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Manuel Pinto de Azevedo

Quem, nos finais do século XIX, percorresse a tripeira freguesia do Bonfim, apercebia-se de um verdadeiro frenesim, proveniente do vai-e-vem dos operários, misturado com o barulho das máquinas a laborar nas fábricas que por lá proliferavam. Não é por acaso que o brasão da freguesia do Bonfim ostenta três chaminés de fábricas, o que significa que, no passado, a indústria era significativa, neste espaço da cidade. Na realidade, esta era a freguesia que contava com um maior número de unidades fabris e de operários, quer no séc. XIX, quer na primeira metade do séc. XX. Foram outros tempos…

Uma das pessoas que muito contribuiu para este pulsar da zona oriental do Porto foi, por certo, o bonfinense Manuel Pinto de Azevedo, aí nascido, no Campo 24 de Agosto, em 27 de Abril de 1874. Era filho de António Pinto d’Azevedo, natural de St.ª Maria de Gôve, Baião, e de Emília Pereira da Silva, governante de sua casa, sendo esta, natural de St.º Ildefonso, no Porto.

Manuel Pinto de Azevedo frequentou a antiga Escola Técnica de Faria Guimarães, no Porto, onde se matriculou, em 1891 e iniciou a sua actividade profissional, em 1894, como operário da indústria têxtil, na Fábrica do Bonfim, nº 326, empresa que ali estava instalada, desde 1882. De operário depressa se tornou proprietário da mesma fábrica, em 1901, quando tinha apenas 27 anos, ascendendo ao cargo de Director da Fábrica onde trabalhava.

Prédio n.º 326, na Rua do Bonfim
Prédio n.º 326, na Rua do Bonfim

Os seus empreendimentos depressa o catapultaram para um patamar de renome, pois, as suas iniciativas, quer a nível particular, quer associado a outros industriais e capitalistas, foram-lhe dando protagonismo dentro do sector têxtil: fundou fábricas, comprou outras, as quais foi melhorando e adaptando, conforme as necessidades do momento. É o caso da Fábrica de Tecidos do Bonfim que foi sendo progressivamente melhorada e ampliada e, em 1914, foi até dotada de uma tinturaria.

Em associação com o empresário Manuel Alves Soares adquiriu, em 1924, a Fábrica de Fiação e Tecidos de Soure que tinha arrendado, em 1917.

O êxito financeiro que alcançou permitiu-lhe adquirir algumas das mais importantes unidades fabris do sector têxtil em laboração, no Porto e nos concelhos limítrofes, como é o caso da Fábrica de Fiação de Tecidos da Areosa (1920, Porto); Empresa Fabril do Norte (1922, Senhora da Hora, Matosinhos); a Fábrica de Fiação e Tecidos de Ermesinde, situada em Sá e a Fábrica de Tecidos Aliança, em Rio Tinto (1928).

Fábriuca do Bonfim (1912)
Fábrica do Bonfim (1912)

A fábrica mais importante que Manuel Pinto de Azevedo possuiu foi a Fábrica de Tecidos Aliança, no Bonfim, situada na actual Rua António Carneiro. Todo o quarteirão que circunda a rua do Bonfim, a rua António Carneiro e o que actualmente é a Av. Camilo foi terreno adquirido por Manuel Pinto de Azevedo, onde mandou construir as imponentes garagens, uma das quais é hoje um supermercado.

Na década de 1950, a fim de promover a sua produção em tecidos de algodão criou duas sociedades distribuidoras para servirem as principais colónias africanas – Angola e Moçambique, respectivamente “A Algodoeira Colonial, Lda” e a “União Industrial Algodoeira, Lda”. Mais tarde, para fomentar a indústria têxtil nas colónias portuguesas, em África criou, juntamente com outros industriais, a “Sociedade Algodoeira de Portugal”.

Interessou-se, também, por outros sectores industriais, nomeadamente o sector conserveiro, fundando a “Continental Sociedade de Conservas” (1929, Matosinhos); investiu na “Companhia Portuguesa do Cobre” (Porto); na firma “António Maria Tavares, Júnior, Lda” (Porto), e na “Sociedade Corticeira Robinson Bros., Lda” (Portalegre).

Fábrica de Fiação de Tecidos da Areosa
Fábrica de Fiação de Tecidos da Areosa

Ao seu império industrial, Manuel Pinto de Azevedo juntou o sector da imprensa, tendo estado ligado às empresas produtoras dos periódicos “O Norte” e o “Jornal de Notícias”. Em 1923, comprou o histórico jornal portuense “O Primeiro de Janeiro”, do qual foi Presidente do Conselho de Administração e o seu maior accionista. Dado que Manuel Pinto de Azevedo era um homem sempre atento às inovações tecnológicas, este desaparecido Jornal, de grande prestígio na imprensa diária nacional, passou por inúmeros melhoramentos e transformações, tanto no aspecto gráfico como sob o ponto de vista redactorial, durante o tempo em que foi dirigido por este dinâmico homem.

A vinicultura e a exploração agrícola, os sectores eléctrico (União Eléctrica Portuguesa), o bancário (Banco Borges & Irmão), o de seguros (A Mutual do Norte) e ainda o sector da saúde, através da Clínica Heliântia, foram alvo do seu interesse, enquanto investidor.

Como republicano convicto, a sua acção na vida pública da cidade do Porto foi também relevante: integrou a primeira vereação da Câmara Municipal da cidade, eleita logo após a queda da monarquia. Nesse cargo manteve- se até 1917, voltando a ser eleito vereador em 1919, cargo que desempenhou até 1921, altura em que, voluntariamente se afastou, abandonando toda a actividade política.

Desempenhou, durante doze anos, a partir de 1926, o cargo de Mesário da Santa Casa da Misericórdia do Porto, sendo reeleito para um novo período, entre 1941 e 1945, assumindo, nessa qualidade, a administração do Hospital-Sanatório Rodrigues Semide.

Auto-caricatura de Cruz Caldas fazendo o retrato de Manuel Pinto de Azevedo, in "O Tripeiro"
Auto-caricatura de Cruz Caldas fazendo o retrato de Manuel Pinto de Azevedo, in “O Tripeiro”

A sua actividade filantrópica foi notável, não só nas suas empresas para as quais criou bairros operários, creches e lactários, cantinas e bibliotecas e outros benefícios para os seus trabalhadores, além de facultar inúmeras benesses e melhoramentos em diversos hospitais e casas de caridade do Norte e Centro do país. Nesta faceta podemos considerá-lo como um pioneiro das questões sociais, dado que proporcionou aos seus trabalhadores melhores condições a nível de trabalho, saúde, higiene e de habitação.

Damos como exemplo a construção de dois edifícios, respectivamente em 1916 e 1918, situados na rua António Carneiro, em estilo Arte Nova, hoje recuperados e com toda a sua beleza arquitectónica realçada, que serviram, um, como Centro Republicano Democrático do Bonfim e, o outro albergou uma cantina e uma pequena creche, balneários e um dormitório, tudo destinado ao bem-estar dos seus operários. Lembramos, ainda que, na sua Fábrica de Tecidos de Ermesinde, fundou uma padaria para fornecimento de pão aos seus operários e uma cooperativa de consumo para abastecimento de géneros de primeira necessidade que aí poderiam ser comprados a preços mais reduzidos, relativamente aos que eram praticados no circuito comercial normal, além de uma cantina para servir os seus trabalhadores.

Foi ainda um grande benemérito do Clube de Desportos e Educação Física do Norte, sendo a este complexo social e desportivo dado o nome de Parque de Jogos Manuel Pinto de Azevedo, o qual foi criado para a “convivência e sã camaradagem dos seus trabalhadores”, que eram mais de dois mil.

Pelo seu carácter empreendedor, dinâmico e humanista, Manuel Pinto de Azevedo foi distinguido com os galardões de Grande Oficial da Ordem de Cristo e Oficial da Ordem da Instrução Pública.

Um dos nomes mais destacados da história da indústria portuguesa e um marco incontornável da história da cidade do Porto, no início do século XX, Manuel Pinto de Azevedo, faleceu no Porto, em 1959, com 84 anos de idade.

Texto: Maximina Girão Ribeiro

Fotos: pesquisa Google

Obs: Por vontade da autora e, de acordo com o ponto 5 do Estatuto Editorial do “Etc eTal jornal”, o texto inserto nesta rubrica foi escrito de acordo com a antiga ortografia portuguesa.

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