A antiga fábrica de papel do Casal, junto ao rio Cáster e á fonte Júlio Dinis, adquirida pelo Município ovarense para dar lugar à Escola de Artes e Ofícios de Ovar, acolhe desde o mês de outubro a primeira de sete exposições sobre artes e ofícios tradicionais de Ovar, tendo começado pela Cordoaria que esteve patente ao público neste recente espaço público da cidade de Ovar, através de uma ilustrativa mostra, que, cronologicamente dá ao visitante uma noção da história da Cordoaria e particularmente da sua implantação e importância industrial e social no concelho de Ovar e fundamentalmente nas freguesias de Cortegaça e Esmoriz.
Após a sua inauguração a 11 de outubro, a exposição “Cordoaria 1.7” iniciou uma nova fase deste espaço cultural da Câmara Municipal de Ovar que integra ainda nas suas instalações o Espaço Lúdico do Azulejo, a que se seguirão outras exposições temáticas sobre artes e ofícios tradicionais caraterísticas de Ovar a exemplo da tanoaria ou arte xávega.
Esta iniciativa organizada pela Divisão da Cultura da Câmara Municipal de Ovar com recurso ao Arquivo Municipal de Ovar e do Museu de Ovar, assim como do Arquivo Histórico do Porto / Casa do Infante, Biblioteca Pública Municipal do Porto e Instituto dos Museus e da Conservação – Divisão de Documentação e Fotografia.
Inclui ainda conteúdos multimédia sobre a exposição de uma das artes e ofícios mais antigas e mais relevantes do concelho. Uma exposição, que a exemplo das que se vão seguir, se propõe, segundo o Município de Ovar, “refletir uma perspetiva de evolução ao longo dos tempos, mostrando como a partir de um processo artesanal se evolui para um sector industrial com uma forte componente tecnológica e de inovação”, acrescentando ainda a propósito da temática da Cordoaria, que se, “pretende valorizar o conhecimento desta arte assim como dar a conhecer o património imaterial associado ao ofício” de que há registos desta atividade no Município de Ovar desde o século XVII até aos dias de hoje.
Visitar a exposição “Cordoaria 1.7” na Escola de Artes e Ofícios como o Etc e Tal jornal fez a um sábado de manhã, com o sol radiante a iluminar o espaço interior reconstruído da antiga fábrica de papel, que proporciona uma espécie de viagem no tempo. Neste caso, devidamente assinalado e ilustrado cronologicamente, destacando-se informação do ano 15.000 a.C. sobre “fragmentos fossilizados de corda com 7mm de diâmetro encontrados na gruta de Lascaux (França)” ou do ano 1501 com, “a primeira referência à pesca da sardinha no litoral de Ovar. As modificações litorais da costa conduziram à decadência da pesca na Ria e, consequentemente, levaram aos pescadores ovarenses de antanho para as fainas do mar, sem litoral acolhedor, primeiramente para uma pesca marítima rudimentar, as Artes Pequenas ou Chinchorros”. Uma referência às pescas que exigiam grandes quantidades de cordas para as artes do mar, tal como acontecia com a lavoura.
Nesta viagem pelo tempo, começam a surgir registos de oficinas de cordoarias (1722), como a de “Pantaleão da Costa Marques, em Esmoriz, que forneceu cordas para as companhas de Ovar e de Esmoriz”. As companhas de pesca na região seriam assim os principais clientes de cordas e o verdadeiro mercado para justificar a expansão da indústria da cordoaria.
Em 1792 há registo da “existência de duas oficinas de cordoaria, em Esmoriz, a do Rato e a do Leandro, que forneceram as cordas e o saco à Companha Nova, de Esmoriz” e em 1820 “as oficinas de cordoaria do António Alves Fardilha e de António Rato, com praças no lugar da Vinha, em Esmoriz, forneceram cordas à Companha do Ala, em Esmoriz”.
Já em 1886 surge entretanto o “registo da fundação da oficina de cordoaria Romeira & Irmão, no lugar dos Castanheiros em Esmoriz, fornecedora de cordas para as companhas de Ílhavo, Mira, Tocha, Quiaios e a região entre Ovar e Espinho”, marcando assim a fase de expansão da indústria de cordas e da arte xávega ao longo do litoral, para norte e sul da costa vareira.
Numa vertente pedagógica a exposição permite ainda aquisição de conhecimentos sobre a evolução da matéria-prima na indústria da cordoaria, quando localiza o ano de 1870 como época de “renovação e industrialização da cordoaria com a adoção de máquinas a vapor e de novos processos de fabrico da corda. A juta e o sisal substituem o cânhamo e o linho na produção cordoeira”.
Curiosos também são os registos que surgem entre 1919 e 1933 nos designados “Livros de Licenças de Porta Aberta”, da Câmara Municipal de Ovar, em que são registados pedidos de licença para aberturas de oficinas de cordoaria em diferentes lugares de Esmoriz e Cortegaça, em que se instalaram a maior parte das oficinas licenciadas e só muito residualmente surgiram também nas freguesias de Maceda e Ovar.
Por volta de 1948 estavam identificadas no Anuário Comercial de Portugal no Concelho de Ovar cerca de 28 oficinas em Esmoriz e 17 em Cortegaça. Já em inicio dos anos 2000 a Associação Industrial do distrito de Aveiro registou a existência de 15 cordoarias, distribuídas essencialmente em Esmoriz e Cortegaça e uma em Maceda, algumas com produção de rede.
Fábricas como a Cordex fundada em 1969 tendo sido destinguida em 1979 em Paris, com o “Trofeo Internacional à la Exportation” ou João Violas & Filhos, Manuel Rodrigues Lima & Filhos, OMNICOR, Sicor, Redofil, Ilídio Rodrigues Ramalho ou Quintas & Quintas. Indústria no Concelho de Ovar que em 2014 exportou para mais de 50 países do mundo, estando presente em todos os continentes, sendo mais de 60% da sua produção direcionada para a agricultura, bem ao contrário nos tempos em que foi preciso responder às necessidades de fornecer grandes quantidades de cordas para as artes do mar (fio, corda, cabo e redes).
A exposição na componente social faz ainda referência ao ano de 1937 em que, “foi criado o Sindicato Nacional dos Operários Cordoeiros, Capacheiros e Ofícios Correlativos do Distrito de Aveiro, sendo aprovados os estatutos, sócios fundadores (112 operários de Esmoriz e Cortegaça) e construção da sede”.
Como é afirmado no texto de suporte à exposição “Cordoaria 1.7”, “A invenção da corda foi uma das ideias mais engenhosas da história da Humanidade, conseguindo transformar pequenos fragmentos de fibra numa longa e forte corda, elemento essencial para diferentes atividades, desde a tração animal, ao sistema de alavanca, à construção, à navegação e que em muito serviu para a evolução tecnológica ao longo dos séculos”.
Texto e fotos: José Lopes (**)
(*)Trabalho elaborado com base na informação disponibilizada na cronologia da exposição.
(**) Correspondente “Etc e Tal Jornal” em Ovar /Aveiro
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