Miguel Correia
Antes de me aventurar nesta pira funerária, que aumenta a cada palavra que escrevo, quero esclarecer que sou católico devoto de Jesus Cristo. Tudo que surgiu depois e, principalmente, com o cunho do Homem é, para mim, como se não existisse. Pelo que li, talvez agnóstico seja o adjetivo. Posto isto, é com natural desinteresse que tenho vindo a acompanhar o mega Festival de Verão, organizado pela Igreja e que, quando tiverem oportunidade de ler esta crónica, já aconteceu e todos os órgãos de comunicação social publicaram enormes parangonas elogiosas.
Sabemos que as notícias (que surgem nos écrans e jornais) movem-se por caminhos misteriosos e pretendem preparar a mente dos devotos ou dos hereges. Reparem que, num curto exercício de memória, começamos o ano 2023 com as denúncias de escândalos sexuais praticados por membros da Igreja. Houve alguma indignação pública e certos populares, depois da divulgação das listas dos pecadores, ainda tentaram expulsar-lhes o Demónio do corpo à base da porrada. Num ato divino, alguns meses depois, os processos estão em banho-maria e já ninguém se importa com a utilização indevida da pila dos senhores padres…
A Igreja, conforme reza a história, supera adversidades e, por agora, aposta forte nas Jornadas da Juventude, em Lisboa. Depois de novo escândalo financeiro envolvendo verbas excessivas para a construção do palco e demais projetos arquitetónicos (que não lembram o Diabo), conseguiram reduzir custos e acalmar as vozes mais dissonantes.
A nobreza, representada pelo poder político local, aliou-se ao clero e, como por milagre, instaurou-se uma fé quase inabalável que, para além de mover montanhas, ainda conseguiu retirar os sem-abrigo das principais artérias da cidade Lisboeta e garantir uma alcatifa por mais de dez mil euros. Tudo isto enquanto, lá longe, o Papa Francisco apela à compreensão e salientou que pretende ter os menos afortunados junto ao palco, durante a sua visita. Os nossos pobres, nem com a tenda ficaram!
Como se não bastasse, ninguém dá importância às queixas sobre a falta de transporte, preços alucinantes das casas e hotéis, tolerância de ponto aos que trabalham em Lisboa – sendo católicos, ou não – e falta de pessoal para dar uma resposta digna aos milhões de peregrinos que se preparam para rumar à capital.
A luxúria e a soberba estão patentes a cada gesto da Igreja. Lisboa é a montra de uma religião que teima em exibir um estatuto que a ultrapassa e contraria os escritos originais. Tudo é feito em nome do Senhor. Mesmo que, com tudo isto, a Igreja arda no fogo do Inferno.
Imagem: pesquisa web
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