Humberto Martins
Para responder a estas duas questões, é necessário primeiro recuar no tempo e contar um pouco de História. Os meios de produção anteriores ao capitalismo, foram baseados no esclavagismo e no feudalismo, tanto um como no outro, o trabalho era exercido através da força, da servidão e da vassalagem, o senhor de escravos obrigava todos e todas a trabalhar para si, à custa da intimidação.
A força do chicote imperava. O senhor feudal, dono do castelo ou da fortaleza e das terras em redor em prol da segurança, tinha trabalhadores a trabalhar para si por vassalagem e servidão, como sabem, naquele tempo as populações que viviam fora dos castelos eram saqueadas a todo instante e por medo refugiavam-se nos castelos, em troca dessa segurança pagavam com trabalho agrícola o seu senhor feudal.
Depois da Revolução Francesa, com a ascensão da burguesia iniciou-se outro meio de produção, o capitalismo, que vigora até aos dias de hoje! O fundamento da sociedade capitalista está na mercadoria, no trabalho que se tornou mercadoria, esse trabalho é assalariado, esta sociedade então, é orientada pelo capital e pela acumulação de mais capital. Deste modo o capitalista extrai do trabalhador assalariado o mais valor.
Este, portanto, é núcleo central do capitalismo, a partir daqui os estudiosos descobriram os elementos jurídicos que estão envolvidos neste complexo sistema de vida capitalista. Para que aja capitalista e trabalhador assalariado, e que este último se possa vender ao primeiro é necessário haver um mecanismo que seja diferente dos anteriores meios de produção que foram o da escravidão e do feudalismo, já por mim mencionados. Porque num, o trabalho era obtido pela força, o outro o trabalho era obtido pela servidão, agora no capitalismo já não existe nem uma forma nem outra, dizem os “entendidos” que os tempos são outros, que a Humanidade “evoluiu”. Este assunto, daria outro tema para debate e que debate. Evolução que nada! Mas, deixemos isso para outro dia!
Voltemos ao essencial. No capitalismo, a forma pela qual o trabalhador assalariado se submete às condições de trabalho do seu patrão é através de vínculos jurídicos, vínculos contratuais, é assim deste modo que o trabalhador vende a sua força de trabalho ao seu patrão. Tudo no capitalismo é mercadoria, grosso modo foi assim que a força de trabalho também virou mercadoria. Podemos afirmar então, que a partir deste momento temos uma natureza jurídica necessária para o capitalismo se desenvolver.
O Direito não é um acessório do capitalismo, ele é um elemento fundamental do capitalismo. Só com o Direito, é possível que o trabalhador venda a sua força de trabalho para o capitalista. Ressalvo também, que na hora da assinatura deste vínculo contratual entre estes dois sujeitos, o trabalhador e o patrão, eles são considerados equivalentes, a partir deste momento, “eles”, patrão e trabalhador são iguais. E porquê são iguais?
Esta igualdade advém de algo mais profundo, a verdade da equivalência está na mercadoria, tudo se troca por tudo, e tudo de todos se troca por tudo de todos, esta equivalência só é possível no capitalismo, quando então se troca, produto industrial por dinheiro, produto agrícola por dinheiro, e quando se troca serviços por dinheiro e consequentemente força de trabalho por dinheiro e neste movimento geral se dá então a equivalência de tudo com tudo. Podemos dizer com ênfase, que vivemos na sociedade da mercadoria.
O capital não está aqui assente no seu valor de uso, mas assente no valor, no valor de troca. Assim, foi criada a igualdade jurídica entre as pessoas, este é um reflexo necessário do movimento da equivalência, da exploração de uma pessoa por outra mediante de um instrumento que faz com que o vínculo seja contratual e que faz com que o trabalho seja mercadoria.
Pois bem, para completar esta igualdade falta acrescentar que as pessoas têm de ser livres para a disposição de sua vontade. Na escravidão, o escravo não fazia nada segundo a sua vontade, no feudalismo a mesma coisa, o servo não fazia nada através da sua vontade. Mas no capitalismo, aí surge este artifício, esta instrumentalidade que é real e ao mesmo tempo, é irônica nos termos como se apresenta.
Surge então, a liberdade, as pessoas são livres de fazer vínculos contratuais com quem quiser, podem escolher para qual patrão trabalhar, (aqui também se pode adicionar a taxa de desemprego, que é alta e inverte tudo isto, mas isso é outro tema que fica para outro debate), do mesmo modo, o patrão pode escolher os seus trabalhadores, diferente do feudalismo e do esclavagismo. No capitalismo o artifício jurídico, pelo qual uma pessoa se une a outra chama-se liberdade. Aquilo que nos termos de Direito, tem o nome de “autonomia da vontade”. Então o trabalhador por livre manifestação de sua vontade, deseja e declarou, vender a sua força de trabalho ao capitalista e em troca o capitalista declara que paga Xis por essa força de trabalho.
O paraíso do Direito é isso! (acredita quem quiser!) O mesmo só se pode estabelecer a partir de uma Liberdade que é dada a partir de uma vontade livre. Os “sujeitos” só se conectam sendo iguais e livres. Agora chegamos no ponto essencial, para que o capital explore o trabalho é necessário que se construa uma categoria central do capitalismo, que é o “Sujeito de Direito” e foi como todos sabemos o que aconteceu. A submissão de um sujeito pelo outro no capitalismo e ao contrário dos outros meios de produção, agora é feito por um instrumento jurídico, que agora tem o nome de vínculos contratuais, eis então criada a forma de subjetividade jurídica.
Todos e todas no capitalismo, que é em quase todo o mundo, tomam forma de subjetividade jurídica, ou seja compram ou vendem a sua força de trabalho, derivação também deste facto o costume dizer “isto é meu por Direito” e se tomam do outro que não seja através de um instrumento jurídico cometem crime são presas, e vão para a cadeia!
A sociedade atual está estruturada mediante balizas e modelações que são jurídicas, então um sujeito tem quinhentas casas e outro não tem nenhuma, por causa do Direito, então, essas quinhentas casas são de um por direito! e outro não tem nada, por direito, porque não tem nada registado em seu nome! Podemos firmemente afirmar que isso acontece por culpa do Direito. Passando para a realidade do mundo hoje, verificamos o latifundiário com terras e mais terras e milhões de pessoas a passar fome. Constatamos também banqueiros com dinheiro e mais dinheiro e milhões de pessoas sem teto vivendo nas ruas. O Direito não é norma! O Direito não é só forma jurídica, o Direito é principalmente, e não tenham dúvidas o que estrutura o capitalismo socialmente!
Conclusão: Foi o meio de produção criado por ele (capitalismo) que permitiu que um sujeito se vendesse a outro em forma de subjetividade jurídica, através de vínculo econômico, que deu a permissão para o estabelecimento da desigualdade no mundo. Não tenham a menor dúvida desse facto!
Foto: pesquisa Web
01ago22
Muito Bom!