Miguel Correia
O simples ato de atravessar a fronteira – e entrar em território espanhol – é mais que suficiente para alterar o nosso estatuto de povo trabalhador. Talvez pelo clima ou uso abusivo de tomates nos pratos gastronómicos, a verdade é que, em termos laborais, a imagem do português é bastante conceituada e respeitada. Talvez por isso, os espanhóis prefiram recorrer aos marroquinos para explorar e escravizar na apanha dos morangos.
Mas, como mencionei, este nível de reputação só ocorre do outro lado da fronteira. Em solo nacional, infelizmente, o cenário é diferente. Por entre baixas fraudulentas (quando dá jeito ficar uns dias em casa), pedidos de horários flexíveis (para filhos e outras atividades lúdicas) e falta de aptidões curriculares, torna-se complicado satisfazer os anúncios nos jornais e centros de emprego.
E reparem que deixei de fora a questão dos que recebem subsídios, pois não quero que venham com a conversa que sou de extrema-direita e estou a apoiar o Ventura. Nos dias que correm, ter opinião própria equivale a percorrer um campo minado. Porque a crucificação está de volta, mas agora nas redes sociais…
A comunicação social – que tem o dever de esclarecer o povo – revelou um pequeno deslize de Adelaide Franco. Em causa está o subsídio de desemprego que a senhora recebeu enquanto desempenhava atividades pontuais para a empresa que a tinha despedido, da qual é sócia e que terá a filha como gerente. Este enredo (digno de telenovela) demonstra a cruel realidade do nosso mercado de trabalho. Como se não bastasse o despedimento, pela própria filha, a senhora ainda teve de voltar para terminar o trabalho que estava pendente.
Muitos podem apontar o dedo e acusá-la de querer ganhar dinheiro a dobrar, mas imaginem a vergonha sentida ao saber que criou uma filha, por entre fraldas sujas e vários princípios de otite, para anos mais tarde ser despachada para o olho da rua, mesmo sendo associada. O risco de misturar negócios com família. O passado persegue-nos e, numa reviravolta digna das artes cinéfilas, a presidente do IEFP (Instituto Emprego e Formação Profissional), depois de receber um parecer do Instituto da Segurança Social, pediu a demissão do cargo. Não se compreende tamanha desfaçatez a quem apenas quer trabalhar. É caso para dizer que, se isto aconteceu à Presidente, então qualquer um inscrito na fila do desemprego estará entregue à sua sorte.
Foto: pesquisa Web
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