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Para rir e para chorar

Joaquim Castro

 

 

Esta coisa das redes sociais, às vezes faz rir, mas outras vezes faz chorar. Faz chorar, quando vemos tantos pontapés na Gramática. Mas faz rir, quando a imaginação dos portugueses começa a funcionar. Até faz chorar e rir ao mesmo tempo. Uma das principais fontes de imaginação são as imagens, nomeadamente, as televisivas. Numa dessas imagens, vejo a legenda: “Com muitas ou poucas pessoas, vai haver Natal”, disse a Graça Freitas, . Grande descoberta! Em outra imagem, vejo um dirigente comunista a dizer que não vê razão para não se realizar o Congresso do PC. Mas a imagem mostra o exacto momento em que o tradutor de linguagem gestual aponta com o dedo indicador para o lado da testa, do mesmo modo em que costumámos usar o gesto para classificar outros de maluquinhos.

SEMPRE A “ACELARAR”

Há dias assim. Ainda mal refeito da enxurrada de pontapés na gramática, de toda a semana, comecei um domingo com a mesma receita das televisões. Parei na TVI24 e ouvi um cientista declarar que o Governo já devia ter “acelarado” as medidas de combate à Pandemia. Que horror, um erro muito bem pronunciado pelo senhor especialista. Dias mais tarde, ouvi o nosso campeão de motociclismo, Miguel Oliveira, a dizer a uma televisão, em cima da moto, que gosta de “acelarar”. No dia seguinte, um jornalista da Antena 1, confirmou, tal ideia, ao considerar que a Prova de Motociclismo de Portimão era onde o piloto podia “acelarar”, com a vantagem de estar em casa. Este caso tem sido muitas vezes abordado aqui, nesta rubrica. Mas se estes exemplos são um retrato de como tão mal se trata da Língua Portuguesa, o que dizer da forma como se trata tão mal o português, na Assembleia da nossa República.

PROFESSOR E ALUNO

O presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, que foi professor de faculdade do primeiro-ministro, António Costa, pode muito bem ser o mentor da expressão “permetir”, que ambos pronunciam, em vez de permitir. É assim, alguns mestres desensinam em vez de ensinar. Publiquei uma provocação, sobre fundo vermelho, na qual escrevi: “VOCÊ É DOS QUE DIZEM / “PERMETIR” / COMO DIZ O MARCELO? / E A MENINA DOS CARACÓIS NOS CABELOS?”. Inesperadamente, apareceu uma amiga do Facebook, a responder que se escrevia permitir, como a professora a ensinou, mas se pronunciava “permitir”. Por ser uma senhora a quem reconheço bons conhecimentos de Língua Portuguesa, achei muito estranho o comentário, e contrariei-a, dizendo-lhe que nunca tinha ouvido tal teoria. Até disse que se escrevia civil, mas que se pronunciava “cevil”. Deve ter sido uma professora de “Lesboa”!

FIÉIS E NÃO FIÉIS

O jornalista Joaquim Franco, da RTP, especialista em assuntos religiosos, fez um directo do Santuário de Fátima, durante o qual afirmou que os fiéis estavam a cumprir as regras de segurança e o distanciamento profilático. Mas, e os outros, que não eram fiéis, eventualmente, crentes de outras religiões. Poderão dizer, isso é uma preciosidade. Pois, mas o meu papel, neste trabalho, é o de ir também atrás dessas questões. Por vezes, os jornalistas, para “encher chouriços”, como se diz dos que prolongam os seus directos, sem acrescentem nada de novo, falam, falam, falam, mas sem qualquer utilidade informativa. Não é bem o caso deste jornalista, mas o exemplo serve para questionar a forma como as coisas são ditas. Bem pior, é o exemplo, muito em voga, de se dizer o “então”, entre as diversas frases, de tal modo repetido, que se torna confrangedor.

PRIMÁRIOS

Uma professora amiga, já aposentada, veio ao Facebook insurgir-se contra a designação de “professores primários”, nos meios de comunicação. Se a designação fosse correcta, então também poderíamos falar de “professores secundários”. Ou seja, professores de um nível superior, teoricamente, passavam a pertencer a um nível inferior. Isto faz lembrar os graus de comparação, como “os níveis de progressão da Covid-19 em Portugal, são mais altos que a Holanda, agora, Países Baixos. A forma correcta de comparar as situações seria “os níveis de progressão da Covid-19 em Portugal, são mais altos que os da Holanda”. E por falar em Covid, veio-me à ideia o ministro das Finanças, João Leão, quando declarou: “ esta medida entrará em vigor quando a Pandemia estiver controlada”. E disse-o duas vezes. Será quando, mais ou menos?!

VARIAÇÕES

“A pressão no SNS vai aumentar nos próximos dias e semanas…” – Marcelo Rebelo de Sousa no anúncio de novo Estado de Emergência. Mas deveria ter dito: “ A pressão no SNS vai aumentar nos próximos dias e nas próximas semanas”. Depois, apareceu no discurso, um “facelitar”.

Na entrevista a uma jovem, estudante de música, foi-lhe perguntado se os vizinhos reclamavam por ela treinar música em casa. Ela disse que sim, que se incomodavam. Mas a questão põe-se, é treinar ou ensaiar música?

Já agora, por falar em treino, os jogadores de futebol, treinam ou treinam-se? Ora, quem treina é o treinador. O jogador treina-se.

Fernando Medina, presidente da Câmara Municipal de Lisboa, foi questionado sobre se uma determinada obra era para avançar. Ao que ele respondeu: “talvez avançamos”, em vez do talvez avancemos.

Um idoso foi a uma consulta, por causa de uma perna, que não o deixava caminhar. O médico receitou-lhe uns comprimidos, mas o resultado foi nulo. Na consulta seguinte, o médico tentou encontrar justificações para a falta de eficácia do medicamento. Então, argumentou: “sabe o que é, senhor António? É a idade. Aí, o consulente ripostou: “não é da idade, não. Esta perna, apontando para a outra, é da mesma idade e está boa!”.

DESSA, NÃO SABIA EU!

Um grande amigo, dos tempos de Angola, com quem fui militar, era um contador de anedotas inigualável. Tudo o que ele contasse tinha sempre muita piada. Entre as centenas ou milhares de anedotas que lhe ouvi, lembro uma, que ele contou, já em Portugal, quando já estava muito doente. Mesmo assim, conservou o seu excelente humor, criando, em cada anedota, um ambiente de boa disposição. Contou ele: Pelos lados de Santarém, havia um indivíduo que era profissional como testemunha falsa, nos julgamentos do tribunal. O juiz, já cansado de o ver a testemunhar, disse-lhe: “encontro-o sempre por aqui”, a que o indivíduo respondeu: “também o encontro sempre aqui, senhor doutor juiz”. Iniciada a audiência, a testemunha falsa jurou que viu tudo, a violação de uma rapariga por um rapaz: “ele veio atrás dela, ela saltou o muro e ele também saltou. Depois, claro, já se sabe… Mas o senhor viu o rapaz a violar a rapariga, viu-o em cima dela?”. Resposta rápida do indivíduo: “O quê? Dessa não sabia eu, senhor doutor”. Ou seja viu tudo, mas não o essencial. Não é um pontapé na Gramática, mas sim um pontapé no raciocínio!

TODOS A CHATEAR A CURVA!

Muita gente anda, há meses, a falar no achatar a curva, referindo-se ao gráfico que representa a evolução da Covid-19 em Portugal. Mas o que é isso de achatar a curva? Acho que é mais chatear a curva! Também já ouvi o nosso Presidente falar em esmagar a curva. Mas, nem toda a gente saberá o quem é um gráfico, tão pouco, o que são abcissas e ordenadas. Ora, em uso comum, a abcissa refere-se ao eixo horizontal e a ordenada refere-se ao eixo vertical de um gráfico bidimensional padrão. (Wikipédia). E como há vários tipos de gráficos, nem todos têm curvas para esmagar ou achatar. Uns são de barras e outros são circulares, e há muitos de outros tipos, que não têm curvas para achatar ou para chatear! Depois, ainda vêm com o R zero, R1, etc., para baralhar mais as pessoas. O R0 (zero) é um número básico de reprodução. Por exemplo, o R zero (R0) tem sido um dos indicadores mais vezes referidos pelos médicos para indicar quantas pessoas serão infetadas, em média, por um único doente com Covid-19. Quanto mais elevado for, mais rápida é a propagação da doença na comunidade.

 

Nota: Por vezes, o autor também erra!

 

Fotos: pesquisa Web

01dez20

 

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