis mil ou sete mil euros mensais. Se essas lojas forem afetadas neste período… será que se vão aguentar? O que se tem verificado, é que alguns compreendem a situação e dizem que as coisas vão melhorar; outros perguntam-se se o seu negócio vai sobreviver até ao final das obras? Mas, estas obras são necessárias! Se pecam por ser tardias? Foi o ‘timing’ arranjado. Acho que o Metro é algo em que a cidade do Porto deve apostar, e apostar cada vez mais.

A verdade, é que a cidade está, e continua, a acarinhar os turistas, mas a população acaba por não ter o mesmo tratamento. E não tenhamos a mínima dúvida, é que o centro do Porto será para a classe alta. Depois, o turista não vem aqui para ver turistas. O turista vem cá para contactar com a população, as tradições locais… isso é crucial. Por isso, achar que o Porto precisa de ser mais humanizado…

… mais ‘atripeirado’

… não ‘aparolado’. A cidade do Porto é de todos: quer dos que cá estão; quer dos que para cá se deslocam para trabalhar; quer para as pessoas que a visitam. Não venham com o argumento dos anos 80/90 do século passado, pois, nessa altura, as pessoas que saíram do Centro Histórico viram os filhos crescer em lamentáveis condições, e compraram casa através da Banca, pelo que muitos ainda a estão a pagar. Mas, essas foram situações diferentes do que é a realidade atual.

Vou dar um exemplo: lidei com alguns proprietários que compraram alguns edifícios. Nesses edifícios estavam moradores. Colocaram, então, esses moradores em outros locais, e depois de reabilitados os edifícios, os moradores foram convidados a regressarem às suas casas a pagar a mesma renda que pagavam quando de lá, temporariamente, saíram. Esta política é que é importante! Casos destes aconteceram em Miragaia, na zona do Carregal, na Rua de Júlio Dinis… Nem todos os proprietários de edifícios se despreocupam com os moradores. O maior problema são os chamados senhorios sem rosto! Os senhorios com rosto têm um modo diferente, mais humano, de tratar as pessoas. Isto é respeito por quem viveu aqui muitos anos e deu alma à cidade. A população não pode ser descartável.

UM PSD DIVIDIDO PODE FAZER QUE O PS RECONQUISTE A CÂMARA DO PORTO, AO APOSTAR EM JOSÉ LUÍS CARNEIRO QUE JÁ TEVE UMA GRANDE EXPERIÊNCIA COMO AUTARCA

A partir de 2025 a cidade entrará num novo rumo?

Acho que, de momento, é uma incógnita quanto a quem irá ganhar a Câmara Municipal. No PSD não estou a ver quem seja o candidato à presidência, aliás, vejo-o dividido, e um PSD dividido pode fazer que um PS forte reconquiste a Câmara do Porto. Acho que o PS tem no doutor José Luís Carneiro, que teve uma grande experiência como autarca, um bom candidato…

O PS já o convidou nas últimas eleições, mas ele não aceitou.

Pois não. Ele ia concorrer contra um recandidato, que, normalmente, ganha sempre as eleições. E eu vejo que a Câmara do Porto dificilmente continuará, como atrás referi, a ser governada por alguém do Movimento que apoia Rui Moreira. Esse Movimento que era para ser independente deixou-o de o ser. Quanto ao senhor engenheiro Filipe Araújo… será ele um bom candidato? Filipe Araújo é um bom técnico, e não posso deixar de realçar, pela positiva, a parte da limpeza com excelentes melhoramentos, embora sujeita a algum reparo. Mas, na generalidade, a limpeza melhorou muito nos últimos seis anos, daí a nota positiva. Filipe Araújo tem, contudo, ainda alguma dificuldade em criar empatia com a população! Pode ser que nos próximos dois anos ele consiga ultrapassar esse problema.

Para terminar, quer acrescentar mais alguma coisa?

Só para dizer que passado, praticamente, um ano sobre a sua fundação, a Associação Cívica ‘Mais Porto’ começou a fazer iniciativas, como debates, que vão continuar, abordando temas como a coesão, social, a cultura, a mobilidade, o ambiente, a sustentabilidade, e isto sempre com o contributo de gente experiente nesses assuntos. Depois, em função desses debates, vamos tentar afirmar-nos como uma associação que quer ajudar quem nos governa, ou quem nos venha a governar.

15fev23

 

20fev23

 

 

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