Luís Reina
Capítulo III
Renascidas
12 de Setembro
Abu-Dhabi / Seul
(continuação)
À minha frente estende-se uma enorme mancha negra.
Gritos eufóricos, quase histéricos, saem das bocas de centenas de coreanos que aguardam amigos, familiares e turistas.
Dísticos que se erguem quase em uníssono, parecendo uma onda de contestação. Não consigo encontrar o que indica – Nouvelles Frontieres.
Ao longe, consigo ver as francesas.
Verifico de relance, que o grupo não é tão pequeno quanto eu pensava. A recessão francesa, da qual tomei conhecimento posteriormente, não deve ser tão grande quanto dizem.
Aproximo-me. Constato que todos já sabiam quem eu era. As notícias de caserna correram depressa, como eu previa. Anne fez questão de esclarecer tudo e todos: qu’il manque le Portugais.
No total somos vinte e quatro pessoas.
Saímos do edifício. Um vento húmido e quente fustiga-nos o rosto.
Dois homens de cabelos negros como azeviche, olhos esbugalhados e nariz arrebitado mantêm-se imóveis à entrada das portas de dois pequenos autocarros de cor bege. São de baixa estatura e de uma magreza quase cadavérica. Apresentam-se-nos de fato castanho-escuro, feito de seda e de luvas brancas, apanágio dos povos do extremo oriente.
Luvas que são um acessório importante, para pessoas acima dos quarenta anos de idade, pois mais do que um adereço de moda, são usadas como protecção solar. O branco não é só a cor associada à paz, mas também é o status máximo da beleza oriental.
São os motoristas que nos vão conduzir nesta viagem ao País do Sul.
Sorriem para nós ternamente. Dialogam entre eles. Que se passará nas suas mentes onde está subjacente uma cultura distinta? Que pensarão de nós ocidentais, que invadimos o seu espaço?
Somos informados que temos de dividir-nos em dois grupos.
Dou por mim a ser literalmente empurrado por Anne, que nem me dá hipótese de escolher o grupo com quem pretendo viajar. A bagageira do autocarro, quase que inexistente, causa uma certa apreensão às pessoas. Tento decifrar os seus pensamentos. Dou uma gargalhada que só eu consigo ouvir. Estamos de férias, porquê tanta preocupação?
Rapidamente uma pirâmide colorida é feita no interior de cada um dos mini bus, fazendo uma parede intransponível entre motorista e passageiros. As pessoas respiram de alívio.
Sento-me numa nuvem de veludo azul com motivos vegetais.
Reparo no interior daquela que vai ser a minha casa ambulante durante os próximos dias. Esmeradamente limpa, encontra-se decorada com cortinas de cetim azul-turquesa, rematadas com pompons feitos de fio de seda brilhante. Não prima pelo bom gosto. Contudo, esta decoração tipicamente asiática acaba por ser reconfortante.
Olho à minha volta e tento fazer uma análise rápida a todos os meus companheiros de viagem. Sorrio. Praticamente todos os que viajam sozinhos foram escolhidos por Anne para ingressarem neste mar aconchegante. De fora ficou um flamengo que arranha muito medianamente a língua de Duras, Hugo e Yourcenar e um sábio viajante de cabelos brancos, fotógrafo, que devido às suas eternas primaveras não tem hipótese de ingresso, num mundo quase todo feito no feminino.
Uma cara de boneca, feita de porcelana branca, com cabelos ligeiramente ondulados, olhos doces como mel e lábios finos, exageradamente pintados de vermelho, entra no autocarro e dá-nos as boas vindas em inglês.
O medo apodera-se de todos aquelas pessoas para as quais a língua Shakespeariana não é de todo uma das suas mais-valias. Ficam contudo aliviadas, quando Antoine, o benjamim do grupo traduz à letra a informação prestada. A senhora está a substituir aquele que será o nosso guia durante todo o circuito e que se encontra temporariamente com uma maleita imprevista. Vim a saber mais tarde tratar-se da proprietária do operador turístico coreano a quem a agência francesa comprou os seus serviços.
Elege, sem direito a veto, Antoine como o seu tradutor oficial. Divirto-me com a situação constrangedora com que o ruivo francês, que ali se encontra para curar um desenlace de seis anos de intensa paixão, se depara.
Fala num tom exageradamente eufórico e rápido.
Informa-nos que a cidade de Seul se encontra edificada sobre as encostas e vales formados por oito verdejantes montanhas. É atravessada pelo rio Han que a divide na zona norte onde se encontra o centro histórico e a grande maior parte das atracções culturais e turísticas da capital coreana, e na zona sul onde fica situada a Assembleia Nacional, vulgo Parlamento Coreano, a zona financeira e de negócios do país e toda a área desportiva construída para as olimpíadas de grande memória para os portugueses, pois foi aqui que se sagrou campeã olímpica da maratona – Rosa Mota.
O discurso continua infindável. Fala-nos das características fisionómicas que distinguem este povo dos seus eternos rivais chineses e japoneses, economia, religião, turismo e um sem número de outros temas que fazem com que a partir de certa altura a deixe de escutar.
Olho pelo vidro esfumado da janela a paisagem urbana.
A sua cor cinzenta escurece ainda mais o tempo de chuva que nos espera na “Cidade Capital”.
Os prédios brotam da terra como cogumelos. Erguem-se como agulhas para o céu. Fazemos quilómetros sempre em linha recta. Recta que nos parece infinita pois já ninguém suporta mais ouvir a voz de fundo da nossa guia improvisada.
Quase trinta minutos de cansaço auditivo para que Seul nos receba com uns raios de sol dourado e quente, cobrindo o rio cinzento com uma patine de ouro, intensa e luminosa, que nos deixa extasiados perante tanta beleza.
À nossa frente o edifício neoclássico do Parlamento. Mais parece uma cópia do Capitólio americano.
Não me atrai. Estava à espera de algo mais original e mesmo de uma arquitectura mais oriental, apesar de saber da americanização da sociedade sul coreana.
O mini bus faz uma autêntica gincana através das ruas estreitas que nos conduzem ao nosso hotel. Reparo que todas elas estão bordejadas de árvores. A limpeza é total.
O autocarro pára em frente de uma pequena escadaria.
No cimo ergue-se imponente um enorme paralelepípedo vertical de cores neutras e terra, de seu nome Yoido.
Enfim chegamos.
A aventura vai começar.
(a continuar)
Obs: A pedido do autor, e ao abrigo do 5.º ponto do Estatuto Editorial do “Etc e Tal Jornal”, este artigo foi escrito de acordo com a antiga ortografia.
01-abr-14
Obrigado minha amiga. Mas para ti não vai um abreijo mas sim um beijo enorme do tamanho do mundo.
Sempre a deliciar-nos com relatos maravilhosos.
Abreijos que é uma palavra tua
Clara
Obrigado Manuel. Sempre a dar histórias de um mundo que não sabemos que existe.
SEMPRE COM A CAPACIDADE DE NOS FAZER VIAJAR MESMO PARADOS, ABRAÇO
Elvira minha querida, é para pessoas como tu, sempre atentas a participativas nas minhas lides artísticas que eu trabalho.
Sem dúvida sempre uma pessoa com um comentário que nos dá animo para continuar.
Viajar seja ele o acto físico de…ou de transmitir por palavras sensações e experiências vividas é das coisas mais bonitas que tive a felicidade de experimentar em tão pouco tempo.
Espero que continues a ler estes meus relatos.
Bjinho grande
Obrigado Carlos pelas palavras de incentivo que são sempre tão importantes.
Eu diria mais. Viajar é a maneira mais agradável de amadurecimento humano.
Abraço
Olá Luís!
Com a tua paixão pelas viagens e pela escrita,consegues transmitir-nos todos os detalhes relativos a cada dia.
És fantástico.
Bjs.
Agradeço mais esta viagem cheia de aventuras e exotismo. O texto é revelador que viajar se traduz no alargamento de horizontes, é conhecer novos costumes e realidades, é aprender, e também é sonhar.
Espero pelos próximo capítulos.
Obrigado Carlinha. é bom ter leitoras como tu. E a viagem começou para todos os efeitos. Bj.
…. a aventura vai começar…
não vale assim vou ter k esperra
adorei
como sempre fazes-me voar e fechando os olhos imagineime a percorrer e fazendo essa viagem cntg
bjnhss