Carla Ribeiro
Há Vida, nas ruas da minha cidade…
Parámos, porque alguém, remexia um contentor do lixo…
O brilho que vi naqueles olhos, quando saímos ao seu encontro, e lhe dizia boa noite, fez-me sentir um enorme aperto em meu coração.
Um dos elementos da equipa, desta noite, dizia, este senhor foi meu professor na Escola de Música…
Rapidamente nos abeiramos dele, e ai ficamos parados, para lhe darmos atenção e alimento.
Perguntei-lhe se queria comer uma sopa quentinha, e rapidamente da candura da sua voz ouvi:
– “Menina nem imagina como me vai saber bem, há 6 meses que não como uma refeição quente…”
Nesse momento olhei para ele e brilhava ainda mais o seu olhar, aquele olhar cintilante, que destapava, um belo olhar azul.
Íamos falando com o Sr. Alberto e com uma enorme alegria ele confirmava que tinha sido seu professor, e com alegria falavam agora, desses tempos em que tocava e sentia a música pulsar na sua vida. As suas palavras fluíam como se fossem pautas de música, como se de uma dança se tratasse…
Colocou o prato da sua sopa, num degrau da escada, e conversava connosco sem se preocupar com o resfria da sua sopa quente que já há mais de seis meses não comia.
Sr. Alberto, ávido de sabedoria e de músicas, contava que todos os dias se alimentava de comida, que recolhia dos contentores do lixo, pois uma Instituição lhe dava um apoio com um cabaz alimentar mas não podia usar quase nada pois não tem como cozinhar, indignado e triste disse-me:
– “Menina como posso eu sem luz cozinhar uma sopa… Claro que dou a quem tem fome e pode cozinhar…”
Sr. Alberto vive num espaço que aluga sem luz e sem água, pagando todos os meses 150,00 Euros.
Mas afinal que sociedade é esta em que não há respeito pelos PESSOAS que já estão fragilizadas pela VIDA e pela situação em que se encontram.
Precisamos Renovar as mentalidade, precisamos renovar a sociedade, precisamos Renovar os sentimentos.
Nesse instante só pensei… Mas fome tem ele, e dá a quem tem fome… E vai-se alimentando nos contentores do lixo, será que estas Instituições não perceberam ainda que a ajuda que devem dar a este Senhor não pode ser um saco de comida apenas para o calar?
Pergunto-me como podem Instituições dar um cabaz com alimentos para confecionar a uma pessoa que não tem como os confecionar?
Porque continuam a ver estas pessoas apenas como um número, como um papel, como um cifrão?
Vamos trata-los como pessoas e não como um número, são pessoas não são bichos…
A nossa conversa continuava e percebi que a sopa arrefeceria, pelo que lhe pedi que se alimentasse pois ficaríamos junto dele.
Se bem que ávido de comida, tinha ainda mais “fome” de atenção de carinho, de amor, de conversar e deixar fluir as pautas que estão dentro de si.
Sr. Alberto quis saber como nascemos e depois de lhe contar qua o nosso caminho nos deu os parabéns e agradeceu mais uma vez por termos parado e estarmos ali a conversa com ele sem olhar o relógio, sem medo, sem presa…
Eloquência, Sabedoria
Alegria, preocupação, inquietação, até alguma revolta, mas muita esperança e gratidão.
Não posso deixar de recordar o nosso, último Amigo, que acordamos já por volta das 6 horas que foi para mim um feliz reencontro.
Muitos meses depois, reencontro o Sr. Alberto.
Na sua voz, a melodia de uma pauta musical.
Sempre ávido de uma boa conversa, deixava arrefecer a sua sopa quente, trocando-a, mesmo que com fome, por partilhas de história da sua vida.
A última refeição quente que havia ingerido, fui eu mesma que lha dei, há já uns quatro a seis meses… uma sopa quente, quando o encontrei pela primeira vez a remexer um contentor de lixo e me disse:
– “Nem imagina a quantidade de coisas boas que aqui encontro. Menina nem imagina como me vai saber bem, há 6 meses que não como uma refeição quente…” – (nesse momento olhei para ele e seu olhar brilhava ainda mais).
As suas palavras fluíam como se fossem pautas de música, como se de uma dança se tratasse…
Mas nessa melodia, tanta dor e sofrimento, pareciam notas de música doces e suaves…
Foi comendo a sua sopa, acompanhando com algum pão que nos ia contando algumas histórias, mas que não podemos revelar, pois prometemos nada contar…
– “Mas que diferentes, vocês são, não deixaram simplesmente a sopa e foram embora, ficaram todos aqui a ouvir-me, mas não contem nada a ninguém…” – dizia sempre em tom de graça.
E nesta alegria, em que nos contava as suas histórias, as bandas em que tocou, a sua enorme paixão pelo Jazz, sempre nos deixava com a sua sabedoria um conselho, uma graça para que os sorrisos sempre fossem uma constante.
Nas suas palavras sempre melodiosas, sempre ávidas de companhia, fomos conversando, rindo, sorrindo, mas sempre, no seu diálogo, uma eloquência de sabedoria…
-“… As bolas de Berlim, são deliciosas, mas da próxima vez, traga a minha com doce de morango…. Eu adoro…” – parece tão simples… mas neste momento as lágrimas correram sem parar no meu rosto.
Até breve professor
Voltaremos certamente a encontrar-nos para mais um exaltar de melodias
Obrigada
Até breve com novos “sentir”, novos “amar”…
Foto: Corações Amigos
01jun18
Obrigado amiga por tudo que nos transmites
Mensagem de amor. Emoção. Gratidão.
Obrigado Carla pela partilha.
E pela tua/Vossa missão de ajudar quem tanto precisa….
António
Bom dia querida amiga.
Muito obrigada pela tua partilha…
Foi com muita emoção e, alegria por saber que tu és um ser humano maravilhoso e iluminado.
Parabéns
Que Deus te abençoe e proteja sempre.
Beijinhos da tua amiga
C. R.
Relatos sentidos, como só tu sabes descrever querida amiga
Deus te proteja porque és um anjo sobrevoando as ruas da tua cidade
bjo