Escrevemos hoje sobre um dos grandes beneméritos da Santa Casa da Misericórdia do Porto (SCMP), o portuense José Rodrigues d’Araújo Porto, que nasceu no dia 10 de Janeiro de 1815, sendo baptizado na Igreja de Santo Ildefonso, desta mesma cidade. Era filho de Luís António Rodrigues d’Araújo e de Ana Albina de São José. O nome Porto não é originário dos pais de José Rodrigues, mas foi por ele usado, como indicador da sua proveniência e naturalidade.
Este homem só saiu do total anonimato a que, por certo, estaria para sempre votado, não fora o facto de o seu nome ter ficado imortalizado numa instituição de ensino, dado que, no seu testamento, aberto após a sua morte, em 1887, se afirma que não existiam herdeiros, pois a sua mulher e o único filho que tiveram já tinham falecido e, por este facto, destinava à SCMP um avultado legado, destinado à criação, nesta cidade, de uma instituição, designada no referido documento, como “Escola-hospício, ou Instituto para surdos-mudos”.

Araújo Porto, tal como milhares portugueses do séc. XIX, emigrou muito jovem para o Brasil, na esperança de encontrar melhores condições de vida, já que em Portugal a miséria carregava um futuro sem horizontes. No Brasil, Araújo Porto labutou durante mais de trinta anos e, quando regressou a Portugal, era senhor de uma considerável fortuna.
Estes portugueses do séc. XIX, quando voltavam a Portugal, ficaram conhecidos por “brasileiros de torna-viagem”, nome muitas vezes empregue com sentido pejorativo, de onde ressaltava o desdém por aqueles que saíram da sua terra “com uma mão à frente e outra atrás”… mas, que regressavam carregados de dinheiro!
As avultadas fortunas que possuíam, permitiram que estes “brasileiros de torna-viagem” se afirmassem na sociedade portuguesa, usufruíssem de alguns privilégios e atingissem um patamar social invejável, dado que, a maior parte deles, souberam dotar as suas terras de origem com equipamentos sociais, como escolas, hospitais, ou praticando variados actos de solidariedade, doando dinheiro e bens… Com estas acções filantrópicas, muito meritórias, valorizaram quer as grandes cidades, assim como as pequenas e obscuras terras de província e, muitos deles conseguiram o reconhecimento público. Para lá de uma certa ostentação e de uma premente necessidade de afirmação, estes “brasileiros de torna-viagem” deixaram uma obra notável, que contribuiu para a melhoria das condições de vida do País. Foi, sobretudo, esta vertente, que conduziu à atribuição de títulos de barão, visconde, ou conde, a muitos destes homens.

Araújo Porto enquadra-se nestas características descritas e não fugiu à norma, pois doou parte da sua avultada fortuna, em prol dos mais desfavorecidos. Para lá da SCMP, foram variadíssimas as instituições portuguesas e brasileiras contempladas. Deixamos algumas a título de exemplo:
– Asilo do Barão de Nova Sintra; Recolhimento das Meninas Órfãs de S. Lázaro; Recolhimento das Velhas Inválidas; Asilo dos Entrevados de Cima de Vila; Recolhimento das Lázaras e Lázaros, etc.
A instituição que foi possível fundar com o legado deixado por José Rodrigues de Araújo Porto, o “Instituto de «Surdos-Mudos» Araújo Porto”, funcionou no Largo da Paz, na zona da Boavista, no Porto, por mais de um século (entre 1893 a 2008), cumprindo a missão para que foi criada: recolher, alimentar e ensinar jovens surdos dos dois sexos, proporcionando-lhes um ensino adaptado às suas características e capacidades e preparando-os, nas oficinas do Instituto (sapataria, carpintaria, marcenaria, tipografia,…), com a aprendizagem de um ofício que constituísse uma alavanca para uma futura inserção na sociedade.
O referido Instituto encerrou a sua actividade de ensino, devido às novas políticas educativas, implementadas em muitos países europeus e aos novos paradigmas pedagógicos do ensino de surdos que preconizam uma educação inclusiva, ou seja, os surdos são integrados em escolas para alunos ouvintes, mas tendo a presença de intérpretes de língua gestual, porque se considera que os surdos não são mudos, pois são capazes de se exprimir através da sua língua natural, ou seja, a língua gestual.
O edifício que albergou esta instituição de ensino acolhe, no presente, o Centro Corporativo da Misericórdia ( Serviços Partilhados e Corporativos da Misericórdia do Porto – SPeC), funcionando como sede da SCMP mas, conservando para a posteridade, o nome do grande benfeitor, pois o edifício passou a chamar-se “Palacete Araújo Porto”.
Texto: Maximina Girão Ribeiro
Fotos: Pesquisa Google
Obs: Por vontade da autora e, de acordo com o ponto 5 do Estatuto Editorial do “Etc eTal jornal”, o texto inserto nesta rubrica foi escrito de acordo com a antiga ortografia portuguesa.
01jun17