Encosta-se, tímida, a um “rio de ouro” que termina um ciclo de vida e se dilui no mar deixando na bruma um sem-número de estórias. Nele navegam alguns barcos, traineiras, caícos. Há gente lá dentro. Há gente que se acolhe nas casas que construíram no sopé ou na encosta de uma pequena mas íngreme escarpa. Há uma ponte por perto. A arrábida contempla o dia-a-dia de gente trabalhadora, que tem no rio e no mar o seu sustento. Mulheres e homens de fibra que dão graças a S. Pedro por serem o que são: gente nobre, sem medo; alegre, solidária… crente.
Tínhamos decidido fazer uma “escapadela” aqui ao lado, que é como quem diz, a um local bem pertinho da nossa Invicta e que tivesse interessantes particularidades. Ou seja, um passeio especialmente dedicado a si, que, connosco, vai conhecendo os recantos e encantos deste País à beira-mar plantado, e não só…
Fomos, então, até lá, à Afurada. Pequena mas rústica vila do concelho de Vila Nova de Gaia, que mira a Foz Velha, de um Porto encantador. Há mais para ver do que para contar neste passeio à procura de emoções, porque o que se conta só presencialmente se pode ouvir… e é bom ouvir, é bom ir lá…
José Gonçalves Mariana Malheiro
(texto) (fotos)
Dezasseis de abril. Dia de sol. Quentinho. Parque das Camélias (a necessitar de obras). Porto. Esperámos o “14” da “Espirito Santo” para nos levar a S. Pedro… da Afurada. Passeio abençoado. E a começar, desde logo, pela qualidade do transporte que é público e muito “bem tratado”, por cómodo e eficiente que é.
Muito trânsito, como sempre, nas principais artérias de Vila Nova de Gaia. Fazem-nos companhia (num entrar e sair constante do autocarro que nos transporta) dezenas pessoas. Umas já se conhecem. Cumprimentam efusivamente quem conduz a viatura, e, já por ruas menos conhecidas, vamos ao encontro de São Pedro da Afurada.
Pacata vila com cerca de 3.500 habitantes (Census 2011), a Afurada é pitoresca no seu íntimo, e popularmente conhecida pelos festejos em honra do seu santo padroeiro, nos quais os habitantes p homenageiam (a 29 de junho) com um grandioso festival de fogo-de-artificio no rio Douro, não faltando, na festa, as tradicionais e indispensáveis sardinhas assadas, a broa de Avintes, e depois – evento que atrai milhares e milhares de pessoas -, a bênção dos barcos, durante uma majestosa procissão, na qual os andores transportam imagens de santos de tamanho natural e o Sagrado Coração de Jesus.
E já falta pouco tempo para os festejos…
Diferente da dos dias de festa foi a Afurada que nos recebeu. O rio estava calmo, a aragem fresca. Já cheirava a assados na brasa. Antes, porém, visitámos a marina onde se encontram fundeados largas dezenas de barcos, próxima da Reserva Natural do Estuário do Douro. Antes, porém, dá-nos as boas-vindas uma verdadeira cascata de casas, formada e em permanente crescimento desde o século XIX, altura em que foi construído o bairro dos pescadores, com, aproximadamente 90 residências, escola, posto médico e de polícia, para onde migraram gentes ligadas ao mar, da Murtosa, de Ovar e de Espinho…
Perto da Marina, destaca-se o Mercado e Lavadouro, a escola e um parque infantil, a sede da junta de freguesia e ainda um comunitário “estendal” de roupa, assim como um espaço museológico, que revela relevando toda a vida de uma vila que foi elevada a freguesia nos anos 50 do século passado.
E que bonita é esta vila (!), constituída por ruelas, onde as casas – algumas delas de portas abertas (aqui parece não serem precisas chaves!?) -, exibem nas suas paredes interessantes azulejos e imagens de santos. Cá fora, há mulheres que se sentam em banquinhos para apanhar sol, vestidas com roupas caraterísticas das mulheres do mar. Falam entre si, fomentando uma saudável vizinhança. Isto, enquanto os homens se entretêm trabalhando a cuidar das redes, ou na limpeza das traineiras e outros barcos.
O vento deixou, entretanto, de soprar. A temperatura aumentou. Está quase na hora do almoço. Nas ruelas de Afurada, já se assa sardinha, bacalhau e outros peixes. O cheirinho é inconfundível e abre-nos (naturalmente) o apetite. Ao longe, e sempre a acompanhar-nos, a Arrábida… a ponte da Arrábida! E… o rio, o rio Douro que é de ouro para esta nobre gente.
E fomos (passe a publicidade) ao “A Margem”, restaurante que, à semana, tem refeições económicas e logo num ambiente requintado. Almoçou-se muito bem. A “coisa”, com tudo, ficou pelos 10 euros a cada um. Nada mau, mesmo sem pedir sobremesa. Essa (a sobremesa) fomo-la comer a um cafezinho rústico, onde um jovem nos atendeu de forma muito simpática. Caraterístico das gentes da Afurada.
Pós repasto seguimos ainda por algumas ruas da Afurada, encontrando, já numa praceta, a imagem em pedra granítica do padroeiro da terra, S. Pedro…
E continuamos a nossa caminhada para fazer a digestão, e…
… nos prepararmos para um não muito habitual regresso à Invicta, desta feita de barco, ou melhor no “Flor do Douro”. Antigamente era o “Flor de Gás”…
Viajem curta (dois euros por cabeça, e um “eurito” por bicicleta), mas “linda de morrer”!
E deixávamos, assim, lá longe aqui perto, a vila de S. Pedro da Afurada. Foram cinco horas bem passadas nesta pitoresca freguesia de Vila Nova de Gaia, pelos seus cheiros especiais, por genuínos que são; pelo silêncio interrompido somente pelo “cantar” das gaivotas.
Vale a pena dar uma saltada à Afurada e, com um solzinho a compor a paisagem, fica assegurada uma boa tarde ou final de manhã, incluindo almoço, neste sítio de simpáticas gentes que sabem enaltecer aqui que é deles
01mai18