A Câmara Municipal do Porto (CMP), em “parceria” com a Direção Regional de Ensino do Norte (DREN), e cumprindo a Carta Educativa de 2011, vai encerrar seis jardins-de-infância públicos, destinados a crianças dos três aos cinco anos, transferindo-as, já no próximo mês de setembro, para escolas do ensino básico (EB).
Se esta medida foi, pacificamente aceite, em, praticamente, todas as freguesias afetadas pela decisão, a verdade, é que o mesmo não aconteceu no Bonfim, onde, pais, encarregados de educação, e ainda um considerável leque de autarcas, condenaram a medida camarária – que levará ao encerramento do Jardim-de-Infância situado na rua Agostinho Jesus e Sousa, e consequente transferência das crianças para a EB1 Fernão de Magalhães (no outro lado da artéria) -, assim como o facto do executivo da Junta de Freguesia ter, alegadamente, sonegado a decisão.
O Jardim de Infância do Bonfim tem cerca de 100 crianças, dos três aos cinco anos – as tais que vão ser transferidas -, e mais 20, dos zero aos dois anos. Lá trabalham quatro educadoras do Ministério da Educação e Ciência (MEC), que, segundo sabe o “Etc e Tal”, foram “convidadas” a aceitar um contrato para “mobilidade interna”, e ainda quatro auxiliares e uma cozinheira.
Este espaço encontra-se em atividade há 34 anos, e é elogiado pelo facto de ter excelentes condições (salas espaçosas com luz direta; refeitório e copa), sendo de destacar a área em que está inserido (zona verde).
Contestações
Em concorrida Assembleia de Freguesia (o salão nobre da Junta de Freguesia do Bonfim estava a arrebentar pelas costuras), realizada no passado dia 18 de julho, o executivo social-democrata, presidido por Armindo Teixeira, foi confrontado, pela oposição, com o encerramento do Jardim-de-Infância e pelo facto de não ter avisado, atempadamente, a Assembleia, assim como todos os interessados, realçando-se os pais e os encarregados de educação das crianças a serem transferidas.
O presidente contra-atacou, dizendo, na altura, não ter tido, por parte da CMP, qualquer tipo de informação nesse sentido, isto pelo menos até à data das matrículas (09-jul-12).
“Se soubéssemos da transferência das crianças para a EB1 de Fernão de Magalhães, não teríamos, há três meses, investido dinheiro na colocação de precianas metálicas contra qualquer tipo de tentativa de assalto”, disse.
A explicação não foi, pelos vistos, convincente, tendo a oposição o acusado de nada ter feito junto da edilidade para que o processo fosse suspenso.
Independentemente dessas reações, Armindo Teixeira considerou que a Escola EB1 Fernão de Magalhães “é mais segura que o infantário”, por se tratar de uma construção de raiz (edificado) e o atual jardim-de-infância tratar-se de um pré-fabricado.
Um pré-fabricado que, contudo, “poderá servir”, segundo o presidente da autarquia bonfinense, para “a instalação de um berçário”, palavras que originaram incómodo entre as largas dezenas de pessoas presentes.
Líder da bancada social-democrata demite-se do partido
A verdade é que a “Carta Educativa do Município” data de 2011, e era do conhecimento público. Esse foi só um dos motivos que levou a veemente contestação por parte da oposição e ainda do líder da bancada social-democrata e antigo presidente da autarquia, José Lachado, que, entretanto, desfiliou-se do PSD, tornando-se, agora, deputado independente.
“Estamos, em meu entender, perante o início de um processo de esvaziamento de todas as valências que o Bonfim possui, criadas nos últimos 25 anos do século passado, com o esforço e determinação de anteriores executivos e a dedicação de muitos funcionários desta autarquia, onde se sobrepõem medidas meramente administrativas e economicistas, em detrimento das pedagógicas e sociais”, começou por referir José Lachado.
Salientando o facto de que a Junta “era conhecedora da situação há mais de um ano”, o deputado, na altura ainda do PSD, disse ainda que o “Bonfim entregou de mão-beijada as valências sociais de excelência, os funcionários, as crianças e etc., como se de um fardo pesado e incómodo se tratassem. Perdeu-se mais uma oportunidade para se mostrar que esta freguesia tem pessoas com personalidade, competentes e capazes de lutar pelo bem comum, mesmo que, à partida, se adivinhasse que esta seria uma batalha difícil”.
“O fator economicista do pelouro da Educação da CMP e da DREN, sem opinião firme da Junta”, continuou, “tiveram mais peso que o bem-estar das crianças do Jardim-de-Infância e da própria EB1. Não houve o cuidado de perceber o quanto de prejudicial é, para a formação das crianças, a junção numa turma de vários níveis de escolaridade, numa escola sem condições apropriadas e que necessitará ded obras de adaptação à nova realidade”.
Rematando, José Lachado lançou um forte ataque ao executivo: “Esta Assembleia não pode ser, constantemente, a caixa de ressonância de más políticas e de quem não tem valores, nem o mínimo de consideração pela freguesia do Bonfim no seu todo. A justificação, de alguns, é para se ter paciência porque, quem decide tem problemas tem problemas do foro neurológico, não pode ser vitalícia”.
Era o pronúncio da sua demissão de militante do PSD.
CDU apresenta Proposta de Recomendação
Na referida Assembleia de Freguesia, a CDU apresentou uma Proposta de Recomendação, que acabou por ser chumbada pelo voto de qualidade da Presidente da Mesa, depois de se ter verificado um empate na votação (09: PSD-CDS – contra; 09: BE, CDU,PS e José Lachado(PSD) – a favor).
A CDU recomendou à Assembleia de Freguesia do Bonfim, que efetuasse as “diligências necessárias” para que fosse “suspensa, por um ano letivo, a decisão de transferência das atividades do Jardim de Infância, relacionadas com as crianças dos três aos cinco anos para a EB1 de Fernão de Magalhães”.
Para a coligação PCP/PEV era necessário “proceder à auscultação de todas as partes interessadas face ao processo de encerramento do referido espaço, nomeadamente, os pais das crianças”, sugerindo ainda “dar o tempo necessário à realização das obras de adaptação da Escola EB1 Fernão de Magalhães, de forma a garantir instalações e condições às crianças a serem transferidas”.
A CDU defendeu também “garantir a estabilidade no acompanhamento e projeto educativo das crianças, nomeadamente através da manutenção das atuais educadoras e respetivo pessoal auxiliar, assim como o da manutenção dos serviços atuais do Jardim-de-Infância, designadamente, ao nível dos horários de funcionamento”.
PS e Bloco de Esquerda não poupam executivo da Junta e Câmara Municipal
O Partido Socialista, que aprovou a Proposta de Recomendação da CDU, também não deixou de criticar o executivo PSD-CDS quanto à extinção do infantário da freguesia, no que concerne às salas destinadas a crianças dos três aos cinco anos.
Posteriormente, à data da referida Assembleia de Freguesia do Bonfim, e devido a ausência no referido ato, falamos com Henrique Costa Teixeira, líder da bancada do PS, considerando o deputado socialista, que “todo este processo envolveu muitos disparates”.
“Os pais e encarregados de educação, assim como os deputados da Assembleia de Freguesia, deveriam ter sido informados, a tempo e horas, pelo executivo da Junta, da decisão camarária, para o mesmo ter conhecimento das nossas posições”.
De acordo com o líder do PS-Bonfim, “o executivo da Junta de Freguesia do Bonfim teve uma enorme falta de sensibilidade para com as pessoas e para com as crianças”.
“Com esta transferência, imposta pela Câmara, terão de ser efetuadas importantes obras de adaptação no interior da escola EB1 de Fernão de Magalhães que, duvido, estejam prontas a tempo do início do novo ano letivo marcado para o próximo mês de setembro”.
Henrique Costa Teixeira que se vai inteirar mais ao pormenor sobre todo este processo, diz-se também “preocupado com “o futuro dos funcionários”, acusando a Câmara Municipal do Porto de “ligeireza política” neste processo de extinção de jardins-de-infância.“
O Bloco de Esquerda, por intermédio da deputada Maria Rodrigues, manifestou também a sua oposição ao encerramento do Jardim-de-Infância, referindo tratar-se “da extinção de serviços sociais de qualidade, cuja criação resultou de esforços de anteriores executivos, cuja a eficiência, as famílias dos bonfinenses bem podem comprovar”.
Pais e encarregados de educação manifestam-se junto à Câmara
Entretanto, os pais e encarregados de educação dos alunos do Jardim-de-Infância do Bonfim, manifestaram-se nas traseiras da Câmara Municipal do Porto contra o encerramento do estabelecimento.
Em declarações à agência Lusa, Dulcineia Pinto, encarregada de educação de um aluno, disse que “os pais foram informados já depois da época das matrículas”.
“As crianças vão para uma escola que ainda não tem condições para o pré-escolar”.
Na assembleia municipal, e ainda segundo a Lusa, Valter Ramos, interveio para se declarar “indignado” com a transferência anunciada para uma escola que diz não ter condições, nomeadamente espaços e sanitários apropriados para crianças.
Os pais receiam que não se realizem em Agosto as obras previstas para a escola, afirmando haver notícias referindo que podem, afinal, começar apenas “em dezembro”.
Estranhos “encerramentos”
Se, no Bonfim, o processo de encerramento do Jardim-de-Infância não foi pacífico, já em outras freguesias a “coisa” foi tratada sem grandes alaridos ou contestações.
Refira-se que além do espaço sediado no Bonfim, mais outros cinco serão encerrados, com as crianças dos três aos cinco anos a serem transferidas para escolas do Ensino Básico, já no próximo mês de setembro.
Encerrarão, assim, além do exemplo anteriormente referido, os jardins-de-infância situados nas seguintes artérias: “Vasco da Gama” (Ramalde), “Angola” (Aldoar), “Padre Luís Cabral (Foz do Douro); “Águas Férreas” (Cedofeita) e “João das Regras (Santo Ildefonso), sendo as crianças transferidas para a EB1 Fernão de Magalhães, no caso do Bonfim, e, pela ordem anterior, EB das Campinas, Fonte da Moura, Paulo da Gama, Bom Pastor e Fontinha.
Quando começarão as obras nos estabelecimentos que delas necessitam, e quando as mesmas estarão prontas? Isso é algo que ainda se desconhece, faltando pouco mais de um mês para o início do novo ano letivo.
Por mais estranho que possa parecer todos os jardins-de-infância que serão encerrados, excetuando Ramalde, encontram-se sediados em freguesias que, através das propostas de PSD e CDS, vão ser extintas como autarquias (ler peça em “Destaque”, aqui no “Etc e Tal”) de a cordo com a Reforma Administrativa para o concelho do Porto.
Falta agora saber se este “esventrar de valências” se estender-se-á aos centros de convívio para idosos… transferindo-os não se sabe bem para onde, mas, possivelmente, para certas, e determinadas IPSS (Instituição Privada de Segurança Social).
Texto: José Gonçalves
Fotos: Hugo Sousa