A ‘Operação Babel’, que motivou as buscas, esta terça-feira às câmaras municipais do Porto e de Gaia, tem por base suspeitas de corrupção em negócios imobiliários de 300 milhões de euros.
Segundo o comunicado publicado pela Polícia Judiciária, a ‘Operação Babel’ “centra-se na viciação de normas e instrução de processos de licenciamento urbanístico em favor de promotores associados a projetos de elevada densidade e magnitude, estando em causa interesses imobiliários na ordem dos 300 milhões de euros, mediante a oferta e aceitação de contrapartidas de cariz pecuniário.“
Para já, foram realizadas 55 buscas domiciliárias e não domiciliárias, para recolha de prova de atos de corrupção, bem como da reiterada viciação de procedimentos de contratação pública.
“Nesta fase, foram já constituídos 12 arguidos, estando os detidos, um titular de cargo político [vice-presidente da autarquia de Gaia], dois funcionários de serviços autárquicos, um funcionário de Direção Regional de Cultura do Norte, dois empresários e um profissional liberal, indiciados pela prática dos crimes de recebimento ou oferta indevidos de vantagem, corrupção ativa e passiva, prevaricação e abuso de poder praticados por e sobre funcionário ou titular de cargo político”, referiu a PJ.
CÂMARA MUNICIPAL DO PORTO REAGE EM (CURTO)COMUNICADO
Num curto comunicado enviado À Imprensa – pelas 12h30 -, a Câmara do Porto garante que “as buscas não visam o Município”.
A Câmara Municipal do Porto confirmou ainda que os telemóveis de Pedro Baganha, vereador do urbanismo da Câmara do Porto, e de Sandra Salazar, chefe de divisão de urbanismo, estão a ser analisados pela Polícia Judiciária.
PEDRO BAGANHA: “A OPERAÇÃO DA POLÍCIA JUDICIÁRIA VISA UMA EMPRESA PRIVADA QUE TEM VÁRIOS PROCESSOS URBANÍSITCOS EM VÁRIAS AUTARQUIAS…”

Entretanto, Pedro Baganha, vereador do urbanismo da Câmara do Porto, reiterou que o “objeto da investigação em curso não é a Câmara Municipal do Porto”.
Em declarações aos jornalistas, Pedro Baganha sublinhou que a operação visa “uma empresa privada que tem vários processos urbanísticos em várias autarquias, sendo que um deles diz respeito à autarquia do Porto”.
O ‘Porto Canal’ conseguiu apurar, a que empresa privada em questão trata-se da ‘Fortera Group’ sediada em Vila Nova de Gaia. Criada em 2015, atua no desenvolvimento e gestão imobiliária no mercado imobiliário em Portugal com especialização em Reabilitação e Renovação.
O vereador do urbanismo garantiu que não é arguido na investigação e disse que a “Câmara do Porto está a colaborar ativamente na investigação da Polícia Judiciária”.
Relativamente ao telemóvel apreendido, Pedro Baganha explicou que “não é uma questão de ser apreendido, a Polícia Judiciária está a efetuar várias diligências de recolha de informação digital em postos de trabalho e em telefone, recolherá essa informação e devolverá os aparelhos às pessoas”.
REAÇÕES
PAULO DE MORAIS:”A CORRUPÇÃO NO URBANISMO NÃO É UMA EXCEÇÃO… É UMA REGRA EM PORTUGAL! ISTO ACONTECE TODOS OS DIAS EM TODAS, OU QUASE TODAS, AS AUTARQUIAS DO PAÍS!“
Paulo de Morais, fundador e presidente da Frente Cívica, em declarações à ‘SIC Notícias’ reagiu, da seguinte forma, aos crimes no Urbanismo e às mais recentes ações da Polícia Judiciária junto das câmaras municipais do Porto e de Gaia:
“Os crimes de urbanismo, ou a corrupção no Urbanismo, é talvez a mais perversa e a mais rentável em Portugal. Em que é que consistem os crimes em Urbanismo? Os mais relevantes consistem em atribuírem licenças ilegais para construírem prédios, ou que não se podem fazer, ou têm capacidade construtiva para além do que o Plano Diretor permite.
Estes crimes têm duas caraterísticas perversas: a primeira perversidade, é que o crime feito no escuro de um gabinete, e o edifício só aparece à face, visível, passado cinco ou seis anos, ou seja: a licença é passada hoje e, daqui a seis anos vai aparecer um prédio que é ilegal, mas que foi autorizado, muita das vezes, por pessoas que já nem se encontram nas autarquias. Esta é a primeira perversidade.
A segunda perversidade, que é pior, tem a ver com o facto de quando alguém permitir a construção de um edifício de seis andares, quando o Plano Diretor Municipal só permite três. Quer dizer que, naquele momento, o terreno duplica o seu valor. Ou seja: um terreno que valia um milhão passa a valer dois milhões.
Quando acontece, e acontece muitas vezes, que se permite construção em locais que não é permitido construir, o terreno passa a valer quatro vezes mais, há situações conhecidas de terenos que valem quatro milhões e que passam de repente, por loteamento não atribuído que não cumpre as regras, a valer 16 ou 17 milhões.
Um negócio que gera margens de 600 ou 700 por cento é um negócio cuja rentabilidade está ao nível apenas, e em Portugal, do tráfico de drogas. Os negócios mais rentáveis em Portugal, são, claramente, o tráfico de drogas ilegal, e do urbanismo ilegal e que se torna legal. Quem consegue, com apenas a emissão de uma licença de construção… com a emissão de um alvará de loteamento, margens de 600 e 700 por cento, e ainda por cima no mento em que tem o alvará de loteamento, esse alvará acaba por tornar legal, aquilo que cinco minutos antes era ilegal, isso gera rentabilidades enormes e a permissividade dos políticos neste tipo de negócios é enorme.
Muita das vezes recebem vantagens pessoais; outras vezes favores, e são também estes promotores imobiliários os principais financiadores dos partidos políticos. Normalmente o que acontece é que uma parte significativa desta margem de 500 a 600 por cento – que é ganha apenas num negócio imobiliário, que pode transformar um terreno que vale três milhões em sete milhões -, parte significativa vai para financiamento partidário e sobra ainda dinheiro para dar a muita gente.
Mas, quando estamos aqui a falar neste caso da Câmara de Gaia, que é um caso de corrupção, cujo os responsáveis não sabemos quem são neste momento – é evidente que a Judiciária e o Ministério Público investigarão -, quando há negócios de trezentos milhões, quer dizer que, em regra, os terrenos são avaliados como valendo cerca de 20 por cento do valor dos edifícios. Quer dizer que os terrenos que estão em apreço valem cerca de 50 a 60 milhões de euros.
“OS PROMOTORES IMOBILIÁRIOS, ESSES ‘PATOS BRAVOS’ DO URBANISMO, TÊM O PODER POLÍTICO LOCAL COMPLETAMENTE CAPTURADO”
Estes promotores imobiliários – e atenção que a corrupção no Urbanismo não é uma exceção, é uma regra em Portugal, isto acontece todos os dias em todas ou quase todas as autarquias do País, é evidente, que isto é mais grave, porque vale mais dinheiro, na Área Metropolitana do Porto e de Lisboa, porque os terrenos são mais valiosos. Mas, isto acontece sistematicamente; as valorizações são desta dimensão e estes promotores imobiliários, esses ‘patos bravos’ do Urbanismo têm o poder político local completamente capturado.
Só houve um responsável político, os outros são técnicos e têm a ver com as empresas que gravitam à volta das autarquias… o grupo em questão é israelita fez investimento de milhares de euros em 2021 e 2022 tanto em Gaia como no Porto… são casos difíceis de levar a Tribunal?
“Estes caos são, inexplicavelmente, em Portugal difíceis de levar a Tribunal. Mas, se há uma investigação da Judiciária e do Ministério Público é porque há, eventualmente, um crime. Se há trezentos milhões de empreendimentos imobiliários, se não cumprem o Plano Diretor Municipal de Gaia, do Porto ou seja lá de onde for, é porque há crime. E se não cumprem o Plano, esses negócios deviam ser cerceados desde já.
Mas, uma outra questão diferente, é saber quem é que são os criminosos, e eu julgo que é muito importante que o Ministério Público, quando atua nestas áreas, divida estas questões. Se há construções ilegais têm de ser demolidas. Depois é preciso saber quem permitiu que isto acontecesse, ou seja, quem são os criminosos, porque quando há crimes de Urbanismo, não há qualquer dúvida sobre se são crimes ou alegados crimes… são efetivos crimes de Urbanismo!
Depois, a outra questão é saber se foi o vereador do Urbanismo que aprovou, ou se não aprovou se foi informado do licenciamento, ou quem é que decidiu erradamente e com que objetivos, e por quê? O Ministério Público, muita das vezes, chega à conclusão que há crime, mas como não deteta quem é o criminoso, arquiva o processo, o que está mal no meu ponto de vista. Desde logo, e independentemente de quem é o responsável ou mesmo que não se chegue a apurara quem é o responsável, estes edifícios que são construídos ilegalmente, deviam ser, imediatamente, demolidos, de modo a ter um efeito dissuasor para crimes futuros”, palavras de Paulo de Morais, à SIC Notícias’
Fotos: Carlos Amaro (Etc. e Tal – Arquivo 2020)
Texto: Etc. e Tal
Foto de destaque: Mariana Malheiro (Etc. e Tal)
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