Daniel Augusto da Cunha Faria nasceu em Baltar, Paredes, a 10 de Abril de 1971. Frequentou o curso de Teologia na Universidade Católica Portuguesa – Porto, tendo defendido a tese de licenciatura em 1996. No Seminário e na Faculdade de Teologia criou gosto por entender a poesia e dialogar com a expressão contemporânea. Licenciou-se em Estudos Portugueses na faculdade de Letras da Universidade do Porto. Durante esse período (1994 – 1998) a opção monástica criava solidez. A partir de 1990, e durante vários anos, esteve ligado à paróquia de Santa Marinha de Fornos, Marco de Canaveses…
Esculpida no granito, a poética de Daniel Faria é melodiosa. É orvalho permanente que mantém a magnólia fresca e luminosa durante o dia.
“Prometo-te a palma da minha mão para a escrita.
Cerca-a de magnólias, cerca-me.”
De gota em gota, a escrita do poeta torna a magnólia pensativa como o homem numa tarde de Outono ou numa manhã chuvosa de inverno.
“A magnólia enxerta-me nos pensamentos”.
Entrou no Seminário do Porto – esteve no Bom-Pastor (Ermesinde) – onde aprendeu a dialogar com a harmonia poética. A precocidade poética de Daniel Faria é notória. Na Escola Secundária Rodrigues de Freitas surpreendia a professora de Português com a sua sensibilidade criativa neste campo. Prosseguiu nos Seminários de Vilar e da Sé.
O Fá do Violoncelo melodia com o Si da Harpa. As suas palavras entoam no coração do homem/mulher e adormecem suavemente…
“Apagando a luz do quarto cada noite
No escuro a respirar como um clarão”
“Explicação Das Árvores e de Outros Animais” e “Homens Que São Lugares Mal Situados” foram as obras que solidificaram o peregrino do silêncio. No entanto, deixou quase pronto, um outro livro – “Dos Líquidos” – publicado após a sua morte. Daniel Faria criou enormes expectativas junto do círculo portuense que o conhecia ou com ele conviveu. A sua obra principal está reunida no volume “Poesia”, publicado em Dezembro de 2003. Posteriormente, saiu “O livro de Joaquim”.
Apesar da sua timidez natural, Daniel Faria alcançou muito cedo a maioridade na poesia portuguesa. Tocar nos seus poemas é como amanhecer ao Sol do meio-dia…
“Sei que estou em viagem na palavra que se move”
Daniel Faria é um autêntico apóstolo da natureza que através da encenação metafísica das palavras apresenta os valores da vida e aponta a morte como projeto de futuro.
“O interior do repouso
E ser faúlha onde a morte vive
E a vida rompe”
No ambiente campestre, o poeta de Baltar relata episódios marcantes da sua infância. Desenvolve imagens coloridas com elementos bíblicos. Nesse agasalho bucólico, Daniel Faria mostra a epifania da semente vocacional.
“Neste lugar transitório mantém-me mendigo”
A luminosidade poética está bem patente em Daniel Faria. (“Se acender uma luz / Não morrerei sozinho”). Os poemas surgem, mas depois “temos de aprender a enxugá-los; a dar-lhe claridade. Trazer um poema à superfície é uma experiência única” – disse numa entrevista a um diário.
“Concerto a palavra com todos os sentidos em silêncio
Restauro-a
Dou-lhe um som para que ela fale por dentro
Ilumino-a”
Ser padre diocesano ou monge de Singeverga?
Uma dúvida que Daniel Faria tentou responder na sua caminhada vocacional. Em 1994, depois de terminar o Curso de Teologia decidiu sair do Seminário Maior do Porto. Começa a frequentar a Faculdade de Letras daquela cidade… e reside na Paróquia do Marquês. Aos poucos, a opção pela “Regra de S. Bento” ganha solidez. Concluído o Curso de Letras no ano letivo de 1997/98, aproveitou esse ano para o postulantado no Mosteiro de S. Bento da Vitória. Em Outubro de 1998 iniciou em Singeverga, o noviciado, interrompido tragicamente, na noite de 2 para 3 de Junho do ano seguinte. Depois de alguns dias em estado de coma no Hospital de S. João (Porto), veio a falecer a 9 de Junho de 1999.
“Arruma as tuas alegrias
E faz as malas como se fosses emigrante”
Apesar do inesperado desaparecimento, Daniel Faria abriu janelas e mostrou as raízes do sonho.
“Não acredito que cada um tenha o seu lugar.
Acredito que cada um é um lugar para os outros”
A sua vida foi um poema tão curto mas tão rico, tão melodioso que vale a pena entrar nas suas palavras, mansa e silenciosamente, e saboreá-las de olhos fechados imaginando o sorriso do seu autor:
TENHO SAUDADES DO CALOR Ó MÃE
Tenho saudades do calor ó mãe que me penteias
Ó mãe que me cortas o cabelo — o meu cabelo
Adorna-te muito mais do que os anéis
Dá-me um pouco do teu corpo como herança
Uma porção do teu corpo glorioso — não o que já tenho —
O que em ti já contempla o que os santos vêem nos céus
Dá-me o pão do céu porque morro
Faminto, morro à míngua do alto
Tenho saudades dos caminhos quando me deixas
Em casa. Padeço tanto
Penso tanto
Canto tão alto quando calculo os corpos celestes
Ó infinita ó infinita mãe
Daniel Faria, in “Dos Líquidos”
AMO-TE NESTA IDEIA NOCTURNA DA LUZ NAS MÃOS
Amo-te nesta ideia nocturna da luz nas mãos
E quero cair em desuso
Fundir-me completamente.
Esperar o clarão da tua vinda, a estrela, o teu anjo
Os focos celestes que a candeia humana não iguala
Que os olhos da pessoa amada não fazem esquecer.
Amo tão grandemente a ideia do teu rosto que penso ver-te
Voltado para mim
Inclinado como a criança que quer voltar ao chão.
Daniel Faria
Coordenação: Maria de Lourdes dos Anjos
Fotos: Pesquisa Google
01fev14