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Após trinta anos ao abandono, o antigo “Ramal da Alfândega” volta a ter luz ao fundo do túnel! Câmara do Porto apresentou dois “planos”, mas há quem tenha outras propostas para dar vida à via!

Com uma extensão de 3,896 km, tendo sido utilizada, unicamente, por serviços de mercadorias – dando resposta ao início da expedição das mesmas pelo país, depois de chegarem à Invicta por via marítima -, o Ramal da Alfândega do Porto, também conhecido por Linha da Alfândega, ligava, por caminho-de-ferro, o referido edifício, e área envolvente, à Estação de Campanhã, pela meia-encosta do Douro – passando, na escarpa, por zonas como as Fontainhas, Colégio dos Órfãos – Ponte Maria Pia, Quinta da China e Freixo -, foi inaugurada a 20 de novembro de 1888, cumprindo um projeto da autoria de Justino Teixeira, vindo a ser encerrada um século e, sensivelmente, um ano depois… em junho de 1989.

A verdade, porém, é que até aos nossos dias a via-férrea ficou literalmente ao abandono, como comprovam as imagens que se seguem (como a que se encontra em destaque), de uma reportagem efetuada por este jornal, da autoria de Pedro N. Silva, e publicada em janeiro de 2017.

De salientar que, ao longo dos quase quatro quilómetros de via- que em tempos de ferrovia era em bitola ibérica -, há a referir diversas infraestruturas dignas de registo, como os seus três túneis – Alfândega I (80 metros), Alfândega II (23 metros) e Alfândega III (1320 metros, o mais longo túnel ferroviário do Porto) – e uma ponte sobre a Rua da China, tendo existido outra, entretanto, destruída, sobre a Rua do Freixo, na derradeira ligação à Estação de Campanhã.

Estamos a falar de um Porto, hoje, quase desconhecido, mas que durante décadas foi de extrema importância para o seu desenvolvimento…

DA “ESCURIDÃO” À DISCUSSÃO… PÚBLICA!

No ano findo, e pela primeira vez com discussão pública, a Câmara Municipal do Porto mostrou interesse em terminar com a deplorável situação em que encontra a referida via e toda a área que a envolve, lançando como que um concurso livre de ideias, que resultou também no ressurgimento do Grupo de Ação para a Reabilitação do Ramal da AlfândegaGARRA, que, já em 2005 – altura em que foi criado -, defendia a reabilitação do ramal, tendo avançado com diversas propostas, entre as quais, o prolongamento do antigo serviço de passageiros da Linha de Leixões até à Alfândega, passando o mesmo, obviamente, pela estação de Campanhã.

A autarquia, ainda que para uma situação não definitiva, tem na mesa dois planos: um, que visa a construção de um percurso pedonal e ciclável aproveitando os troços em túnel e céu aberto” e a requalificação ambiental e paisagística, através da instalação de um parque urbano em socalcos, em toda a área adjacente ao canal ferroviário”; e outro, de um “pendular, confortável e elétrico”, operado por veículos modernos que prestarão um serviço de mobilidade inédito entre estes dois polos de elevada atração urbana”, como fez questão de informar e salientar, o vereador do Urbanismo da Câmara do Porto. Pedro Baganha. Mas, o GARRA tem outras ideias e consequentes propostas e soluções.

“GARRA” DEFENDE SERVIÇO DE TRANSPORTE COLETIVO

Foto: jpn/up

O Grupo de Ação para a Reabilitação do Ramal da Alfândega – GARRA é, atualmente, constituído por Jorge Mayer, Pedro Pardinhas e Nuno Quental, autores de uma carta aberta à edilidade e de uma petição.

E a verdade é que o GARRA “valoriza a iniciativa da Câmara Municipal do Porto em devolver à cidade o Ramal da Alfândega”, pelo que, e segundo dizem, têm “trabalhado para ajudar o município a tomar a melhor decisão sobre o seu futuro”.

E tanto assim é que, “entre junho e dezembro de 2020, conversámos em público – quatro debates online -, e em privado, com cerca de vinte especialistas em mobilidade geográfica, urbanismo, arquitetura, geotécnica e transportes”.

Exemplo de um shuttle autónomo

Ainda de acordo com o GARRA, é de realçar o facto de que “além das duas soluções alternativas apresentadas pela Câmara do Porto no final de 2019”, ou seja – e como referimos anteriormente – “a ecopista e o shuttle rodoviário autónomo, com capacidade para duas mil pessoas/hora/sentido, apresentada pelos engenheiros Campos e Matos e José Manuel Mendonça e o arquiteto Virgínio Moutinho, outras duas surgiram das conversas que promovemos…”

A saber:

“Um elétrico moderno (superior ao shuttle rodoviário, em capacidade, mas mais caro); um autocarro elétrico a bateria – comparável com ecopista em rapidez de execução do projeto, e muito mais barato que as opções de transporte coletivo por shuttle -, apresentada pelo engenheiro José Manuel Viegas.

Ligação da Ribeira a Campanhã em cinco minutos

O GARRA diz não ter encontrado ainda quem “considere que a ecopista seja o melhor uso definitivo para este canal, por incluir um túnel com 1300 metros e impedir o uso pela maioria da população, que não pedala”.

“Pelo contrário”, reforça, “todos aqueles com quem falámos defendem o transporte coletivo que ligaria a Ribeira a Campanhã em 5 minutos e seria acessível a todos, melhorando a mobilidade na cidade, em especial no centro histórico. Mas percebemos a vontade do Executivo em abrir rapidamente o Ramal para usufruto dos portuenses”.

Autocarro elétrico a bateria

Então, e ainda de acordo com o GARRA, e neste contexto, “os autocarros elétricos a bateria parecem ser a melhor solução por permitir transporte coletivo a muito curto prazo, com custos reduzidos. Esta seria a nossa opção para o curto prazo.

Isso implica apenas preparação do pavimento quer dos rails, e que seja construída a ponte sobre a Rua do Freixo, de modo a ligar o Ramal à Estação Intermodal de Campanhã”.

Depois, o GARRA considera que “a reabertura do Ramal da Alfândega é a melhor oportunidade para finalmente reabrir a Ponte Maria Pia, seja para peões e bicicletas ou para um veículo lúdico-turístico. E, assim que possível, para criar uma ligação em elevador ou escadas rolantes entre a marginal, o Ramal e a Ponte Maria Pia”.

HÁ QUEM TAMBÉM DEFENDA A INTEGRAÇÃO DA “LINHA DA ALFÂNDEGA” NA REDE DE ELÉTRICOS DO PORTO

E a discussão quanto à reabilitação do Ramal/Linha da Alfândega tem levado às mais diversas reações, com algumas propostas a ter em conta, como a de António Alves, na página Transportes Públicos, do Facebook, na qual propõe “a integração da Linha da Alfândega na Linha de elétrico que percorre a marginal fluvial e marítima da cidade do Porto, ligando-as no ponto onde se cruzam (Infante), e recuperando também o troço de linha de elétrico que vai do Passeio Alegre até ao Castelo do Queijo.

(…)A estação de origem poderá ser construída no espaço existente entre a Estação de Campanhã e a Fábrica Ceres, incluindo uma estação a que chamaríamos “Freixo” ou “China”, para servir aquela área onde se encontra a antiga central da EDP, outra na Ponte  Maria Pia, com elevador, integrada num futuro aproveitamento desta obra de arte. Estando a linha de elétricos da marginal também ligada a uma outra zona da cidade de cota alta, Hospital de Santo António – Carmo – Leões, pela linha que parte de Massarelos, teríamos já aqui um embrião para aquilo que seria a futura moderna rede de elétricos urbanos do Porto”.

Para António Alves, “além de grande utilidade para os habitantes e utilizadores da cidade, esta linha aqui proposta, teria um inegável valor para a indústria turística local: estabeleceria uma ligação direta da Estação de Porto Campanhã a Matosinhos percorrendo um trajeto de elevado interesse arquitetónico e paisagístico. A sua construção, visto que se baseia em infraestruturas já existentes, que apenas necessitam de recuperação e adaptação a esta nova finalidade, será sempre mais fácil e menos dispendiosa que a construção de qualquer canal novo. Este projeto pode ser o vetor fundamental para a recuperação urbana e paisagística de toda a escarpa ribeirinha desde as Fontainhas até à Quinta da China em Campanhã e, também, para o aproveitamento pedonal e ciclável em que poderá transformar-se a ponte D. Maria Pia”.

Fica a sugestão!

E OS TROLEICARROS?

Entre as propostas apresentadas nenhuma deu viabilidade ao regresso de um transporte que no Porto fez “furor”, desde meados da década de 50 à de 90 do século passado, como foram os troleicarros – que em Portugal, atualmente, só circulam em Coimbra – com especial destaque para os de um piso, da Lancia.

Mas, tanto os BUT como os EFAC/Salvador Caetano fizeram história nos transportes da cidade do Porto, pelo que o regresso deste tipo de transporte amigo do ambiente poderia ser – quem sabe – uma solução a ter em conta para fazerem um serviço público de passageiros e turistas pela meia encosta do Douro, da Alfândega a Campanhã, e vice-versa.

HISTÓRIA DO RAMAL/LINHA DA ALFÂNDEGA

Ramal da Alfândega foi uma curta via ferroviária, em bitola ibérica, que ligava, no sudeste da cidade do Porto, a estação de Campanhã ao Terminal da Alfândega.

Portanto, a Alfândega do Porto era, no século XIX; um local de grande movimento comercial marítimo, pelo que era de grande interesse a sua ligação à rede ferroviária nacional.

Um decreto-lei, publicado em 23 de Junho de 1880, estabeleceu a construção de um ramal ferroviário entre a estação do Pinheiro, em Campanhã, e a Alfândega, e da respetiva estação terminal.

O estudo do projeto foi da responsabilidade de Justino Teixeira, que se baseou num trabalho inicial de Mendes Guerreiro. O projeto foi aprovado em 9 de Outubro de 1880 e os trabalhos de construção iniciaram-se a 17 de Julho de 1881, sendo o ramal inaugurado a 20 de Novembro de 1888.

Prolongamento do Ramal até Leixões

Em Carta de Lei de 29 de Agosto do 1889 estabeleceu-se que a companhia que obtivesse a futura exploração do porto de Leixões devia construir uma ligação ferroviária entre este porto e o Ramal da Alfândega (via marginal); no entanto, uma representação de comerciantes e industriais do Porto publicou uma declaração no jornal “O primeiro de Janeiro”, em 28 de Setembro de 1904, pedindo ao governo para construir a ligação por Leixões através de Contumil em vez da Alfândega.

O argumento utilizado foi que esta solução seria mais vantajosa para as regiões do Minho e Douro, e que o Ramal da Alfândega não detinha capacidade para mais tráfego.

Em 15 de Abril de 1903, o governo ordenou que a Direção do Minho e Douro iniciasse a elaboração dos estudos e orçamentos necessários ao prolongamento do Ramal até Leixões, uma vez que a Companhia das Docas do Porto e dos Caminhos de Ferro Peninsulares tornou-se proprietária da exploração do Porto de Leixões, e, assim, incumbida da construção deste projeto

Projeto, esse, elaborado pelos engenheiros Eleutério da Fonseca e Alves de Sousa, incluía a construção de uma estação em Leixões, que servisse, igualmente, a Linha de Circunvalação do Porto, que ligava a área portuária à estação de Contumil, na Linha do Minho.

A 1 de Julho desse ano, foi publicado um decreto das Cortes Gerais, que previa que a ligação entre a Alfândega e Leixões devia ser construída pela Associação Commercial do Porto, caso a Companhia das Docas do Porto e dos Caminhos de Ferro Peninsulares não realizasse este projeto nos prazos estipulados.

O prolongamento do Ramal até Leixões voltou a ser discutido com a construção do porto de Leixões, em 1892, tendo sido defendido pela Associação Comercial de Porto.

Declínio e Encerramento

O Ramal da Alfândega teve uma grande importância desde os finais do Século XIX até aos princípios do Século XX, tendo entrado em declínio devido à inauguração do porto de Leixões, pelo qual passou progressivamente a ser feito o movimento de mercadorias da cidade do Porto. Desta forma, começou a ser posta em causa a viabilidade do Ramal da Alfândega.

Ainda assim, a ligação entre a Alfândega e Leixões era um dos projetos abrangidos numa lei de financiamento para construção de novas linhas, publicada em 14 de Julho de 1899; e, em 1902, decorreram obras de duplicação da via neste ramal, como forma de reduzir os problemas de tráfego na estação de Campanhã. O relatório de 1931-1932 da Direcção-Geral de Caminhos de Ferro incluiu, no seu programa de melhoramentos a realizar nas linhas do estado, a renovação de via entre Campanhã e Ermesinde e no Ramal da Alfândega.

A cada vez mais reduzida atividade do ramal, aliada à dificuldade do traçado, bem como a pouca importância no sistema ferroviário nacional levou ao seu encerramento em Junho de 1989.

(texto: Wikipédia)

 

Texto: José Gonçalves

Fotos: Pedro N. Silva (Arquivo EeTj) / pesquisa Google 

01jan21

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