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A histeria do sucesso

Lúcio Garcia

Recentemente, escrevi um artigo que tinha por título: “A histeria do ódio contra Sócrates”. Se pensaram sobre este assunto e o que desde então tem vindo a lume, espero que aqueles que de mim discordaram, tenham vindo a mudar a sua opinião. Qualquer observador atento, terá tirado a conclusão que essa histeria, foi artificialmente construída no sentido desacreditar José Sócrates e o seu governo.

Recentemente, o Blogger do PSD, Fernando Moreira de Sá, deu uma entrevista à revista “Visão” onde diz, preto no branco, como foram fabricadas as notícias que desacreditavam Sócrates. Como exemplo, leia-se esta frase: ”Se deixarmos uma informação sobre o caso Freeport num perfil falso, e ele for sendo partilhado, daqui a pouco, já estão pessoas reais a fazer daquilo uma coisa do outro mundo”. Quem quiser saber a verdade não pelas minhas palavras mas pelas palavras de quem fez parte desta orquestração comandada por Miguel Relvas, pode ler a entrevista na íntegra aqui: https://docs.google.com

estado social - 01fev14

Mas isto, são águas passadas. Hoje, quem acreditou na novela que foi criada, já deve ter percebido que caiu num logro. Afinal, durante a campanha eleitoral, Sócrates bem avisou que o alvo da política deste governo seria a destruição do Estado Social e do empobrecimento do País. Esta situação passado dois anos e meio, não parece deixar dúvidas. Não consigo, no entanto, compreender como ainda tantos continuam a ir no engodo.

Afinal, ao cidadão comum o que lhe interessa defender? O seu interesse ou o interesse dos capitais privados que querem assenhorear-se dos bens públicos, como a Saúde e a Educação, ou as reformas através das Companhias de Seguros e tudo o que hoje sendo coletivo e publico e dê lucro, vai encher os bolsos dos privados?

Hoje está a construir-se de forma lenta e como agora se diz, outra narrativa. Vai construir-se uma outra histeria que já está em marcha. A ideia de que o programa da Troika e este governo, levaram a cabo um estrondoso sucesso. Há já quem considere que não vai ser necessário um outro programa cautelar ou o que lhe queiram chamar.

Como é possível tal desfaçatez? O que mudou em Portugal para melhor? Qual o critério que esteve na base do pedido à Troika, que se alterou? O que foi levado a cabo com sucesso? Apenas encontro um indicador. O equilíbrio da Balança de Transações. Realmente este melhorou. Como poderia não melhorar? Continuamos a exportar e importamos muito pouco, logo a balança equilibra-se. Mas, o que contribuiu para isso? O empobrecimento do Pais. Se não temos dinheiro para comprar nada, se a economia está a ser destruída, se não se importam matérias-primas para fabricar nada, se já não há dinheiro nem empresas, o que se esperava? Isto é um sucesso? Isto é um desastre. Um desastre que levou a um desemprego sem paralelo. Um desastre pois vão ser precisos milhões de milhões só para repor a economia ao nível em que estava há três anos atrás?

pec iv

Lembremo-nos de que o apelo para recorrermos ao FMI, partiu de todos os quadrantes, com a exceção de Sócrates e seu governo, que tentaram resistir ao máximo. A razão não foi como enganosamente se diz, Portugal estar na bancarrota, mas sim, porque Portugal começava a ter dificuldades após o chumbo do PEC IV em se financiar nos mercados. O chumbo do PEC IV, por toda a oposição e o implícito apoio do Presidente da República a uma queda do Governo fez disparar os juros no mercado internacional.

A razão “número um” apontada, foi a dívida de Portugal. A segunda, de razão interna, e mais realista, foi a de Portugal, não ter uma economia suficientemente moderna e capaz de enfrentar os desafios do futuro para criar a riqueza suficiente para nos autossustentarmos. Uma terceira, era a da necessidade de reformas na Administração Pública.

Estas, a serem resolvidas seriam de facto as principais razões que nos retirariam da tutela da Troika. Mas será que isso aconteceu? Claro que não. Nenhuma destas razões foi resolvida com sucesso.

Quanto à primeira razão os números não enganam. O rácio da dívida era de 93,2 por cento em 2010; 108,3 por cento em 2011; 123,6 pontos percentuais em 2012, sendo que no final de junho de 2013, era já de 131,4 por cento.

multimilionarios

Segundo as estimativas de economistas da Natixis, em Paris, e do Citi, em Londres, seria necessária uma taxa média anual de crescimento económico nominal entre 6,6 por cento e 8 pontos percentuais para que a dívida pública portuguesa se reduzisse até 2020 para a média atual da zona euro de pouco mais de 90 por cento do PIB, segundo se pode ler no jornal “Expresso-Economia”. O pior, é que a par deste descontrolo no aumento da dívida, ela acontece quando o Governo cortou de forma indiscriminada e sem critério visível, nos orçamentos para a Educação, na Saúde, nos ordenados da Função Publica, nas reformas, nos auxílios sociais, nos pobres.

Afinal de que valeram os sacrifícios? Acrescente-se que só nos últimos dois anos, foram retirados da Economia mais de 15.000 milhões de euros que originaram uma poupança de 2.800 milhões! Apetece dizer que andaram a gozar com a nossa cara. A incompetência, afinal já é dolo. E tudo isto para quê? Talvez porque enquanto isto aconteceu, o número de ricos cresceu de forma nunca vista em Portugal. Os multimilionários portugueses com fortunas acima dos 20 milhões de euros são já mais de 850. Em resumo neste primeiro critério, tudo falhou. Um escândalo.

investigacao cientifica

Vamos analisar o segundo critério. Este tem razões muito profundas e que se prendem fundamentalmente com a formação/escolaridade dos portugueses. Fomos um povo que, durante mais de quarenta anos, o ensino foi reservado apenas para alguns. Esse foi o tempo de Salazar. Depois de Abril, a escola abriu-se aos portugueses, abriram creches, o ensino gratuito e obrigatório alargou-se desde as primeiras letras até à chegada à Universidade, nos governos de Sócrates.

A investigação científica, e mais uma vez nos governos de Sócrates, deu um passo de gigante. O que se passa hoje? Com este governo, e seus apoiantes, fala-se já de reduzir o ensino obrigatório. O desinvestimento na Ciência e nas Universidades, dá dó. O escândalo é tão grande que recentemente o Conselho de Reitores ameaçou romper relações com o Governo de Passos. Todos os dias a Escola Pública vem sendo destruída com a complacência do Sr. Presidente da República que a jurou defender. Ora, sem conhecimento, não é possível construir o futuro. Hoje em dia, o grau de escolaridade é superior nos empregados do que nos empregadores.

Temos “patrões” a mais e empresários a menos. Assim, não é possível fazer crescer o País. Não é possível criar riqueza, e a criação de riqueza é um processo lento, não se faz de um dia para ao outro.

Quer queiram quer não, foi nos governos de Sócrates que se começou a mudar este estado de coisas. A abertura a novos mercados, o apoio às novas tecnologias, os programas de incentivos às energias renováveis que tornou Portugal um dos países mais avançados nesta matéria.

Preparou-se uma mudança de paradigma da economia portuguesa, até então assente no baixo salário e na mão-de-obra intensiva. Era e é urgente, a criação de empresas com alto valor acrescentado, com inovação tecnológica e agressividade no mercado global. É necessário construir uma nova mentalidade, não a mentalidade enganosa de que agora todos temos que ser empreendedores, mas criar o espaço para que essas empresas apareçam no mercado com gente nova e capaz de construir o Futuro.

É preciso tempo. E essa é uma razão pela qual é necessário termos uma nova governação. Um governo que entenda que tudo isto tem que passar por uma renegociação com os nossos credores. Que tudo isto passa por uma nova visão da Europa.

Não podemos continuar com este governo subserviente e que está de acordo com tudo isto, porque tudo lhes serve para levar a cabo a destruição do Estado e entregar aos privados o néctar da Nação. Não, aqui não se trata de políticas de desenvolvimento.

Essa gente ao tomar conta do que existe, apenas vai beneficiar duma transferência daquilo que é de todos para alguns. Nada de novo é criado com esta política. Apenas destruição em seu favor.

privatizações

Vejam o caso das privatizações, nem todas estavam no memorando inicial, e as que estavam deixaram de estar porque novas condições assim o determinavam. Mas o Governo recuou? Não. Estes vendedores da Pátria levaram e vão continuar a levar até ao fim a sua fanática política até alcançar o que desejam. Conseguiram eles travar o défice da República? Não, não conseguiram. O défice está descontrolado. A cada exame da Troika, passa-se por cima do inicialmente acordado, nada bate certo. Este é o governo que em Portugal bateu todos os recordes de orçamentos e orçamentos retificativos da história do País.

Quanto às reformas, não só da Administração Pública mas de qualquer outra, talvez com a exceção da Reforma do IRC, nenhuma foi levada a cabo. Não se lembram que há já mais de um ano e meio ela esteve prometida e sucessivamente adiada? Quem não se lembra da Reforma apresentada em letra garrafal de Paulo Portas, cheias de lugares comuns? Nunca nenhum governo até hoje, apresentou documento tão fraco e sem nexo. As reformas de Passos Coelho, nunca passaram de aumentos de impostos, cortes nos vencimentos, cortes nas reformas, cortes e mais cortes. Isso não é, nem nunca foi uma reforma em parte nenhuma do Mundo, nem no Zimbabué.

Mas o governo está muito satisfeito com a sua performance. Passos diz que a descida dos juros representa um aumento de confiança em Portugal. Segundo eles, êxito do Governo. Nada mais falso. Os juros estão a baixar em todo o lado, e mais do que em Portugal. Por exemplo, a Espanha, consegue empréstimos a metade dos juros de Portugal. Mas porque baixam os juros?

Quando se deu a crise de 2008, os “mercados”, perderam triliões de dólares com as falcatruas que fizeram e que todos os trabalhadores de todo o mundo, andam a pagar. Uns mais do que outros. No caso Português, pagamos mais do que os do Norte da Europa, apenas porque o Euro está mal desenhado e beneficia, sem qualquer sombra de dúvida, países como a Alemanha, a Holanda e outros, em detrimento dos Países do Sul.

Por isso são tão renitentes em serem mais solidários, estão a enriquecer à nossa custa ou pelo menos a passar o mau tempo com o sopro dos euros que escorre, dos países do sul para norte. Mas há algo mais a ter em conta. A verdade, é que os “mercados”, já recuperaram as avultadas perdas… à nossa custa. Nossa, e dos irlandeses, dos gregos, dos espanhóis, dos italianos, etc. Estivemos a ser roubados todo este tempo. Essa é a verdade.

Olli Rehn
Olli Rehn

O que nos trás esta última observação? Simples, o dinheiro já é tanto do lado dos “mercados”, que é preciso investir, o dinheiro parado não dá lucro. Ora, se o dinheiro está todo novamente do lado de lá, é preciso aplicá-lo. Como há muitos investidores a quererem aplicar os seus excedentes de dinheiro, os juros nos mercados começam a baixar. Daí que a festa que Coelho, Portas e seus “compagnous de route” fazem, nada tem a ver com um êxito da governação. Tal como pouco depois da crise, os mercados avaramente caíram sobre as dívidas soberanas de forma especulativa, agora estão a aliviar a fasquia pois há muito recuperaram o seu dinheiro. Mas à custa de quem? De todos nós.

A campanha orquestrada sobre o sucesso do Governo e a histeria que lhe vai estar adjacente já começou. A nível interno e com ajuda externa. Os interesses do Capital são bem solidários. Reparem, o Comissario Olli Rehn sai de repente em defesa deste governo a dizer que o pedido de resgate de Sócrates foi tardio. Tardio? Então não se sabia, o que pedido igual estava a fazer à Grécia? Tardio foi o apoio expresso da Europa à Grécia do qual este senhor foi conivente. Apoio esse que nunca chegou. Foi essa falta de apoio da Europa que deu origem à grande fatia de problemas com que a Europa se debate hoje. Não sabia Olli Renh que Portugal discutia e com sucesso o PEC IV com a comissão Europeia e o BCE, com o apoio de Merckel?

É preciso não ter vergonha na cara para vir agora dizer o que diz só para consumo interno e ajudar Passos.

Resta-nos a esperança de que numa próxima eleição, a narrativa e histeria que está a ser criada pelos apoiantes destas políticas, sejam castigados nas urnas por tudo o que nos fizeram, e na colaboração que prestaram aos especuladores que nos continuam a roubar, nacionais e estrangeiros.

É tempo de por cobro a esta direita mentirosa, manipuladora, vingativa, e inimiga de Portugal e dos Portugueses.

 

 

01fev14

 

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