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Leprosarias, Lazaretos ou Gafarias, no Porto

Maximina Girão Ribeiro

A lepra ou mal-de-Lázaro é uma doença infecciosa causada por um  bacilo, hoje mais conhecida por doença de Hansen a qual foi, outrora, um mal incurável, levando as populações a promoverem o afastamento, o isolamento e a total segregação dos que padeciam dessa doença contagiosa. Para acolhimento destes doentes surgiram as leprosarias, lazaretos ou gafarias, com localização extra-muros, em locais periféricos, ou sítios isolados, longe das populações para evitar o risco de contágio e a repulsa das populações por estas pessoas que ficavam com lesões graves a nível da pele e cujo aspecto era quase sempre repelente, para além das mutilações visíveis em várias partes do corpo (nariz, dedos,…).

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Em muitos locais da Europa se, por algum motivo, os leprosos ou gafos tivessem de circular em povoações, eram obrigados a fazerem soar objectos que emitissem ruído para alertar sobre a sua aproximação, também não deviam servir-se das fontes para não contaminarem as águas e, claro, não podiam acercar-se das pessoas… Deste modo, os gafos eram forçados a viverem para lá de uma fronteira natural, um rio ou uma montanha, ou até largados em zonas pantanosas, onde ficavam completamente abandonados.

Leprosaria
Leprosaria

Os hospitais para leprosos, as chamadas gafarias, leprosarias ou lazaretos, encontravam-se espalhadas por todo o país e eram locais constituídos pela casa dos gafos, uma igreja ou capela e uma cerca, onde se situava o cemitério porque, em vida, os leprosos eram separados das pessoas sãs e, depois de mortos, o afastamento devia ser mantido, pois não eram sepultados nas igrejas, como era hábito, mas em locais próprios para os que padeceram desta doença.

No entanto, a entrada dos doentes de lepra, numa leprosaria, representava uma espécie de privilégio pois, normalmente estava reservada a quem possuísse algo de seu que pudesse contribuir para ser tratado, numa instituição.

Leprosos existiram em Portugal, desde épocas remotas e o Porto não escapou a esta terrível doença. Conhecem-se algumas referências sobre a existência de leprosos, na cidade sendo, provavelmente, a mais antiga, aquela que se reporta ao ano 1185. Também num documento de 1247 se revela a venda de um terreno, o “campo da Cortinha” que era propriedade dos gafos “[…] que ficava próximo da Reboleira e da ermida de S. Nicolau […]”, locais junto do rio Douro. Outras referências são expostas, em 1260, no testamento do bispo D. Julião Fernandes, em que este fazia legados aos gafos de Vila Nova de Gaia, Alfena e do Porto, sendo estes últimos os leprosos do hospital junto à Reboleira. O bispo D. Sancho Pires, em 1300, também se lembrou dos leprosos do Porto, doando-lhes dinheiro.

Capela de Santo André - Demolida em 1863
Capela de Santo André – Demolida em 1863

Desta primitiva leprosaria, situada próxima da Ribeira, foram os leprosos ou gafos transferidos, pelos finais do séc. XIV para “[…] além da porta de Cima de Vila, não longe de Mijavelhas […]”. O espaço em questão seria o Largo do Arrabalde, uma zona fora da muralha, de características muito rurais, com quintas, pinhais e bosques de carvalheiras, campos de cultivo e regatos e que, posteriormente e, até aos nossos dias, ficou conhecido por “S. Lázaro”, por referência a Lázaro, o mendigo e leproso, protagonista da parábola de Jesus que passou a ser o santo protector dos leprosos.

Fazia também parte do hospital dos gafos de S. Lázaro, um cemitério, que ficava nas proximidades da já desaparecida capela de Santo André que se situava na actual Praça dos Poveiros.

A esta gafaria concedeu D. João II (séc. XV) importantes isenções e privilégios às pessoas/cuidadores dos leprosos que “continuadamente vivessem” na “Casa de S. Lázaro desta nossa cidade do Porto”. Essas pessoas eram quatro, dois homens e duas mulheres que se dedicavam em exclusivo a cuidar dos doentes.

Avenida Rodrigues de Freitas (Porto) - Igreja e Recolhimento
Avenida Rodrigues de Freitas (Porto) – Igreja e Recolhimento

Mais tarde, por alvará do rei D. João V, em 9 de Outubro de 1721, passou a administração dos Hospitais dos Lázaros e das Lázaras, tal como então eram designados, para a Santa Casa da Misericórdia do Porto.

O sítio desta gafaria fica­va na parte sul do actual jardim onde, desde o séc. XVIII (1734), se encontra o edifício que foi chamado de Recolhimento de Nossa Senhora da Esperança ou das Meninas Órfãs. Com a edificação do citado Recolhimento, localizado no sítio que tinha sido ocupado pelo hospital dos gafos e pela respectiva capela, mandou a Santa Casa da Misericórdia construir um edifício, nas Fontainhas, a fim de albergar os lázaros e as lázaras. Este edifício, ainda hoje existente, funcionou por algum tempo para o fim a que se destinava, estando hoje abandonado.

Obs: Por vontade da autora e, de acordo com o ponto 5 do Estatuto Editorial do “Etc eTal jornal”, o texto inserto nesta rubrica foi escrito de acordo com a antiga ortografia portuguesa.

Fotos: pesquisa Google

01fev18

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1 Comment

  1. Zeferino Duarte Brandão

    Gostei muito do texto, pois tirou-me algumas dúvidas relativamente à gafaria do Porto, pois pensava que ela apenas tinha existido no “Beco do Arrabalde”, depois de sair da Ribeira. Afinal ela foi transferida, com a construção do Colégio, para as Fontaínhas.
    Os meus agradecimentos.
    Zeferino Duarte Brandão

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