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“Reis” Reiseiros e do Carnaval de Ovar – Tradições culturais “confinadas” foram lembradas em livro e exposição…

(REGISTOS de JOSÉ LOPES) Com o país aliviado das medidas de contenção mais exigentes na relação com a pandemia, em que mesmo persistindo um significativo numero de infeções por Convid-19 e perspetivas de nova fase, ninguém quer assumir voltar às medidas obrigatórias que estiveram em vigor até 21 de abril, período em que várias das anuais tradições culturais da cidade de Ovar voltaram a ficar “confinadas”, nomeadamente o Património Cultural e Imaterial “Cantar os Reis”, o Carnaval e as Procissões Quaresmais.

Destas tradições culturais “confinadas”, a realização de dois eventos culturais, como foram o caso da apresentação do livro “Cantar os Reis em Ovar”, de João Costa e a exposição “Reis do Carnaval de Ovar”, de Guilherme Terra, foram momentos marcantes, reunindo ambas as iniciativas, memórias coletivas únicas, segundo as suas características no envolvimento da comunidade.

O livro “Cantar os Reis em Ovar”, que chegou a integrar a também condicionada programação dos 150 anos do nascimento de António Dias Simões (1870 – 2020), como resultado da investigação e conceção de Fernando Frazão, que incluiu uma exposição no Museu Júlio Dinis, assinalando a vida e obra da figura reiseira, que com João Alves Cerqueira, deram origem à tradição das Troupes de Reis (1893). Foi um ano depois apresentado (02/02/2022) no Centro Cultural de Ovar (CAO), como “um livro escrito numa linguagem descomplicada, de nível elevado, construído na base da procura do saber reiseiro, que nos permitirá preservar este legado”, escreve o presidente da Câmara Municipal de Ovar, Salvador Malheiro.

A sessão de apresentação desta obra reiseira, mesmo depois na época do Cantar os Reis em Ovar, foi também uma justa homenagem à tradição e às sucessivas gerações de reiseiros que João Costa, trás à memória coletiva, como autor da obra em que começa por, “abrir páginas do passado, com a fidelidade que a história exige e merece”, como destaca na “abertura” do seu livro, em que refere igualmente, que, “também merecem referencia, aqueles que, sem essa participação tão ativa, a viveram e a defenderam de outra forma, igualmente digna e apaixonada”, realçando os nomes de: Dr. Zagalo dos Santos, Alberto da Silva Pereira, José Maria Fernandes da Graça e João da Silva Campelo.

João Costa, que começou por ser influenciado pelas trupes da ADO, Comércio & Indústria e Os Rouxinóis, que em 1949 visitavam a casa dos pais que vieram viver para Ovar. Iniciou-se nesta tradição reiseira desde os seus nove anos de idade, curiosamente a convite da Trupe do Comércio & Indústria quando no ano 1958 saiu à rua pela última vez.

Tomado o gosto pela tradição, este comerciante e memória viva de um vasto património cultural reiseiro que transpôs para o livro “Cantar os Reis em Ovar”, reuniu mais alguns rapazes da Joc/Loc e escuteiros, fundando a Trupe da Joc/Escutas, que veio a dar origem à atual Trupe JOC/LOC (1967), com uma homenagem a outra grande figura reiseira, Maria Amélia Dias Simões, filha de António Dias Simões, que João Costa destaca como “pai da tradição dos Reis em Ovar” (Ovarnews, 04/02/2022).

Partindo da sua vivência reiseira, e dedicação de uma vida à Troupe de Reis JOC/LOC e à Revista “REIS”, João Costa, reúne neste seu livro o essencial da secular tradição reiseira, que vem do final do século XIX até ao presente, começando por referir as Janeiras e a transição para o característico Cantar os Reis, bem como a rota das troupes, as músicas, as letras, os poetas, as vozes e os coros. Trata-se de uma obra que só mesmo um reiseiro verdadeiramente apaixonado e dedicado à sua preservação e divulgação, poderia escrever e lembrar muitos dos nomes que enriqueceram este património cultural, que só este livro prestou a devida homenagem coletiva reiseira.

Foram algumas destas memórias e do “reencontro feliz com o passado” proporcionado por este projeto tornado realidade por João Costa, que no dia 2 de fevereiro, foi apresentado o livro “Cantar os Reis em Ovar”, numa sessão com a presença do autor e um outro veterano reiseiro, Pinho Lopes, e Salvador Malheiro, cujo Município de Ovar a que preside, assume “criar uma dinâmica cultural diferenciadora e potenciar as nossas tradições (…)”, assumindo que neste capítulo, “os Reiseiros de Ovar são um dos melhores exemplos que temos na arte vareira”.

Perante os condicionalismos da pandemia, este ano, subiram ao palco do Centro de Artes de Ovar (CAO), apenas a Troupe de Reis da JOC/LOC para neste dia da apresentação do livro de João Costa, não só partilhar o momento reiseiro com o seu fundador, mas também em memória do Padre Manuel Pires Bastos, entusiasta desta Troupe de Reis, sobre quem, o livro lembra as suas próprias palavras (João Semana, 15/01/1976), em que escreveu, “sobre a tradição já poderei pronunciar-me, uma vez que a vivi por dentro nestas edição/76, desde os primeiros ensaios até à última atuação. Direi apenas que me fascinou de tal modo que me julguei, a partir de certa altura, um reiseiro entre os demais. Senti-me mesmo, perdoem-me a imodéstia, com tantos direitos adquiridos como aqueles que militam nestas lides há dezenas e dezenas de anos”.

O livro “Cantar os Reis em Ovar” que João Costa dedica à Mulher, filhos e netos, veio enriquecer a velhinha tradição reiseira, toda a sua beleza e encanto, com uma história construída com persistência e carolice, com arte e engenho de gerações, apostando na mudança em estilo e originalidade que consolidou o característico Cantar os Reis.

“REIS DO CARNAVAL DE OVAR”

 Igualmente condicionado nestes tempos de pandemia, o Carnaval e toda a envolvência de uma significativa comunidade foliona, bem como a sua vasta programação, que anualmente dão alegria, cor e movimento à cidade de Ovar como palco de um dos carnavais que atrai multidões. Mais um ano foi suspenso na sua vertente mais carnavalesca, já que dos eventos realizados, como espetáculos musicais, destacou-se a exposição no CAO, “Reis do Carnaval de Ovar”, em que Guilherme Terra reuniu memórias coletivas sobre esta antiga tradição do Rei de Carnaval desde o primeiro desfile em 1952.

Com a festa do Carnaval adiada após decisão da grande maioria dos autarcas dos concelhos dos principais desfiles carnavalescos, a inauguração desta exposição aconteceu a 13 de fevereiro, dia em que segundo o calendário teria lugar o cortejo do Rei de Carnaval em Ovar. Momento que juntou foliões dos diferentes segmentos do Carnaval de Ovar (Grupos Carnavalescos, Passerelles e Escolas de Samba).

A exposição, que teve como curador, o vareiro Guilherme Terra, profissional do audiovisual, interessado nesta área sobre as tradições de Ovar, nomeadamente o Carnaval de Ovar, em que, com a generosidade de terceiros, reuniu registos fotográficos que lhe foram confiados para organizar esta mostra “Reis do Carnaval de Ovar”, entre muitas memória deste património de um Carnaval mais popular.

Os conjuntos de imagens expostas por cada reinado carnavalesco, foram acompanhados pelo visionamento de pequenos filmes originais, com registos antigos, destacando-se as memórias sobre o Carnaval Sujo, da autoria de Mário Almeida.

Também este evento sobre a tradição da folia, mereceu o apoio do Município de Ovar, que acolheu o projeto apresentado por Guilherme Terra na sequência dos condicionalismos da pandemia, tal como em 2019 apoiou a edição do livro “O Carnaval de Ovar” da autoria de Guilherme Terra e Jorge Almeida e Pinho. Uma obra “sobre a história, a essência, as particularidades e especificidades deste Carnaval com seus protagonistas que se dedicaram ao Reinado da Folia ao longo de mais de 100 anos”, como aqui escrevemos no Etc e Tal (1 de março de 2019) a propósito do lançamento do livro.

Desta feita, Guilherme Terra, destacou na exposição que esteve patente na galeria do CAO até 5 de março, dos muitos temas que poderia apresentar, a temática dos Reis do Carnaval, privilegiando as tradições que ali se poderam reviver em imagens fotográficas, vídeos e outros elementos ali reunidos, sobre o característico entrudo que representa este património dos Reis do Carnaval de Ovar.

Depois do livro “O Carnaval de Ovar” (2019), Guilherme Terra, através da exposição “Reis do Carnaval de Ovar”, fez reviver memórias e reinados carnavalescos de 28 Reis, desde o primeiro desfile de Carnaval em 1952, que teve como Rei António Lírio Ramos, até 1955. A que se seguiu em 1956 o reinado carnavalesco ser vivido com rei e rainha, sendo a rainha um homem, como foi protagonizado nesta nova fase por, João Gomes da Costa, o Rei, (pai do João Costa, autor do livro “Cantar os Reis em Ovar”) e Florêncio Martins Abreu, Rainha que acompanhou no ano seguinte (1957), Manuel Maria Real, Rei, também em 1958.

O lugar de Rainha do Carnaval de Ovar, seria assumido finalmente por uma mulher em 1961, em que Maria da Glória Sousa dividiu o “trono” com o Rei, Fernando Bastos. Na investigação do livro “O Carnaval de Ovar”, sobre Reis do Carnaval que foram a temática da exposição, há ainda curiosidades como o ano 1963, em que o Rei, Manuel Lúcio Ferraz é acompanhado por duas rainhas, Benilde Valente Duarte e Piedade Pereira.

Foram muitas as imagens que fizeram reviver esta festa da cidade de Ovar num ano em que voltou a ser cancelada por decisão de bom senso, face às medidas de contenção relativas à evolução do Covid-19. Momentos que permitiram dar a conhecer às várias gerações, nomeadamente as de foliões, sobre épocas marcantes de reinados, como “o eterno Rei” António Salvador, que foi figura carismática do Carnaval de Ovar nos mandatos de 1970 a 1977, e de 1979 a 1983, e ainda 1990/91, com rainhas como: Lúcia Pereira Santos; Elisabete Rosa Marques; Maria Efigénia Dias; Maria Fátima Monteiro; Isolete Pinho; Maria Fátima Ferreira; Maria Fátima Sousa; Maria José Carvalho; Ótia Santos.

Depois do longo reinado carnavalesco de António Salvador, só suplantado por Manuel Ferreira, “o Rei popular”, ainda reinou (1987 a 89), Jorge Bruges Ramos, com, Palmira Santos Cardoso, Maria Leonilde Gonçalves e Florbela Sá. Destacou-se igualmente em 1992, António Manuel Valente Silva (Gaiato), com a Rainha, Maria Isabel Cruz Gonçalo.

O lugar de Rei de Carnaval voltaria em 1993 a ser marcado pela maior figura carnavalesca até aos dias de hoje, com os reinados protagonizados por Manuel Ferreira, verdadeiramente artista popular, que emprestou toda a sua alegria e arte, à maior festa da cidade durante 14 anos consecutivos, partilhando o trono com, Carla Pedrosa (1993 a 95), Alexandra Cardeira (1996), Isa Santos (1997 a 2004) e Sara Ferreira (2005 a 2007). Um inesquecível período de reinados do Manuel Ferreira, que só critérios pouco carnavalescos destronaram “o Rei popular”, para em cada ano dar lugar a diferentes figuras, Rei e Rainha, destacando-se as homenagens a José Costa e Aninhas Picado (2008), Álvaro Silva e Rosa Augusta (2010), Álvaro Rocha e Marília Valente (2012), Joaquim Matos e Ana Ferreira (2013), Alcino Andrade e Solange Duarte (2014), Manuel Rilho e Liliana Biscaia (2017) ou João Cachimbó e Ângela Liz (2018).

Ambos os eventos sobre tradições culturais que as medidas de confinamento acabaram por influenciar, acabaram por trazer à memória coletiva de uma comunidade, estes elementos do seu património cultural, preservados e enriquecidos de geração em geração, como “Cantar os Reis em Ovar” apresentado em livro por João Costa, e a história dos “Reis do Carnaval de Ovar” através da exposição de Guilherme Terra.

 

Texto e fotos: José Lopes

 

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