José Luís Montero / Tribuna Livre
Tenho algumas manias, no entanto, como são minhas, penso que são genialidades. Navego por Europa, principalmente por Itália, e vejo e revejo a mesma gritaria por todo o lado, menos na santa Alemanha que nos (des) governa através da mão benta dos governos locais. O binómio Portas-Coelho não é mais que uma espécie de caixeiro-viajante encarregado de vender as tesouras que condicionam a vida dos cidadãos. No entanto, existe uma diferença clamorosa entre os verdadeiros vendedores e este binómio: os vendedores procuram agradar e oferecer maravilhas a baixo preço e o binómio impinge produtos sem ter em conta a simpatia e as vantagens.
A outrora salvadora classe média, sinónimo de modernidade e também colchão social, foi aspirada. Desapareceu numa manhã de nevoeiro. No preciso instante em que calçava os chinelos comprados a crédito, viu que estava descalça. A rua tornou-se a sua praia. Os sapatos com as solas gastas era a marca do seu novo carro. O mundo caiu sobre a sua cabeça e a realidade aplastou os caprichos de consumo. A grande Banca aplicou a usura e dentro da sua própria usura, a quebra derivada da fraudulência. Os povos pagam. As famosas conquistas sociais deixaram de ser tal para se chamar: gorduras do Estado.
Tudo o que pode ser considerado um impedimento para esta onda avassaladora, é mau. Ganha bitola malvada e é alvo da tesoura. Pode provocar drama ou até tragédia; a realidade do cifrão substituiu a Vida. O peso da Banca diz que as aulas devem estar superpovoadas; que a Saúde é um capricho; que as reformas são um abuso e os governos de proximidade, as autarquias, devem abandonar essa ideia e transformar-se em mega instituições. O Tribunal Constitucional deixa de ser o Juiz de garantia da Carta Magna para ser uma espécie de malvado que impede dilapidar, ainda mais, os mais desfavorecidos. A Constituição estorva.
A liberdade de escolha política ganhou a garantia de não ser vinculante aos programas ou ideias; o Governo ou representantes eleitos serão governados por organismos não mancomunados que ditam as necessidades ou as pretensões dos cidadãos. A alergia social ao desproposito reinante manifesta-se com uma abstenção que fala. Realçam, então, as figuras dos independentes – na sua grande maioria não eram tal – para tapar o grande buraco da recusa a participar. Nada justifica o vulto da abstenção em grandes cidades como Lisboa e Porto a não ser o propósito de não participar no que é considerado como inútil.
Pelas ruas, cada vez mais carentes de montras vivas, deambula-se com o propósito de não ter propósito algum. Lê-se nalguma banca de jornais palavras que ferem e ofendem; ouvem-se comentários sobre as queixas de uma ministra sobre o que ganha ou deixa de ganhar e o sobrevivente, a contar pelos dedos, estupefacto, ensaia uma expressão de vulto e grossa perante semelhante hipocrisia. A realidade nunca foi tão mentida e enxovalhada nesta fase pós- 25 de Abril. A corrupção anda na boca do mundo e o mundo olha desconfiado para governantes que quando saem de um encerro, caem noutro e cada um mais sonoro que o anterior, incluída, quezília diplomática com Angola.
Chorar é drama, no entanto, os suicídios derivados da penúria que se provocou é tragédia. Famílias inteiras sem saber como amanhecerão para um novo dia. Grécia, a velha e sábia Grécia foi a primeira a padecer esse tipo de morte. Espanha, Portugal vivem o aumento de tragédias pessoais. Ver os passeios das ruas, significa ler: ”Não tenho trabalho. Tenho mulher e filhos.”. Tudo é uma enorme sirena de clamor social que denuncia, inclusivamente desde a passividade, o atroz vandalismo financeiro que subjuga nações com muita História e lenda. Ninguém está cego, nem surdo, nem mudo.
Os sindicatos do Sistema, a não ser Grécia e um bocado Itália, acomodados ao burocratismo, são incapazes de paralisar o País e lançar um enorme berro do Ipiranga. A razão de Estado da famosa dívida e a sombra do despedimento parece que os fecha e isola ainda mais do que estavam. A sua razão de ser está esquecida; não se pratica. Não só é culpado o Governo deste marmoto empobrecedor. Os defensores dos trabalhadores esqueceram-se dos defendidos e a legislação vai arrasando o que já é, em muitos casos, terra queimada.
Mas, pelas televisões, viu-se o primeiro-ministro Passos Coelho a refilar com uma cidadã que o interpelava. Falava de enxadas com arrogância. Os governantes de tão instalados no despropósito que estão, esqueceram, perderam o pudor. Mário Soares saltou novamente à praça pública e desancou até ao limite tanto ao Governo como à Presidência da República. A resposta do Presidente da República limitou-se a parecer que dizia que ele era mais educado. O fundo das questões mais que sérias levantadas pelo antigo Presidente da República ficaram sem sombra de resposta contundente como deveria ter dado à pergunta pública lançada por todo um Conselheiro de Estado.
Não, não se encontram os pés e muito menos a cabeça dos governantes que fazem as coisas ordenadamente a quem lhes ordena. Só os seus votantes, de quem são mandatários, não têm capacidade de ordenar e reclamar o que votaram e pelo qual votaram. Chega um troico e faz-lhes as contas; chega a Merkel e mostra-lhes o livrinho de gastronomia; chegam as famosas agências de catalogação e chamam-lhes lixo ou abaixo de lixo. Menos mal que não podem desprezar o Fernando Pessoa ou ignorar a Paula Rego. Este Governo tem cara de passar à história, nem que seja à história minúscula, como o Governo das capacidades; das capacidades para vergar a cabeça.
A culpa é do Sócrates, dizem…Mas, o Sócrates voltou para falar. Fala. Menciona registos de factos. Acusa. E entre tudo e tantos, resolvo adentrar-me numa mata onde os pássaros ainda não viram a reforma tocada porque nunca souberam o que isso era. Nasceram para alegrar os campos com a harmonia do seu chilreio; com a cor das suas penas; com ballet do seu esvoaçar. Os pássaros voam e mostram-me o que é alegria e a Liberdade. Mostram-me que não é necessário acumular mais do que é necessário para viver. E vendo o que vejo; prefiro ver e ouvir os pássaros.
01-nov-13
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Caro Senhor
Parabéns pela excelência do seu artigo.
AS
De facto,os cães esfaimados ladram, mas a caravana de Ali Bábá e seus muchachos, passa por entre os indigentes e as vítimas da fome. São estranhos, vindos de outras paragens,trazem a lição bem estudada, pertencem à tribo dos exploradores, não têm pátria,nem família, apenas autoridade quanto baste. As suas palavras são chicotes que estalam na alma dos mais frágeis, e rasgam as entranhas sacrificadas por muito penar.É urgente, parar esta gentalha, que na demanda da idade média, persistem no empobrecimento de um povo, que tem as fronteiras mais antigas da Europa, que foi um Império por todo o Mundo respeitado “MARE NOSTRUM”.