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“Cinema na China”

Weihua Tang

 

“Candy! Vamos ao cinema!”

Esta foi a sugestão da minha ex-aluna, antes do Ano Novo Chinês. Atualmente, a palavra “cinema” parece-me muito “estranha ” pois, de facto, já não entrava no cinema há duas décadas.

Nasci no ano sessenta do século passado. Ainda me lembro que, naquela altura, na China, não havia tantas formas de entretenimento como hoje em dia e, na minha infância, o melhor “passatempo” era podermos ver um filme de graça.

Na China, fui criada num ambiente muito diferente e especial. O meu pai era médico do exército, portanto, tínhamos a prioridade de ver os filmes novos quase todos os sábados, à noite, exceto quando estava mau tempo. Antes de anoitecer, alguns soldados já começavam a colocar um ecrã grande, de pano branco, quadrado, na praça onde o exército fazia os exercícios, durante o dia.

De facto, a nossa vida naquela época era muito simples, sobretudo a minha. Como tinha muito tempo livre, gostava de ir cedo para deixar um banco lá para ocupar o melhor lugar, enquanto a minha irmã mais velha preparava o jantar em casa.

O filme era transmitido no ar para o público, e assim que colocavam uma mesa no meio da praça para segurar o projetor, começavam a fazer o “feedback”, pois havia um monte de latas redondas que continham os negativos.

Sendo a filha mais nova e mais mimada na família, sentava-me num banco à frente do meu pai, que era o meu aconchego, como habitual. Para mim, foi a fase mais feliz de sempre. Ainda por cima, o meu pai secretamente dava-me dois rebuçados quando víamos um filme. Conseguem imaginar que, no início dos anos setenta do século XX, para a minha geração, os rebuçados eram considerados um “luxo” como um “snack” nos dias de hoje?!

Contudo, o momento mais inesquecível e mais interessante era quando a sessão de cinema era interrompida para que pudessem mudar o negativo, enquanto as pessoas estavam concentradas no filme. Evidentemente, sempre causava um enorme barulho na multidão, devido a esta interrupção. No entanto, as pessoas divertiam-se na mesma, especialmente quando o filme começava novamente. Apesar de ser proibida a entrada a estranhos, nunca faltavam espectadores em cima dos muros, pois o filme era de borla! Era impressionante e incrível, não acham?!

Se esta maneira de ver um filme, na minha infância era engraçada, havia ainda outra experiência que era mais inacreditável. Por vezes, fomos forçados a levantarmo-nos às cinco horas da madrugada pelo “trompete de emergência”. Na realidade, não era urgência nenhuma, era somente para nos acordar para podermos ver o filme recém-chegado, o mais rápido possível. Quando acontecia a “falsa emergência”, íamos ver o filme dentro de um auditório e, para mim, era o verdadeiro cinema na minha infância.

O nosso mundo sossegado mudou, quando a China abriu a porta, no início da década oitenta. A novidade da televisão, devagarinho, substituiu o cinema. Obviamente, que a probabilidade de ir ao cinema tornou-se cada vez menor.

Vinte anos depois, entrei de novo no cinema. Desta vez, foi longe da minha terra natal, foi aqui, em Portugal. E coincidentemente, fomos ver um filme chinês que se chama “A Despedida”.

No final, assim que apareceu a palavra “Fim”, no ecrã gigante, enquanto a luz se acendeu, eu levantei-me, com tanta curiosidade, virei as costas e espantosamente, percebi que éramos apenas sete mulheres espectadoras, e, acima de tudo, cada uma estava com um pacote de pipocas…

 

Fotos: BAIDU

01jun20

 

 

 

 

 

 

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