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Maria Manuela Mendes da Silva: “Neste país, não há verbas de apoio às Artes. É uma tristeza! Ou somos nós a avançar, ou, caso contrário… nada feito!”

 

Pintora. A artista que respira pintura. Pintora que se zanga com a tela e que abraçou amando o Ensino. Senhora de desafios, tantos ou mais, que os criados pelas dezenas de exposições individuais já realizadas a nível nacional e internacional. Sente-se vida no seu ateliê, sediado na portuense freguesia do Bonfim, precisamente onde nasceu há 65 anos. Maria Manuela é artista de trato fácil. Gosta de falar, colocando a família nos píncaros da Lua e os que já partiram – também artistas – num cantinho especial do coração. Ensinar e Pintar são dois verbos que lhe dão razão de ser. É por estas e por outras que não há crise que abale esta Mulher orgulhosamente tripeira, senhora do seu nariz e amiga dos amigos. Uma grande artista!

 

manuela pintora 01 - 01abr13

 

 Quem é a pintora Maria Manuela Mendes da Silva?

“A Maria Manuela Mendes da Silva tem um nome muito comprido, pois acresce ainda Bastos Barrancos Fernandes, mas quando ela começou a expor assinou só Maria Manuela. Vou no 31.º ano de exposições individuais. Sou natural, com muito orgulho, da freguesia do Bonfim, no Porto, onde nasci há 65 anos.”

 

Sei que foi professora de Educação Visual…

“E não só! Professora sim, e desde 1971. Comecei na, então, Escola Comercial e Industrial de Gondomar a dar aulas a alunos que eram quase da minha idade. Dei aulas de Desenho, onde me iniciei, e também de Formação Feminina. Estive lá cinco anos a lecionar. Depois houve o 25 de Abril… abriu-se um leque completamente diferente, e, então, fui, aí sim, dar aulas de Educação Visual para o ciclo preparatório.”

 

Começou por algum estabelecimento de ensino aqui no Porto?

“Sim. Fiz o meu estágio na Escola Ramalho Ortigão. Estive lá cinco anos. Dei aulas. Foi um estágio diversificado e enriquecedor. Depois para ficar efetiva concorri e consegui, num concurso plurianual, ter com o meu lugar cativo durante dois anos.

O que é que me aconteceu? Tive a segunda melhor nota do país. Fui colocada na primeira fase, mas mandada para longe. Fui colocada em Marco de Canaveses.

Na altura já tinha família … dois filhos. E perguntei-me: agora como é que vai ser? Para ir e vir todos os dias era bastante complicado! Fui lá, pensei duas vezes, conversei com a minha mãe, que também era professora, e com uma pessoa amiga, acabando por saber que havia um concurso para a escola do Magistério Primário em Penafiel e no Porto, Como tinha notas boas e alguns anos de serviço, concorri esperando ficar no Porto, mas não, fui para Penafiel. E gostei muito. Por lá fiquei cinco anos.”

 

 

manuela pintora 08 - 01abr13

 

 Penafiel: um marco na carreira letiva

 

Penafiel, mesmo aqui à porta, é uma terra especial, tem características muito próprias…

“Sim. Para lá fui formar professores primários na área de expressão e comunicação visual e expressão plástica. Cheguei e perguntei ao diretor: então qual é o programa? O programa, respondeu-me, é a Manuela que o vai fazer. Não vai só dar estas aulas! Vai dar formação aos professores e vai ser orientadora de estágio. Logo uma coisa que não queria ser e que acabei por aceitar à força. Mas, foi muito bom, porque foi uma experiência com a qual fiquei surpreendida. Correu muito bem!”

 

Surpreendida com quê?

“Porque acabei por ser muito feliz. Tive que formar professores primários, desenvolvendo um programa relacionado com as artes plásticas ou com técnicas de expressão plástica, isto para alunos virados para a escola primária, e outros para educadores de infância. Tive que dar a conhecer aos meus alunos – futuros professores e futuros educadores -, técnicas diferentes, mas tudo resultou muito bem.”

 

 “Tele-Escola”: um novo desafio

 

As coisas, não ficaram por aqui?!

“Não. Quando a Escola do Magistério de Penafiel terminou, estive para concorrer à Escola Portuguesa de Educação do Porto, mas, entretanto, surgiu-me um convite para dar aulas na Tele-Escola. Portanto, está a ver por quantas diversidades de ensino passei. Mas, como sou uma mulher de desafios, aceitei o convite da “Tele-Escola”.

 

Por certo, algo de muito diferente.

“Uma coisa tão diferente quanto interessante. Tínhamos quinze minutos de emissão, parecia que aquilo era muito fácil, mas… nada disso!”

 

Era quase como uma internet da altura, salvaguardando as abissais diferenças?!

“Exatamente. Foi muito giro, porque tive que gravar. Nunca tinha tido tal experiência. Tive que fazer um guião. Tive que prepara as aulas/programas juntamente com o colega realizador…”

 

Isto na RTP-Porto?

“Sim.”

 

Onde gravam aulas para transmitir para a província, ou melhor, para os lugares mais recônditos de Portugal…

“E não só. Também para as cidades e lugares do litoral. Isso, infelizmente, perdeu-se.”

 

Estava, na TV, quase como que a falar para o “boneco”, ao contrário do que acontece no contacto-direto com os alunos numa sala de aula.

“Completamente. Tinha de estar a explicar o que era a Educação Visual, os seus objetivos. E ainda tinha de me lembrar que, ao dar a aula, a mesma ia abranger alunos do interior e do litoral. Depois, fiz apoios de formação ainda na Tele-Escola, e fui dar ações presenciais por todo o país. Tive, assim, de formar, a nível de técnica, pessoas mais velhas do que eu a trabalharem as tais técnicas, as quais, depois iriam, aplicar aos seus alunos: umas mais simples para os educadores de infância, e outras mais elaboradas para os “alunos” destinados a lecionar na primária. Tudo isto foi muito enriquecedor.

Depois, e após alguns problemas particulares, voltei a concorrer ao ensino e, então, fui dar Educação Visual e acabei por parar onde comecei: em Gondomar, mais concretamente, a Fânzeres. E foi aí que terminei a minha carreira como professora.

 

manuela pintora 02 - 01abr13

 

“Neste momento, a situação do Ensino em Portugal é caótica!”

 

Antes de partirmos para a Mana Manuela pintora, qual é a opinião da Maria Manuela professora – ainda que “ex”, mas sempre professora – do atual estado em que se encontra o Ensino em Portugal?

“Acho que está muito, muito mal! Quando eu deixei o Ensino as coisas já não estavam lá muito bem, mas, neste momento, a situação é caótica! Pelo contacto que tenho com colegas, ou ex-colegas, há muito desânimo! É stressante e triste ver que se está a perder o caminho do futuro, ou seja, o respeito pelo professor e pela qualidade do Ensino que forma pessoas”.

 

Os professores já vão como que ao empurrão para as escolas. Já não vão com o entusiasmo que iam antigamente. É verdade?

“Sim. O entusiasmo que se tinha, perdeu-se! Agora, as pessoas que contacto ou que me contactam, só dizem que se querem ir embora; que já não suportam a situação. Refiro-me a pessoas com um nível bom e que tinham grande entusiasmo pela profissão.”

 

“Sempre gostei de pintar e dar aulas. Não fui influenciada diretamente por ninguém!”

 

E eis que, depois desta vida dedicada ao Ensino, ou no meio desta vida dedicada ao Ensino, aparece a Maria Manuel pintora. Como, e quando, é que surge o “bichinho” por essa específica arte?

“Esse “bichinho” traduz-se em genes. São os genes! O meu avô, Mendes da Silva, que aqui perto viveu e na casa dele nasci, fazia restauros e, em termos de pintura, “noturnos” do Porto, “flores”, “rosas”, como também azulejos – uns estão na Igreja de Massarelos, ali à beira-rio, junto ao Cais das Pedras (Porto).E tinha o meu pai, José Bastos, também pintor de arte, aguarelista, e não só. O meu pai foi um autodidata…

 

Naïf?

“Não. Era um “documental gestual” com traço muito forte no desenho e muito bom na aguarela e não só, porque também tinha “óleos”, e uma capacidade e simplicidade muito grande. Foi um grande homem! Um grande homem como o meu avô, mas completamente diferente. Posso-lhe contar um caso interessante:

Eu pintava muito, mesmo antes de entrar para as Belas Artes. Nunca ninguém me empurrou… eu quis ser sempre pintora e professora. Já estava traçado. Estava cá dentro. Portanto, não tive influências de ninguém diretamente.

Começo então a pintar. Houve uma altura em que já dava aulas e tinha os meus três filhos. Tinha aqui o material e repartia-o com eles para os manter entretidos. O João, que é o do “meio” resolveu seguir outra área: neste momento está na TAP; o mais velho – Luís Miguel – está a trabalhar em Tóquio, e a mais nova, a Luísa, em arquitetura.

 

Outras pinturas…

Outros voos (risos). Portanto, na altura, estava a iniciar a minha carreira artística e eu pedi a opinião ao meu avô, como ao meu pai, quanto à possibilidade de expor os meus trabalhos. O meu avô foi disse-me logo: então do que é que estás à espera!? Deves é já marcar o salão! Enquanto que o meu pai foi mais cauteloso: Tu tens uma responsabilidade muito grande. Fizeste as Belas Artes, tens três filhos e deves pensar!

E, pronto, fiquei no meio. O meu avô tinha um espírito aberto, enquanto que o meu pai um sentido de maior responsabilidade. Mas, acabei por marcar uma sala e fiz a minha primeira exposição individual a 11 de novembro de 1982. Antes já tinha participado em algumas “coletivas”, mas essa era a primeira exposição individual.”

 

manuela pintora 03 - 01abr13

 

Uma responsabilidade acrescida…

“Exatamente. E daí aparecer só o “M. Manuela” na assinatura dos meus trabalhos. Por quê? Porque quis que quem fosse fazer uma visita à exposição – que se realizou num dos salões do Ateneu Comercial do Porto -, não associasse o “Mendes da Silva” aos meus familiares. Era o “Ela é filha de…” a responsabilidade de “ser filha e neta de…” Cada um reage à sua maneira, eu reagi assim, e foi assim que eu apareci. Só ao fim de muitos anos, e foi com o Agostinho Santos, que é do JN”…”

 

Foi meu camarada no “Primeiro de Janeiro”.

“Então, ele perguntou-me porque é que não assinava com Mendes da Silva, isto já depois do meu avô ter falecido. Pensei. Ficou um nome um tanto ou quanto extenso, mas acabei por começar a assinar os meus trabalhos com Maria Manuela Mendes da Silva, e até porque, nessa altura, o meu percurso já estava feito”.

 

manuela pintora 04 - 01abr13

 

Trabalhos com projeção internacional

 

Trabalha com quê? Quais são as suas técnicas?

“Nas Belas Artes experimentei muitas técnicas, mas quando comecei, e tinha os meus filhos pequeninos, usei o pastel seco. Depois passei para a aguarela e fiz óleos. A minha primeira exposição de pintura foi só a óleo sobre tela. Na segunda, já aparecem óleos e aguarelas e, durante vários anos, foram sempre exposições a óleo”.

 

E já lá vão trinta e uma. Só em Portugal ou também no estrangeiro?

“Neste momento tenho trabalhos expostos em Paris, Bruxelas e foi uma divulgação para Amesterdão. Tenho também trabalhos representados no Dubai, através da Galeria “AP’ Arte”, em Miguel Bombarda, da qual eu pertenço como artista, e que, numa das exposições individuais que lá fiz, reconheceu o meu trabalho. A partir daí, têm surgido boas oportunidades, e essa do Dubai foi uma delas”.

 

E em Portugal? É no Porto que centra mais a sua atividade?

“Centra-se, na realidade, mais aqui no Porto, tirando o que acontece por aí fora. Tenho muitos convites para ir para outros lados, mas ainda falta decidir. Fiz também exposições em Penafiel…”

 

“Há barreiras para um artista se afirmar no mundo da cultura em Portugal”

 

Tem alguma exposição patente neste momento cá pela região?

“Neste momento estou numa exposição coletiva, na Galeria “AP’Arte”, em Miguel Bombarda, aqui no Porto, que estará patente até ao dia 13 de abril, e onde estou junto ao meu mestre Júlio Resende, e a meu lado Noronha da Costa, Carlos Carreira, Nadir Afonso, Júlio Pomar, Manuel Cargaleiro, entre muitos outros. São muitos e bastante importantes. Saiba que esta coletiva é comemorativa do terceiro aniversário da “AP’Arte”.

 

É fácil, por mais que o artista tenha qualidade – como é o caso – , afirmar-se no mundo da cultura em Portugal, ou há barreiras?

“Há barreiras! Não é fácil. Também é preciso sorte.  É preciso o momento certo e, nesse momento, aparecerem, à hora certas, as pessoas certas para nos convidarem. Depois, há que saber dizer “sim” e dizer “não”. Já deixei fugir outras oportunidades, mas a pessoa tem de optar.”

 

Mas o artista também leva com uns “não” de quando em vez…

“O artistas em geral… sim. Eu, até agora, não! Tenho muitos convites e, como tal, vou adiando respostas. Neste momento já tenho que selecionar os convites.”

 

“Apesar da crise, há no Porto, uma atividade cultural interessante”

 

Corrija-me se estiver enganado: neste momento há cada vez mais espaços de qualidade para exposições no Porto cidade, concelho e distrito. Estão a abrir-se galerias e parece haver uma certa e crescente dinâmica neste setor, independentemente, da crise que desgraça o país. É verdade?

“Felizmente. Acho que sim! Apesar da crise há uma atividade cultural interessante. Há espaços que abrem que não sei se são duradouros ou não… sei é que eles estão abertos e alguns deles de qualidade. Já agora, deixe-me dizer que também tive trabalhos expostos em Lisboa, na Sociedade Nacional de Belas Artes. Este ano nada mandei, mas está, neste momento, uma grande exposição antológica de Jaime Silva, que é um amigo meu, representando trabalhos de 1966 até agora, e que por lá estará até ao dia 27 de abril.”

 

Temos bons artistas em Portugal? Refiro-me a pintura, obviamente.

“Acho que sim.”

 

Uns têm o nome que todos conhecemos, mas outros, com trabalhos de qualidade, não são tão projetados por quê?

“Isso também gostava de saber. O meio, como disse há bocado, não é fácil. Há muita concorrência…”

 

manuela pintora 05 - 01abr13

 

“Quando há uma total entrega e responsabilidade no trabalho não há que ter medo da concorrência”

 

Já agora, as “coletivas” não serão, por si só, o centro nevrálgico da concorrência?

“Pode ser. Há tempos no “Porto Canal” também me perguntaram se eu achava importante as “coletivas”, e disse que sim, e disse que sim, porque dá para comparar, e eu gosto. Quando há uma entrega total e responsabilidade no trabalho que se faz não há que ter medo. Eu, por exemplo, pinto com coração e alma e depois há todo um trabalho por trás, da técnica que fui desenvolvendo ao longo destes anos todos, e que quando mais se trabalhar as coisas melhor saem. …”

 

É exigente para consigo própria?

“Sem dúvida. Eu com as telas? Viro-as ao contrário, encosto-as à parede, fico parada, depois retomo outra vez ao trabalho… Isso acontece com todos os artistas.”

 

E os jovens? Acha que eles se interessam por esta arte específica, ou não? Até porque hoje o mundo oferece outros caminhos e, assim sendo, outras opções.

“Exatamente. Pelo contacto que tenho tido, aquando das inaugurações das exposições na Miguel Bombarda, alguns aparecem em grupos… é uma grande invasão. E aquilo éinteressante. Eles tiraram logo fotografias, ou seja, há um entusiasmo muito grande. Portanto, esse entusiasmo é evidente nos jovens. Agora, o que é lhes vai suceder um dia? Não sei. Não sei se vão continuar com esse entusiasmo? Se vão ficar por cá? Se vão para fora. Não sei.”

 

manuela pintora 06 - 01abr13

 

“Mesmo em época de crise, os trabalhos que melhor se vendem são os mais caros”

 

Pois… porque, agora, a moda é a de emigrar. Mas, a pintura dá, ou não dá, dinheiro?

“No meu caso, eu não vivi só da pintura, e isto por opção, porque como tinha família achei que cá, neste país, a pintura para mim não daria o dinheiro suficiente para ter uma vida equilibrada com três filhos. Portanto optei por dar aulas e pintar. O dar dinheiro?! Depois de fazer muitas exposições, houve, na realidade, uma época boa. Neste momento, sente-se a crise, mas, por mais estranho que possa parecer, os trabalhos que melhor se vendem são os mais caros!”

 

É quase como os carros. Desculpe a analogia. Os mais baratinhos não saem do stand, enquanto que os topo de gama, ou coisa assim, registam um número crescente de vendas todos os anos…

“É como lhe digo: É preciso ter sorte e qualidade. Depois… ter um nome que tenha o seu peso…

 

Uma assinatura reconhecida?

“Sim. Noto que, pelo menos, a minha já conta. Neste contexto, a pintura pode dar algum dinheiro, mas penso que não dá para viver.”

 

“Há críticos de pintura corretos, mas ser crítico é difícil nos dias de hoje”

 

Quais são os seus artistas, pintores, de referência?

“Tenho vários. Houve muitos que me tocaram. Eu gosto de trabalhar a luz, é o meu fio condutor ainda que com temas e técnica diferentes. Quanto à sua pergunta em concreto, gosto de Turner, Monet, Van Gogh, depois há outros franceses e americanos. Mas, aquele que acho curioso e o que me tocou bastante, fazendo-me vir as lágrimas aos olhos, foi um diálogo com uma tela pequenina que vi em Nova Iorque, no Museu de Arte Moderna, do Van Gogh… com muita luz… muita força. Depois quando chego a Amesterdão, vou a uma exposição e outra vez Van Gogh e a tal pintura que tinha visto em Nova Iorque. Vieram outra vez as lágrimas aos olhos… não sei porquê. Interessante é revelar o facto que Van Gogh não vendeu. Monet vendeu, outros venderam, mas, por mais incrível que possa parecer, Van Gogh, não.”

 

Há bons críticos de pintura em Portugal?

“É uma pergunta difícil de responder. Há críticos. Eu conheço alguns e tenho a maior consideração por eles, e nos quais revejo qualidade. Mas, prefiro não referir qualquer nome, porque foram professores ou colegas, ainda que os considere belos críticos. Há, realmente, críticos corretos, que sabem o que estão a dizer, mas também acho que é difícil o papel do crítico no mundo de hoje, com a arte que se faz e com as suas variantes. Há mundos diferentes. Veja o exemplo de Serralves. É um outro mundo. Eu ainda não lá cheguei, mas também não lhes bati à porta.

O mais importante é pintar por gostar muito, e se eu gosto de um trabalho, há convites e projetos, então arranco e vou em frente! Há, sensivelmente, um ano fiz uma grande exposição na Sala Amadeu Sousa Cardoso do Museu Municipal de Espinho, e vendi trabalhos de grandes dimensões. Foi visitada por bastante gente. Para tal sucesso tive de trabalhar muito, mesmo muito. Sabe que também é preciso nós dinamizarmos as nossas próprias iniciativas, e não sermos comodistas”.

 

Vejo que, nos seus quadros, o Porto tem forte.

“Tem. Primeiro porque sou do Porto, com muito gosto. Fiz muitas exposições a convite do Clube Literário do Porto. Quando tenho esses convites vou ver os espaços e faço os trabalhos para os espaços. Faço uma exposição que tenha uma certa homogeneidade. Infelizmente, o Clube Literário do Porto fechou, porque o dono. Augusto Morais, faleceu, foi uma pena! E, então, tenho aqui alguns trabalhos que representam o Porto, porque foram dedicados ao Clube Literário, e ao Porto junto à ribeira, e que acho fantásticos. A verdade, é que durante muito tempo não pintei o Porto. Ao fim de muitos anos comecei – não sei lhe explicar porquê – a fazer Porto à minha maneira. Acho que o bom disto tudo, é que cada artista, mesmo representando a curva do rio da Ribeira, apresente trabalhos sempre diferentes uns dos outros. Aqui tenho representados alguns momentos de vários anos do Porto, em acrílicos e aguarelas. Atenção que a aguarela é muito difícil, mas aqui em Portugal não dão o devido respeito a essa técnica… consideram-na arte menor! Mas, o pintor aguarelista Jaime Isidoro, muito amigo do meu avô – faziam anos no mesmo dia – viu os meus trabalhos e deu-me os parabéns.

Nos meus trabalhos está lá sempre a luz A luz como ponto de referência. Sendo temas diferentes, sendo do Porto e outros não, a luz é um ponto de referência. Outros há que foram expostos na Sala Júlio Resende, em Gondomar, e à qual deu o nome de “ Imaginária Linha”. Fiz outras exposições com noturnos – porque o meu avô pintava muito bem noturnos – depois de desafiada para tal. Eu pintei os noturnos, mas à minha maneira.”

 

manuela pintora 07 - 01abr13

 

“A Cultura é o parente pobre da política governativa!”

 

Depois dos noturnos passa, então, radicalmente, para a cor, a luz…

“Foi uma mudança radical, sim! Tinha que respirar! Tinha que sair de uma tristeza minha! Felizmente correu bem. Depois fiz uma outra exposição, a qual considero um grande marco no meu Porto de referência como pintura. Foi no Fórum da Maia. Fiz sugestões de vários sítios… de viagens por onde passei. E lá a luz, as neblinas, que lhe dá um certo ar de mágico, de mistério. Gostei muito. Os trabalhos eram de grandes dimensões.”

 

Sente-se uma artista realizada? Se bem que, por certo, ainda muitos trabalhos venham por aí?

“Continuo a pintar. Sou uma pessoa de desafios. Estão a propor-me mais coisas…

 

Virão aí umas surpresas?

“Estou a preparar a tal surpresa que há de aparecer. Será um projeto diferente. Não se pode fazer tudo. Tenho de optar.”

 

Como mulher, como artista, como portuguesa, como tripeira, e olhando para a Cultura, ela – a Cultura – é, ou não, um parente pobre da política governativa nacional?

“Acho que sim. Nós temos que trabalhar, neste caso em pintura, dinamizando seja que projeto for relacionado com arte sem qualquer tipo de apoios…”

 

Só os mecenas?

E quando os há. Tenho estado a trabalhar. Os convites aparecem. As coisas vão andando, mas há medida que o tempo vai passando, e olhando à nossa volta, não há verbas de apoio às Artes. É uma tristeza! No meu grupo mais chegado, vamos trocando ideias, e chegamos à conclusão de que, neste país, ou somos nós próprios a ter de avançar, sem desanimar, ou, caso contrário: nada feito.”

 

Neste aspeto, o papel das autarquias é, ou não, essencial?

“É. Há boa vontade por parte das autarquias. Cedem os espaços, divulgam as iniciativas, mas com a grave situação em que vivemos, as coisas não passam de propostas sugerindo-se sempre o último passo ao autor, é um tal de “se puder…se conseguir …”

manuela pintora 09 - 01abr13

 

“Gostava de ter uma galeria, mas, neste momento, é impensável!”

 

 Já pensou em criar a sua própria galeria?

“Já”.

 

E quando é que ela vai surgir?

“Neste momento é impensável. Mas o sonho comanda a vida. O sonho é fundamental. Já tive convites para formar uma galeria, um dos quais era um projeto muito interessante, mas, neste momento; nesta altura; nesta fase da vida, no nosso país, não penso em formar uma galeria. Não é que não gostasse, mas não posso ir em frente porque olho para o tal sentido de responsabilidade que o meu pai me chamou à atenção. Temos de pensar muito bem nas coisas. Não há apoios dali, nem apoios de acolá. Como sou responsável, ou se faz uma coisa bem feita, ou, então, nada se faz”.

 

É pragmática?

“Aceito desafios! Quando eles aparecem estou pronta a ir em frente. Apesar da crise não vou pela ideia da Galeria, mas vou continuar fazer exposições por aí fora. Já tenho até convites para fora do país…”

 

manuela pintora 10 - 01abr13

 

“Não sou de esquerda, nem de direita, sou independente!”

 

Quando aparecer a oportunidade formar a galeria, então aí teremos a Maria Manuela a lutar por ela e a concretizar o seu sonho.

“Era interessante que isso acontecesse, até porque tenho um importante legado artístico, sobretudo de família – do avô, do pai e agora meu. Depois, o problema é aguentar a manutenção de uma galeria. Repare que havia galerias belíssimas e que fecharam, pura e simplesmente.”

 

Como se define ideologicamente?

“Nem de esquerda, nem de direita, sou independente. Tenho as minhas convicções, mas, perante o atual cenário, considero-me independente”.

 

Exposição individual em Paris é para breve

 

Falou, há pouco, em convites do estrangeiro. Quais são?

“Por intermédio da dr.ª Manuela Aguiar e com a dr.ª Nassalete Miranda, diretora do jornal “As Artes Entre As Letras”, tenho um convite para fazer uma exposição individual na Caixa Geral de Depósitos em Paris, e outra, também em Paris, mas na Sorbonne.”

 

E isto é para breve?

“Ainda nada tenho preto no branco, mas a da Sorbonne será, em princípio, em abril de 2013. Com a dr.ª Nassalete, que outra mulher de garra, e com a dr.º Manuela Aguiar, que nem vale a pena dizer, a dr.ª Leonor, que é a nova vereadora do pelouro da Cultura da Câmara Municipal de Espinho, que é uma pessoa muito dinâmica, estou, com certeza, muito bem acompanhada”.

 

Se calhar esteve sempre muito bem acompanhada, quanto mais não seja por si própria.

“Sem dúvida. Acho até que é o principal. Mas, depois é a tal coisa: quando veem esses projetos e esses convites, às vezes não conseguimos sozinhos dar resposta e perdemos excelentes oportunidades… já perdi algumas. Mas, pronto, tudo tem o seu tempo”.

 

manuela pintora 11 - 01abr13

 

“A minha vida é a luta com a tela”

 

Quer acrescentar algo mais de relevante a esta entrevista?

“Para mim a pintura é quase tão importante como respirar. Faz parte do meu ser. Faz parte da minha vida desde muito pequenina. Não deixo passar um ou dois dias sem que venha à baila o desafio da pintura. Outra desafio que me fizeram agoira, por parte da galeria “AP’ Arte”, é um intercâmbio com trabalhos de pequena dimensão, formato postal (10×15). Está a ver: primeiro foram trabalhos com metro e meio dois metros e agora os de pequena dimensão. A minha vida é a luta com a tela, zangar-me com ela, continuar a trabalhar, sendo sempre diferente…

Saiba que gosto mais de pintar do que avaliar os quadros. Não tenho ninguém, que o faça, precisava de alguém que me ajudasse nesse aspeto, por isso é que acho que estou muito bem na galeria “AP’Arte”, porque eles é que fazem esse trabalho de avaliação.

Agora, só espero ter saúde para realizar o que venha por aí!

 

Um percurso de vida artística

Maria Manuela Mendes da Silva Bastos Barrancos Fernandes, já expos individualmente, em diversas instituições, isto desde 1982, a saber: Ateneu Comercial do Porto (1982, 1985, 1988, 1991e 1995), Escola Secundária de Penafiel (1984), Escola Secundária Alexandre Herculano (1992), Galeria da Restauração (2000), Ordem dos Médicos, Porto (2001), Europarque, Santa Maria da Feira (2003), Galeria da Livraria “Letras e Conchas”, Leça da Palmeira (2004), Galeria Artesis, V.N.Gaia (2006), Clube Literário do Porto (2006, 2007e 2008), Auditório Municipal de Gondomar (2006), Café Majestic, Porto (2008), Fórum da Maia (2008),  Galeria Ap’Arte, Porto (2011), Antiguidades Rui Laranjeira, Porto (2011), Casa Barbot, VN Gaia (2012), Museu Municipal de Espinho (2012) e Casa-Museu Teixeira Lopes, VN Gaia (2013).

Texto: José Gonçalves

Fotos: António Amen

 

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12 Comments

  1. Maria Fernandes

    Tenho 2 quadros seus de 1997 uma mulher semi nua da cintura para cima e um homem tb semi nu da cintura para cima
    Adoro-os eram do Dr Pires Lourenço,banqueiro,não sei se se lembra dele já faleceu em 2016.

  2. Odete Guerreiro

    Manuela, continuo tua fã, tua amiga e ex-colega em Fânzeres.
    Perdi o teu contato há anos. Gostaria de comunicar contigo. Mas como? Bjinhos

  3. Maria Eduarda Mendes

    Parabens.
    A paleta não pode estar parada para podermos continuar a ver os trabalhos que, a mim pessoalmewnte me fazem parar e pensar. Continua, porque as tuas obras como tu dizes têm sempre luz, muita luz, por isso continua com a garra que sempre tiveste. Mais uma vez parabens á artista e ao jornal que soube conduzir muito bem a entrevista.

  4. cristina costa

    Parabens nelinha cada vez estou mais orgulhosa de ter trabalhado para esta familia estou muito feliz de ver que pouco a pouco vai mostrando tudo o que vale lesmo nao conseguindo visualizar bem porque a dificuldade que tem para ver é muita faz sempre trabalhos divinais.
    Espero que tenha muito sucesso sao os dejesos desta eternamente amiga beijinhos

  5. Jose Fonseca

    Aprecio muito a obra da Manuela Mendes da Silva.Os seus trabalhos com uma grande mestria de composição e soberbo domínio da paleta só necessitam de maior divulgação para serem uma referência no que de bom é feito actualmente no nosso país.A entrevista dá a conhecer a pessoa por detrás do trabalho de forma que só podemos enaltecer.

  6. Luisa Amorim

    Parabéns à artista!
    É excelente ver trabalhos de qualidade e termos pessoas neste país que nos levam longe!
    Parabéns à entrevista e ao jornal.
    Felicidades e muito sucesso!

  7. Maria Helena Ferreira da Silva

    Parabens, Manuela .
    Desejo o maior sucesso, para a próxima exposição, em Paris .
    Infelizmente, neste país , o que temos de melhor, só nos chega, a partir do momento em que saímos além fronteiras.
    ASSIM SEJA.
    Beijinhos

  8. João Fernandes

    Muitos parabens
    Sem duvida uma das MELHORES ARTISTAS PORTUGUESAS.
    Excelentes trabalhos e excelente entrevista. Parabens á artista e ao Etc e Tal

  9. Madalena Soares (Lisboa)

    Não a conhecia. Estou curiosa quanto à qualidade dos seus trabalhos que, pelo que vi nesta entrevista, são muito bons. Mas gostaria de ter mais informação sua. Será que me poderá responder a este comentário e enviar-me o seu site, ou facebook? Agradecia.
    Quanto à entrevista, além de bem conduzida, revela da srº Drº uma mulher de raça e garra na vida. Gostei muito.

    (Via e-mail)

  10. Lourdes dos Anjos

    PARABÉNS, PARABÉNS , PARABÉNS MINHA AMIGA.PARABÉNS PARA A MULHER, PARA A PINTORA E PARA ESTA CORAGEM TRIPEIRA DE FALAR COM AS PALAVRAS TODAS…SEM MEIAS TINTAS, Á NOSSA MODA!PORQUE É URGENTE INCOMODAR MUITA GENTE E OLHAR OS “PODERES” BEM DE FRENTE.PARABÉNS MANUELA !

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