Volvidas mais de duas décadas do desmantelamento das Oficinas da CP em Ovar, toda a área até então ao serviço de uma importante unidade de produção e manutenção das várias estruturas dos caminhos-de-ferro na zona norte, como pontes, entre outras estruturas pesadas, ficou literalmente ao abandono até aos dias de hoje, deixando como cenário deprimente numa das “portas” de entrada na cidade de Ovar, uma imagem de ruínas, que há muito vem sendo transformada num estaleiro de diversos materiais das obras que vão decorrendo na Linha do Norte, e que continuam a deixar a Estação de Ovar e sua área envolvente à margem dos investimentos que tiveram inicio em 1995.

A degradante imagem que diariamente é proporcionada aos passageiros e utentes dos caminhos-de-ferro e a quem (incluindo o turismo) passa, embarca ou desembarca na Estação da CP em Ovar, é também o estado de desmazelo com que já várias gerações de cidadãos vêm partilhando aquele espaço público nas últimas décadas, sem beneficiar de intervenção adequada ao século XXI no respeito pelo papel desempenhado no passado e no que representa no presente na mobilidade de pessoas no seu-a-dia.
Ovar abaixo do ritmo das obras na Linha do Norte
Considerada a coluna dorsal do sistema ferroviário português, entre as estações de Braço de Prata e Vila Nova de Gaia, a Linha do Norte veio beneficiando de vários projetos de renovação e modernização que passaram sobretudo pela supressão das passagens-de-nível e construção de passagens superiores ou inferiores, como aconteceu ao longo dos caminhos-de-ferro pelo concelho de Ovar, colocação de novos sistemas de sinalização eletrónica e construção de novas estações em que desaparece a figura carismática do “Chefe” de Estação, agora substituídos por sistemas de segurança eletrónica que dispensam a presença humana destes profissionais da CP, vendo-se só os operadores da venda de bilhetes, também com a “concorrência” das máquinas ao seu posto de trabalho.
Destino reservado também para os “Chefes” de Estação em Esmoriz e Ovar, que curiosamente continuam com futuro adiado, enquanto as mais recentes fases de intervenção na Linha do Norte, continuam a deixar as estações da CP de Ovar e Esmoriz esquecidas no tempo.


Os projetos de modernização da linha na última década e meia, que envolveram entre 2001 e 2004 um investimento de 460 milhões, e os investimentos de 425 milhões de euros entre 2009 e 2012 que na altura foram justificados, já não para a “modernização”, mas para a “beneficiação” com vista a “segurar pontas”, uma vez que o objetivo centrou-se na necessidade de evitar o colapso da Linha do Norte cujo congestionamento, segundo a CP, já obrigou a recusar serviços de mercadorias.
Evoluíram também para a necessidade da quadruplicação da linha nas zonas mais congestionadas, prosseguindo ao mesmo tempo o objetivo da supressão de passagens-de-nível, que na cidade de Ovar ainda ficou por resolver o caso da Ponte Nova. Um atraso que não deixa de estar relacionado com o também adiado projeto de nova estação da CP e a sempre adiada solução para uma central de camionagem para transportes urbanos, há muito estrangulados no acesso à velhinha estação de Ovar que serve as populações de concelhos vizinhos e os utentes de transporte ferroviário, nomeadamente de comboios intercidades. No entanto o projeto de quadruplicação da linha, que seria construído entre Ovar e Vila Nova de Gaia, não parece ter sido tido em linha de conta a quando do enterramento da linha em Espinho.

É perante este futuro adiado da Linha do Norte que curiosamente se encontram as estações da CP de Ovar e Esmoriz. No caso da de Ovar, com a degradante imagem de um depósito de materiais de intervenção na linha, que a Refer até hoje, ainda não colocou em prática qualquer medida que ajude pelo menos a minimizar o impacto visual de tão deprimente cenário de abandono daquele espaço envolvente da Estação. Dificuldades e falta de respostas também ao nível das áreas de estacionamento automóvel em ambas as estações.

Afinidade de Ovar com os Caminhos-de-Ferro
A relação e afinidades de Ovar com a CP/Refer é só por si um valioso património que merecia ser dignificado, pelo que representou e continua a representar como fator de progresso, mudanças sociais e económicas para o país, para o desenvolvimento da região e para a história dos próprios Caminho-de-ferro, que inaugurou em 07/07/1864 o troço entre Estarreja e Vila Nova de Gaia, atravessando o concelho de Ovar no sentido norte-sul e mais tarde, em 15/01/1865 seria inaugurada a Estação de Ovar.
Um acontecimento que permitiu fomentar o desenvolvimento de Ovar que, ao mesmo tempo, assumiu um lugar estratégico no desenvolvimento dos próprios caminhos-de-ferro portugueses que em 2006 assinalaram os seus 150 anos, com a instalação das oficinas metálicas da CP em Ovar que produziam peças destinadas ao reforço, substituição e beneficiação de pontes metálicas em toda a rede, sendo então a única existente na empresa, desempenhando assim papel fundamental na relação/manutenção da Ponte Maria Pia inaugurada em 1877, que estabeleceria a ligação ferroviária entre Lisboa e Porto. As Oficinas da CP em Ovar tinham ainda uma brigada especial criada em 1899 para, com algumas máquinas elementares, servir de primeiro recurso em caso de emergência.
Texto e fotos: José Lopes
(Correspondente “Etc e Tal Jornal” em Ovar)
01jun14