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Longevidade e Vida

Fernanda Ferreira

Foi com tristeza que soube que a nossa querida amiga, uma nonagenária que, apesar da sua limitação funcional, era uma pessoa bem-disposta, com brio em se arranjar e maquilhar e que se ainda se entretinha a tricotar botinhas de lã, tinha ido morar para um casarão antigo que tinha sido adaptado para Lar de terceira idade.

Os filhos resolveram “apaziguar” a consciência descartando-se mãe, depositando-a numa instituição sem sequer ver se as condições eram adequadas ao que ela precisava.

Não falo nas do espaço físico nem material existente porque têm condições razoáveis, mas de falta de acompanhamento profissional atento, pronto e carinhoso, e pela nossa amiga estar rodeada de companheiras dementes.

O pessoal só aparece para a higiene matinal, colocar no cadeirão, para as levarem para as mesas nas horas das refeições e para à tardinha as deitar. Fora disso raramente aparecem.

De tarde têm uma pessoa para fazerem umas pequenas atividades

O quarto que divide com outra idosa, não tem campainha

– “Se precisar de alguma coisa chame que elas vêm ”- dizem os filhos, em vez de pedirem uma campainha para o quarto.

Mudou duma vida abastada numa zona rural na periferia duma pequena cidade do interior para uma grande cidade que nada lhe dizia, onde não conhecia ninguém.

-“Aprisionada numa gaiola dourada pela minha própria família!”

Não se está a adaptar porque só tem a companhia das colegas, todas com demência, e passam grande parte do dia sentadas nos cadeirões. Raramente têm visitas. É uma tormenta ouvir só a conversa desarrazoada e gritos das companheiras do lar.

-“Quem diria que já tinha fui uma pessoa abastada, dona de pinhais, casas na cidade e quintas para cultivo de legumes, batatas, fruta e produção de vinho.

Se soubesse que ia durar tantos anos, nunca tinha feito doação em vida aos meus filhos!”

Eles pouco tempo despendem para visitá-la e parecem insensíveis à sua solidão, tristeza e ao risco começar a a ter rápido declínio mental ou que desista de querer viver.

Se podem pagar, sabemos que podem, e já que todos trabalham e não conseguem ( ou não querem) cuidar da idosa, porque não escolheram outro tipo de Lar que desse mais garantias dela poder manter a lucidez e ter um acompanhamento mais humano?

Ao ter conhecimento desta história real, interrogo-me:

-Será que aumentando a longevidade aumentamos a vida dos idosos, eles que na reta final das suas longas vidas que são tratados como empecilhos na vidinha egoísta dos familiares? Isso é vida?

E esta é apenas uma das muitas histórias da triste realidade da maioria dos idosos.

 

Foto: pesquisa Google

01jun19

 

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