Também candidata a Património Cultural Imaterial de Portugal à UNESCO, para conquistar o estatuto de Património Imaterial da Humanidade, a “arte xávega” que se desenvolve num “palco” com cenário natural da praia de Espinho, era identificada como “arte grande”, um património identitário deste povo, que remonta aos inícios do século XVIII, ligada às tradições do povo vareiro e às origens deste povoamento que dá vida a esta arte de pesca, preservando as suas características, como o tipo de embarcação, a exemplo de outros povoados no litoral entre Espinho e Costa de Caparica.
José Lopes
(texto e fotos)
Sendo a “arte xávega” uma atividade económica com assinalável relevo pelo menos entre abril e outubro, desde que as condições do mar assim o permitam. É sobretudo durante a época balnear que a sua componente também cultural, assume particular relevo turístico, com autênticas multidões atraídas, não só pela curiosidade do tipo de peixe que vem no “saco” das redes. Mas também pelo cenário proporcionado pelo património secular, que representa esta arte de pesca no litoral português, em que esteve na origem de muitos dos povoados, que ainda são a alma desta característica pesca de arrasto, como é o caso de Espinho, em que a “arte xávega” sobrevive e da qual ainda dependem muitas famílias.
Foi num destes momentos de faina, que registámos em finais de agosto último, o trabalho dos pescadores das companhas, na altura em atividade, como os barcos “Vamos Andando” e “Rita e Carolina”, que se movimentavam num areal adaptado naturalmente a uma espécie de “palco” para um cenário verdadeiramente cinematográfico, em que os barcos entram e voltam do mar ali mais quebrado, pela “muralha” de pedra (esporão ao sul), bem junto dos bairros dos pescadores, e das suas vivências sociais no âmbito desta arte de procurar o ganha-pão no mar.
A multidão de curiosos, banhistas e turistas, formavam um cenário envolvente como “figurantes” de um “guião”, que nesta praia e nesta comunidade piscatória, captaria toda uma envolvência humana em que se destacam rostos marcados pela dureza deste trabalho, dependentes dos caprichos do mar, que logo se percebe alterações faciais dos homens e mulheres, que esperam e pelo seu conhecimento antecipam o resultado do seu trabalho no fundo do “saco”, quando o puxam depressa para cima para aproveitarem o possível vendável.
As operações de enrolar quilómetros de pesadas cordas, ou as redes que se vão alternando após secarem no areal da praia, neste “palco” reservado à atividade da “arte xávega”. São trabalhos repetitivos dos apetrechos que voltam a ser devidamente colocados nas embarcações, para que, durante o dia vão tentando surpreender algum cardume mais adulto, sobretudo de espécies de peixe mais rentável comercialmente. Caso contrário, as condições adversas que se repetem, como o “saco” que vimos chegar a terra, apesar do inevitável desalento, a determinação destes pescadores vai-se sobrepondo pela própria relação umbilical com este património identitário de um povo que resiste.
01out19